5 perguntas para Pri Bertucci, CEO da [DIVERSITY BBOX]

Crédito: Livia Sá

Redação Fast Company Brasil 6 minutos de leitura

Especialista em diversidade há mais de 20 anos, Pri Bertucci é CEO da consultoria de diversidade [DIVERSITY BBOX]. Com cursos sobre o universo LGBTQIAP+ e suas interseccionalidades, Pri também é responsável por cofundar o Instituto [SSEX BBOX]. Desde 2011, a entidade realiza projetos de advocacy para fomentar a diversidade, inclusão e equidade.

Pri também é cocriadore do SISTEMA ILE, popularmente conhecido como linguagem neutra e do pronome de gênero neutro na língua portuguesa e produtore executivo da Marcha do Orgulho Trans de São Paulo, um dos maiores eventos de protagonismo de pessoas transgêneros, transexuais, travestis e não-binárias no Brasil.

Nesta conversa com a Fast Company Brasil, o executive fala sobre os caminhos da inclusão e diversidade de profissionais trans no país. 

FC Brasil – O que é diversidade dentro das empresas, na sua visão? E o que não é?

Pri Bertucci – Diversidade é saber que estamos falando de todes nós! A diversidade humana é um conjunto de características culturais, biológicas, sociais, econômicas, que fazem de cada indivíduo um ser único. O que poderia ser diversidade dentro das empresas: criar ambientes seguros com foco em reconstruir e regenerar o hiato causado pelo privilégio de um grupo social.

os melhores talentos vão escolher empresas que estejam realmente alinhadas com valores de DEI&P (diversidade, equidade, inclusão e pertencimento).

O que não é diversidade, hoje, na maioria das empresas: o equívoco de que diversidade é só colocar para dentro. Não é diversidade tokenizar um grupo de pessoas minorizadas socialmente como “diversas" e usá-las só para cumprir a meta e a “cota” de diversidade, sem plano de encarreiramento para essas pessoas, só para a empresa poder ganhar prêmios no final do ano.

FC Brasil As empresas querem inovação. E não há inovação sem diversidade. Mas os RHs estão preparados para fazer contratações que promovam um ambiente propício à inovação?

Pri Bertucci – Pesquisas apontam que os melhores talentos vão escolher empresas que estejam realmente alinhadas com valores de DEI&P (diversidade, equidade, inclusão e pertencimento). Empresas que só querem "mostrar que tem diversidade e que são inclusivas" como estratégia de negócio e para ganhar prêmios já viraram alvo de críticas e cancelamentos em redes sociais.

O que eu vejo acontecendo hoje no Brasil é uma corrida pela “diversidade perfumaria”. Vejo poucas empresas que têm realmente desejo de mexer nas estruturas, atualizar sua cultura baseada na masculinidade tóxica, de forma genuína.

Nos últimos 12 anos em que estou à frente do Instituto [SSEX BBOX] e da [DIVERSITY BBOX] consultoria, posso perceber um avanço. Mas em um ritmo muito mais lento do que o esperado pelos grupos social e economicamente minorizados.

FC Brasil Você foi a pessoa co-criadora da linguagem neutra para o português. Qual a importância de um novo léxico que contemple a diversidade de gênero?

Pri Bertucci – A importância é que o que está por trás da linguagem neutra e inclusiva, as palavras que usamos para nos comunicar, são mais que simples palavras. O linguista norte-americano Benjamin Lee Worth estudou de que forma a fala influencia a maneira como pensamos, trabalhando com a nação indígena Hopi, no norte do Arizona, nos Estados Unidos. A  linguagem está ligada à maneira como nosso sistema nervoso é programado.

As empresas, infelizmente, ainda preferem consultorias de DEI&P lideradas por homens cisgêneros do que por pessoas trans.

A linguagem neutra e inclusiva existe para incluir toda a diversidade da experiência humana. Ou seja, ela serve para incluir e não para excluir, como afirmam algumas pessoas leigas sobre o tema. A linguagem neutra, em especial, existe em todo o mundo para incluir a existência de pessoas trans não binárias e como alternativa para a não generalização do masculino, principalmente em línguas latinas, como é o caso do português.

Línguas dominantes são cíclicas. A língua é viva e emergente, como todes nós. Ela está sempre em movimento, principalmente em meio à comunicação verbal. A linguagem deve acompanhar as mudanças sociais de uma época e de um povo. Por isso, é muito importante entendermos não só a necessidade, como a demanda que a atualidade traz a respeito da linguagem neutra e inclusiva.

Confesso que é muito satisfatório ver o resultado se desdobrando, depois de uma década inteira de trabalho e consistência na divulgação dessa pauta. Ao mesmo tempo, percebo uma grande onda de informações desconexas e incorretas propagadas por influenciadories que querem surfar no tema para ganhar visibilidade, mas não têm conhecimento adequado para passar informações consistentes sobre linguagem neutra.

FC Brasil Ser CEO trans no país que mais mata pessoas transgênero no mundo é revolucionário. Quais são as ações necessárias para que você não seja uma exceção?

Pri Bertucci – Mesmo sendo CEO de uma das melhores consultorias de diversidade do Brasil, ainda encontro inúmeras barreiras e resistências. As empresas, infelizmente, ainda preferem consultorias de DEI&P lideradas por homens cisgêneros do que por pessoas trans.

Pensando nesses desafios que eu mesmo experimento, criamos projetos em parceria com empresas que incentivem ações lideradas por pessoas trans. Isso está na moda da pauta de ESG, mas no S de SOCIAL ainda é muito esquecido.

Fomentar projetos assim deveria ser prioridade para qualquer gestão de diversidade. Financiar esses projetos é essencial para que empreendedories de grupos minorizados possam se fortalecer e amadurecer em suas carreiras, ampliando o potencial de geração de renda e empregabilidade de cada negócio.

FC Brasil Qual cenário você enxerga quando pensa no futuro dos negócios?

Pri Bertucci – Segundo pesquisas recentes da Deloitte, em cinco anos, 65% da força de trabalho será da geração Y

A linguagem neutra e inclusiva existe para incluir toda a diversidade da experiência humana.

(nascidos nos últimos anos da década de 1970). E muites millennials, que já estão emergindo como líderes em tecnologia e outras indústrias, querem trabalhar para organizações que fomentem o pensamento inovador, que desenvolvam suas habilidades e que deem uma contribuição positiva para a sociedade.

O estudo também revela que millennials acreditam que as empresas não estão fazendo tanto quanto poderiam para desenvolver suas habilidades de liderança e que iles precisam nutrir as pessoas que serão as futuras líderes.

Afinal não são só as pessoas colaboradoras LGBTQIAP+ que querem estar sintonizades com a cultura de uma organização. As pessoas colaboradoras heterossexuais da geração Z aliadas a causas de DEI&P e da geração do milênio – que em breve formarão a maioria da força de trabalho – também se preocupam profundamente com a inclusão e são mais propenses a defendê-la do que as gerações anteriores.

Diante desse cenário, há muitos benefícios para as empresas que aprendem a fazer uma gestão de diversidade responsável e entendem que isso está diretamente ligado ao negócio. Isso traz melhor desempenho financeiro, inovação, menos atrito e uma equipe mais engajada.


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