5 perguntas para Ana Himmelstein, CEO do Fórum Brasileiro das Climatechs

"A COP30 é uma oportunidade de mostrar ao mundo que o Brasil não é apenas um palco de debates climáticos, mas um polo de soluções"

Ana Himmelstein, CEO do Fórum Brasileiro das Climatechs
Crédito: Wanezza Soares

Redação Fast Company Brasil 5 minutos de leitura

Enquanto o Brasil recebe a COP30, o desafio de deixar de ser palco e assumir protagonismo na criação das tecnologias que vão definir o enfrentamento da crise climática se impõe.

O país tem potencial para isso, de acordo com Ana Himmelstein, diretora executiva do Fórum Brasileiro das Climatechs, associação que conecta startups, investidores, governo e academia para fomentar o ecossistema nacional de tecnologias voltadas ao clima.

Com mais de uma década de experiência em inovação, tecnologia, políticas públicas e energia renovável, Ana atua justamente onde o país mais precisa avançar: na coordenação dos atores que pautam a inovação climática – setor que, globalmente, pode superar US$ 100 bilhões até 2030.

Nesta entrevista à Fast Company Brasil, ela explica por que o Brasil reúne condições únicas para se tornar protagonista global em climatechs e o que ainda falta para chegarmos lá.

FC Brasil – Na sua visão, como o Brasil pode destravar seu potencial como líder em tecnologia voltada ao enfrentamento da crise climática?

Ana Himmelstein O Brasil reúne uma combinação rara de biodiversidade, matriz energética limpa e base científica sólida. Esse tripé nos coloca em posição privilegiada para sermos referência global em tecnologias climáticas, embora ainda não tenhamos convertido plenamente esse potencial em estratégia de desenvolvimento.

O passo agora é coordenação institucional: conectar academia, startups, grandes empresas, investidores e governo em torno de uma agenda de inovação climática.

a crise climática é real e já afeta profundamente a forma como vivemos.

O Fórum Brasileiro das Climatechs nasceu para articular esses atores, fortalecer a narrativa sobre o papel estratégico das climatechs e apoiar políticas e mecanismos de financiamento que aceleram o setor. 

A COP30 é uma oportunidade de mostrar ao mundo que o Brasil não é apenas um palco de debates climáticos, mas um polo de soluções. 

FC Brasil Pesquisas mostram que o Sul Global será o mais afetado pelas mudanças climáticas nas próximas décadas. Ainda assim, Brasil e África recebem menos de 4% do investimento em climatechs. O que precisa mudar para equilibrar esse fluxo de capital?

Ana Himmelstein Há uma assimetria estrutural no fluxo de capital climático. O dinheiro ainda está concentrado nos ecossistemas do Norte Global. No caso do Brasil, parte da solução passa por fortalecer o ecossistema, mitigando a percepção de risco e  demonstrando que soluções climáticas são também oportunidades de desenvolvimento econômico.

Para isso, precisamos investir em conexões entre academia e mercado, apoiar o amadurecimento das startups em estágio inicial, promover aperfeiçoamento regulatório e articular fontes diversas de capital.

Precisamos de instrumentos de finanças climáticas adaptados à realidade brasileira, que considerem ciclos mais longos e diversos de maturação. Isso envolve blended finance, fundos garantidores, uso estratégico de capital filantrópico e principalmente, promover conexões assertivas entre soluções e financiadores.

FC Brasil As climatechs atuam em diversas áreas, desde prevenção de incêndios até transição energética. Como isso afeta a busca por capital dessas companhias?

Ana Himmelstein O venture capital é importante e se destaca como solução de financiamento para startups. Mas a diversidade de modelos de negócios e estágios de maturidade das climatechs demanda uma gama mais vasta de soluções de capital.

Muitas dessas empresas operam com infraestrutura física, hardware, biotecnologia ou projetos que dependem de validações regulatórias longas e, portanto, precisam de capital paciente e de diferentes naturezas.

logotipo do Fórum Brasileiro das Climatechs

No Brasil, temos dois desafios: aumentar o fluxo de capital amplificando a relevância do país frente ao mercado global e diminuir as fricções para acesso do capital já disponível. 

O futuro do setor passa por financiamento orquestrado: combinações de capital filantrópico, concessional, dívida verde, fundos públicos e instrumentos de mercado, além dos investimentos por participação liderados não apenas por fundos de venture capital, mas também de private equity, corporate venture capital e outros. 

FC Brasil Sabemos dos desafios da transição energética e da crise climática. Agora, olhando para o outro lado: quais são as oportunidades? Que tecnologias e soluções estão surgindo no Brasil?

Ana Himmelstein O termo emergência climática não é por acaso. A crise que vivemos pede respostas urgentes e escaláveis. Esse ciclo de inovação rápida e replicável está no DNA das empresas que desenvolvem soluções de base tecnológica.

As mudanças climáticas já transformam a realidade e precisamos de soluções que permitam nos adaptar a essa nova condição e, ao mesmo tempo, impedir seu agravamento. Não se trata de resolver o problema de um futuro distante, mas de criar soluções para o agora. 

Ana Himmelstein, CEO do Fórum Brasileiro das Climatechs

O agronegócio é um exemplo importante. Além de central para o PIB, é um setor que depende de soluções de adaptação climática. O desempenho recorde do agro no último ano está ligado ao uso de novas tecnologias, que trouxeram ganhos de produtividade, eficiência no uso de recursos naturais e redução de riscos climáticos. Mostra como inovação e competitividade avançam juntas.

No Fórum, organizamos o ecossistema em oito eixos: energia e biocombustíveis, agricultura e sistemas alimentares, florestas e uso do solo, água e saneamento, gestão de resíduos, logística e mobilidade, indústria e finanças.

Em todos, já existem empresas captando recursos, gerando receita, empregos e contribuindo para mitigação e adaptação climática. As oportunidades são reais e crescentes. O desafio é fortalecer o ecossistema para que cases de sucesso deixem de ser exceção.

FC Brasil Algumas autoridades chamam a COP30 de “COP da Verdade”. Para você, qual é a verdade inconveniente que o mundo precisa encarar sobre a crise climática?

Ana Himmelstein  A verdade é que a crise climática é real e já afeta profundamente a forma como vivemos, produzimos e nos relacionamos com o território. Não estamos mais falando de um risco futuro, mas de um presente que exige respostas concretas.

Por isso, esta precisa ser também a COP da implementação, o momento de transformar compromissos e metas em ação efetiva. O desafio é conectar as metas globais ambiciosas e os compromissos multilaterais com esforços coordenados e orientados à ação, capazes de mobilizar governos, empresas e investidores em torno de um mesmo objetivo.

símbolo da COP30 sobre imagem de barco descendo o rio
Crédito: Ildo Frazão/ iStock

Nesse contexto, as climatechs têm um papel central ao transformar ciência, tecnologia e inovação em respostas de alto impacto. Mas, para que isso aconteça em escala, é essencial criar condições para o desenvolvimento e a expansão dessas soluções, com políticas públicas adequadas, acesso a capital e integração com cadeias produtivas.

O Brasil tem uma oportunidade única nesse sentido: combinar seu potencial natural e científico com o talento empreendedor que floresce em todo o país.


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