5 perguntas para João Abreu, da Impulso Gov

Crédito: Fast Company Brasil

Claudia Penteado 6 minutos de leitura

O paulistano João Abreu, de 29 anos, é economista formado pela Universidade de São Paulo e Mestre em Administração Pública e Desenvolvimento Internacional pela Kennedy School of Government, da Universidade de Harvard.

Com passagens pela agência de promoção de investimentos da Prefeitura de São Paulo e pelo Harvard Government Performance Lab, ele é co-fundador - ao lado de Isabel Opice - e diretor-executivo da Impulso Gov, uma organização sem fins lucrativos de alta performance que trabalha para impulsionar o uso inteligente de dados e tecnologia no SUS.


João diz que hoje seu maior desafio pessoal é conciliar uma boa saúde mental com o desempenho de alto nível em suas responsabilidades no trabalho. "Toda semana esse desafio muda de formato, mas está sempre presente'', diz.
Profissionalmente, o maior desafio é medir o impacto da ImpusoGov, impacto este que, naturalmente, vai muito além do simples e objetivo lucro. Ele diz que é preciso ter impacto social relevante na ponta, algo que precisa ser reconhecido e enfrentado, o tempo todo.

Nesta conversa, falamos sobre inovação, escuta, sobre decisões, impacto social sustentável e sobre cercar-se das melhores pessoas.

O que é inovação para você?

Inovação é direcionar soluções existentes para melhorar a vida das pessoas. O maior desafio não é ter mais ideias, mas sim ressignificar as ideias existentes na direção certa.

Nas últimas décadas, produtos digitais invadiram o bolso e a vida de cada um de nós. Por trás deles têm muita ciência comportamental, neurociência, design de interface, experiência do usuário e, claro, ciência de dados e engenharia de software.

Até agora usamos essas metodologias para resolver problemas individuais do consumidor: como assistir séries de forma rápida e fácil? E comprar produtos sem sair de casa? E ouvir música? Tudo isso foi simplificado pela tecnologia. Mas temos a oportunidade de usar essas mesmas metodologias e soluções em outras áreas, que envolvem problemas sociais difíceis. Não precisamos reinventar a roda.

A forma de atuação da Impulso Gov bebe muito desta ideia: daquilo que desenvolvemos nas últimas décadas e que produziram as empresas mais inovadoras do mundo, como podemos ressignificar essas soluções para ampliar seu escopo e resolver outros problemas?

Por que é tão fácil receber comida em casa em poucos minutos, mas é tão difícil agendar uma consulta no SUS? Por que um profissional de saúde precisa preencher diversos sistemas de informação, lentos e difíceis de usar, quando poderia estar atendendo pacientes? Está na hora de usar essas mesmas metodologias e soluções para resolver problemas sociais. Isso, para mim, é inovação.

Qual é, na sua visão, a habilidade mais importante para um bom líder?

São duas: escuta e decisão. Entender que as pessoas não são todas iguais a você, que possuem capacidades, preferências e preocupações distintas entre si, é absolutamente crucial. Quanto mais pessoas você estiver liderando, mais importante é o tempo que você dedica a elas. Seu trabalho é ajudá-las a saber onde precisam melhorar, onde acertaram, e o que espera-se delas conforme evoluem em suas posições.

O segundo trabalho é indicar para que direção elas devem ir, e isso requer tomar decisões. Uma boa liderança precisa entender que parte do seu papel é decidir. É fundamental consultar as pessoas, inclusive para melhorar as decisões tomadas. Mas é da liderança que espera-se a decisão final e especialmente a capacidade de arcar com as consequências dela.

O que é qualidade de vida para você?

Se tudo der certo, cada um de nós viverá cerca de 4 mil semanas. Gosto de colocar assim, porque fica bem palpável: a vida é finita. Então, vejo dois pilares para qualidade de vida: ter propósito em suas atividades e sua saúde mental.

Propósito é aquilo que te move, é quando você consegue olhar essas semanas passando e identificar atividades, pessoas, momentos, que fazem você apreciar o tempo que você tem. Algumas pessoas têm a sorte de achar isso também no seu trabalho principal - o que é ótimo, porque dedicamos uma parte enorme da nossa vida para o trabalho. No caso de organizações cuja missão principal é impacto social, como a Impulso Gov, isso é mais comum, porque a ligação é mais direta. Mas se não for no trabalho, em algum lugar é fundamental identificar esse propósito.

Tão importante quanto é a sua saúde mental. É um termo amplo, e ainda cercado de estigma, mas a ciência já é bastante clara: existem fatores imutáveis (genéticos e ambientais, por exemplo) e fatores mutáveis (comportamentos, atividades) que influenciam nossa saúde mental. Temos que focar no segundo grupo, que está sob nosso controle, e cuidar da nossa saúde mental.

Pensando especificamente na relação com o ambiente profissional, há ações individuais que podem ser perseguidas, mas existem também decisões institucionais. Na Impulso Gov, por exemplo, mesmo quando tínhamos pouco mais de 10 pessoas e quase nenhum orçamento, criamos o Fundo de Saúde Mental. Um mecanismo que colaboradores podem acionar para custear terapia, psiquiatra e medicamentos. Nosso intuito era combater um dos obstáculos que existem para melhorar a saúde mental: o financeiro. Mas funciona também como uma forma simbólica de reduzir outro obstáculo, que é o estigma. Quando criamos essa iniciativa ou quando eu, como co-fundador, relembro que faço acompanhamento psicológico há vários anos, tudo isso facilita que as pessoas na Impulso tratem o tema com mais naturalidade.

O que o conceito de sustentabilidade representa para você e como se conecta ao seu trabalho?

No nosso trabalho na Impulso Gov, a dimensão mais importante de sustentabilidade é a do impacto social sustentável. Buscamos isso em dois sentidos diferentes. Primeiro, é fundamental que nosso impacto seja perene no tempo, porque o desafio que nos propomos a enfrentar - melhorar a qualidade do SUS - não vai se resolver em poucos anos. Assim, precisamos de um modelo de atuação que permita impacto consistente e de longo prazo.

Segundo, é importantíssimo que nossa atuação junto a governos municipais seja sustentável, no sentido de não depender exclusivamente da Impulso Gov. Nós somos facilitadores, replicadores de produtos que funcionam, mas quem seguirá responsável por entregar serviços de saúde de qualidade para a população usuária do SUS são os governos, em especial as prefeituras. Por isso, toda vez que começamos nosso trabalho com uma nova prefeitura, estamos desde o começo pensando em como o trabalho vai continuar, uma vez que a fase mais intensa de colaboração técnica acabe. O que queremos é transformar a capacidade de entrega dos governos, queremos ajudá-los a usar bem os R$ 300 bilhões de reais que investimos por ano no SUS.

Qual o melhor conselho que você já recebeu na vida?

“Não é sobre não deixar nenhum prato cair, é sobre quais”. Nunca será possível fazer tudo que seria desejável. O desafio é escolher quais atividades e objetivos você vai propositadamente abrir mão de fazer. Quais pratos deixar cair de propósito. Ouvi no contexto de empreendedorismo, mas hoje vejo que vale para qualquer decisão de priorização na vida.

Empatado com este, citaria “cerque-se de pessoas melhores do que você.” Gosto da frase “as melhores decisões que já tomei foram algumas das pessoas que contratei. E as piores decisões que já tomei foram algumas das pessoas que contratei”. Atração de talentos é tudo.


SOBRE A AUTORA

Claudia Penteado é editora chefe da Fast Company Brasil. saiba mais