5 perguntas para Ana Sarkovas, co-fundadora da Ecoa Capital
Com objetivo de ampliar a transição para o capitalismo de stakeholders, Ana Sarkovas é uma das fundadoras da Ecoa Capital, gestora que investe em empresas “alinhadas ao espírito do tempo”. Ou seja, companhias que se esforçam para transformar e gerar valor social, ambiental e econômico.
Ana foi diretora-executiva do Sistema B no Brasil, movimento global de empresas que buscam equilibrar os lucros e os impactos socioambientais positivos, do qual ela ainda é conselheira. Também faz parte do conselho da Nude, empresa de bebidas vegetais e da ONG Projete.
Nesta entrevista à Fast Company Brasil Ana fala sobre o presente do ESG e o futuro dos negócios.
FC Brasil – Você atua com negócios que apoiam a agenda ESG desde que o termo não era tão conhecido. O que mudou de 2015 para cá em relação ao investimento em ESG?
Ana Sarkovas – Apesar de a agenda ESG não ter se realizado na velocidade que esperávamos em 2015, o termo foi apropriado pelo mercado financeiro e privado, principalmente após 2020, assim como passou a ter espaço em discussões multilaterais entre países e nações.
Muitas lideranças do mercado de capitais e das grandes empresas passaram a entender que o olhar sobre os impactos e aspectos relacionados ao meio ambiente, a dimensão social e de governança, são fundamentais para a perpetuidade dos negócios.
Esse foi um assunto que passou a ser visto não só pela lente
Investir em soluções que endereçam os temas de justiça social e climática será prioridade.
da gestão de risco, mas também como oportunidade de geração de mais valor, tanto para os acionistas como para a sociedade em geral. Aqueles que não estiverem conectados terão sua existência ameaçada.
Isso fica evidente quando vemos cartas e compromissos públicos de grandes gestores financeiros e bancos, assim como de multinacionais, de se tornar carbono neutro nas próximas décadas, incorporarm diversidade de gênero e raça nos cargos de liderança, entre muitos outros. Resta saber agora como irão de fato implementar tais mudanças e em quanto tempo.
FC Brasil – Você foi diretora-executiva do Sistema B no Brasil. Quais são os desafios de aplicar o Sistema B em empresas brasileiras?
Ana Sarkovas – Ser Empresa B é uma direção, um caminho, não uma posição. A avaliação de impacto B é, em primeiro lugar, uma ferramenta de gestão para empresas de qualquer tamanho, setor e região. É um instrumento de mensuração que contempla indicadores de processos, práticas, políticas e modelo de negócio em cinco dimensões: governança,
Hoje ninguém mais pode dar a desculpa de que não existe metodologia para mensuração de impacto positivo.
trabalhadores, comunidade, meio ambiente e clientes, integrando as mais importantes certificações em uma só ferramenta.
Ela é aberta e gratuita e o convite é para que todos os negócios possam preencher o questionário e ter uma relatório do seu desempenho com métricas críveis e comparáveis. Só esse processo já é um enorme aprendizado e traz caminhos possíveis de melhoria e alinhamento com as melhores práticas ESG.
Para aquelas que conseguem a pontuação mínima para avançar no processo de certificação, existe um caminho de verificação dos dados, o que pode durar mais ou menos tempo, de acordo com o estágio que a empresa está na agenda ESG.
FC Brasil – À frente da Ecoa, você lidera investimentos em startups que geram mudanças sistêmicas na sociedade. Tem exemplos de empresas que estão se conectando na prática com impacto positivo?
Ana Sarkovas – A Ecoa investe em empresas e gestoras com o objetivo de contribuir com a geração de valor em ativos que já estão alinhados ao espírito do nosso tempo, seja no “o que” entregam como produto ou serviço, ou no “como” operam e fazem a gestão do seu negócio.
Temos alguns exemplos de empresas em diversos setores, mas posso citar algumas: a Urbem, empresa brasileira que tem como objetivo repensar os materiais utilizados na construção civil, sendo a primeira indústria de produção em larga escala de madeira engenheirada, de origem renovável, unindo tecnologia e industrialização; a Agrivalle, que tem
existem três razões para entrar no mundo do ESG - convicção, conveniência ou constrangimento.
como objetivo impulsionar a produtividade no campo de forma sustentável, regenerativa e rentável, fornecendo bioinsumos agrícolas para diferentes culturas e plantios.
Tem também a Solinfitec, líder global em agricultura digital que desenvolve soluções sistêmicas para os agricultores, aumentando a eficiência no campo; e a Nude, que produz bebidas vegetais a partir da aveia e que tem como principal objetivo transformar hábitos dos consumidores para fomentar a transição para economia de baixo carbono. Assim como a Celcoin, solução pioneira em infraestrutura de tecnologia financeira e bancária que permite que pessoas e empresas se conectem ao sistema financeiro de forma simples e sem burocracias.
FC Brasil – Como mensurar impacto positivo?
Ana Sarkovas – Hoje ninguém mais pode dar a desculpa de que não existe metodologia para mensuração de impacto positivo. Pelo contrário, o desafio está em conseguir unificar as diversas metodologias criadas para termos uma visão que seja comparável entre as empresas.
A Ecoa investe com o objetivo de contribuir com a geração de valor em ativos que já estão alinhados ao espírito do nosso tempo.
Além da Avaliação de Impacto B, já citada, temos iniciativas como o Impact Management Project (IMP), temos os direcionadores dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), as diretrizes do Principles for Responsible Investments (PRI), entre muitas outras, inclusive proprietárias.
O primeiro passo é escolher uma metodologia e aplicá-la. O que não medimos, não gerenciamos. Aqui é a mesma lógica. As métricas de impacto positivo não devem ser uma restrição, mas sim uma oportunidade para o mercado integrar dimensões que podem gerar enorme valor para as empresas e a sociedade.
FC Brasil – Quais as tendências que, na sua opinião, vão moldar o futuro dos negócios?
Ana Sarkovas – A nova geração já vem com um novo chip e valores. Isso se reflete muito na forma e nas escolhas do que consomem, onde trabalham, onde investem e em quem votam. O “como” a empresa opera cada vez mais se torna relevante nessas escolhas.
Não basta ter um serviço ou produto de qualidade, a sociedade quer transparência para saber a origem, do que é feita a embalagem, como será o descarte, qual a rastreabilidade, qual foi o consumo de recursos naturais, dentre muitos outros aspectos.
Investir em soluções que endereçam os temas de justiça social e climática será prioridade. Nesse sentido, temos uma janela geracional para transformar os modelos de negócios tradicionais, financiando essa transição e também acelerando os negócios que já nascem alinhados a essas tendências.
Como diz Fábio Barbosa [CEO da Natura], grande inspiração e liderança: "existem três razões para entrar no mundo do ESG: convicção, conveniência ou constrangimento”. O que não dá mais é para ficar de fora.