5 perguntas para Jonathan Ferr, músico e compositor

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Redação Fast Company Brasil 5 minutos de leitura

Jonathan Ferr subiu aos palcos do festival South by Southwest (SXSW) e mostrou inovação da forma que conhece: com música. Pianista, compositor e expoente do jazz contemporâneo, ele transita entre gêneros como neo-soul, R&B e música eletrônica, sempre buscando novas formas de expressão. 

Em Austin, ele também participou de um debate na Universidade do Texas sobre afrofuturismo e inovação na arte. Nesta entrevista para a Fast Company Brasil durante o festival ele fala sobre tecnologia, o impacto da inteligência artificial na cultura e o que realmente significa criar o futuro, a partir de sua perspectiva.

FC Brasil – Como você vê a inovação na música brasileira e na sua própria arte?

Jonathan Ferr – Inovação, para mim, não é inventar algo do zero. É olhar para o que já existe e encontrar uma nova forma de existir ali. Minha música nasce desse princípio, ela é uma extensão de mim. Não tem como eu viver de um jeito e cantar sobre outra coisa.

Acho que, dentro desse movimento, a tecnologia não é um aparato técnico, é uma forma de fazer com que a gente viva bem, com que a gente viva bem na nossa comunidade. Falo muito sobre tecnologias espirituais. São formas de se reconhecer no mundo, de entender que a gente não é só matéria, mas também espírito. São outras vibrações, outras formas de existir.

O mundo quer nos engolir, quer que nossa existência seja só sobre produtividade, sobre fazer dinheiro, bater meta, construir impérios. Mas existe um lugar mais profundo. Se você se permitir mergulhar um pouco mais, vai ver outras possibilidades – existir com abundância, mas uma abundância generosa, que não se mede só em números.

Sinto que as pessoas estão buscando isso, existe essa inquietação. Todo mundo quer saber: como existir nesse mundo sem ser apenas mais uma engrenagem? Como fazer para que minha vida seja sobre mim, sobre a minha própria existência, e não só sobre o que eu produzo para alguém? 

FC Brasil – Na Universidade do Texas, você falou sobre afrofuturismo. Como essa perspectiva influencia sua música?

Jonathan Ferr –  Meu curta-metragem "Jornada" entrou na grade do doutorado em estudos de afrofuturismo na Universidade do Texas. Quando me convidaram para palestrar, a pessoa que fez o convite nem sabia disso. Quando descobriram foi um encontro incrível.  O futuro já estava ali, esperando.

Durante a palestra, propus um exercício: cada pessoa escreveu uma carta para si mesma no futuro. Foi lindo. Acho que projetar o amanhã é isso: é sentir, é conectar, é se permitir ser atravessado por outros tempos.

O futuro não se constrói sozinho, ele é sempre uma cocriação. O que eu coloco no mundo atravessa outras pessoas e o que elas colocam atravessa a mim. Eu acredito muito na força desse encontro.

E nisso entra a espiritualidade, que vejo como um wi-fi invisível ligando tudo. Não tem a ver com religião, mas com aquela intuição que faz você pensar em alguém e, de repente, essa pessoa te liga. São os caminhos se cruzando. O que é nosso já está no nosso caminho, esperando por nós. O que a gente busca, também nos busca.

FC Brasil – O uso da inteligência artificial na música tem gerado discussões. Como você vê essa transformação?

Jonathan Ferr –  A gente está pegando o comecinho de tudo. Assim como pegamos o começo da internet, agora estamos pegando o começo da IA. E mudanças assim mexem com tudo.

Se olhar para a história, algumas descobertas mudaram a humanidade: o fogo, a eletricidade, a possibilidade de gravar som. A IA é mais um desses saltos.

A gente se movimenta para encontrar paz, e não o contrário

Ela está mudando a maneira como nos relacionamos, e a cultura vai mudar com isso. A questão não é se é bom ou ruim, mas como vamos escolher nos relacionar com essa inteligência. 

A ética vai ser totalmente nesse momento, já está sendo. Então é uma avalanche de paradigmas que a gente não conhece ainda e que vai chegar muito longe.

FC Brasil – Você adotou o autotune em seu trabalho, . Como lida com isso?

Jonathan Ferr –  Eu faço música para mim. Se você se conectar com ela, ótimo. Se não, tudo bem também.

Quando comecei a usar autotune, muita gente disse que eu estava "destruindo" a música brasileira. Mas isso sempre acontece.

Jonathan Ferr, músico de jazz
Crédito: Renan Oliveira

Quando Miles Davis mudou o jazz, disseram que ele estava matando o jazz. Quando o Bob Dylan pegou uma guitarra elétrica, falaram que ele não fazia mais folk. No Tropicalismo, fizeram passeata contra a guitarra. As pessoas querem que tudo fique parado, mas nada no mundo é estático.

Outro dia, fiz um show com a Orquestra Sinfônica Brasileira Jovem e usei autotune. Antes disso, fizemos uma apresentação para crianças de escolas públicas. O maestro tocou alguns instrumentos e perguntou para elas: "que som é esse?" Quando eu ativei o autotune e perguntei o que era, todas responderam de primeira: "autotune!"

Isso me mostrou que essa é uma tecnologia da nova geração. E quem somos nós para dizer que ela não pode fazer parte da música?

FC Brasil – Para você, qual é o papel da arte no futuro?

Jonathan Ferr – A arte tem o poder de ressignificar. Ela nos mostra novas formas de ver o mundo. Eu costumo dizer que meu show não é para entreter, é para conectar. Mas não comigo – com você mesmo.

Acredito que a paz não é um lugar estático. Paz é movimento. A gente se movimenta para encontrar paz, e não o contrário. E acho que a arte faz isso. Ela nos tira do lugar, nos provoca, nos faz sentir.

No fim das contas, a arte ensina a gente a se mover com consciência. E talvez seja isso o que vai nos levar para o futuro.


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