5 perguntas para Sérgio Serapião, CEO da Labora

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Redação Fast Company Brasil 7 minutos de leitura

Há 15 anos, Sérgio Serapião é especialista em uma área que está crescendo, mas segue fora do radar de muitos profissionais de relações humanas: a população com mais de 60 anos. Como fundador da LAB60+ e CEO da Labora, ele trabalha para reinserção do público 60+ em empresas, incentivando a reinvenção do trabalho sênior.

O CEO da Labora criou, em 2014, o Instituto LAB60+, com o objetivo de entender os desafios da população com mais de 60 anos nos ambientes profissionais. O resultado se tornou a chave do trabalho de Serapião, que percebeu uma incongruência entre a longevidade crescente e a relação das companhias com o envelhecimento da população.

Combater o etarismo é necessário para discussões de diversidade, mas também para o futuro do país. É esperado que, até 2050, um terço da população brasileira tenha mais de 60 anos. O que as companhias devem fazer para se preparar para a nova realidade?

FC Brasil – A Labora é sustentadora do Lab60+, organização que trabalha em favor da inclusão de pessoas com mais de 60 anos no mercado de trabalho. Por que é importante colocar a dimensão etária nas conversas e discussões sobre diversidade e inclusão nas empresas?

Sérgio Serapião – A Labora é uma startup que nasceu de um mergulho que fizemos nesse tema de longevidade a partir da iniciativa Lab60+, criada em 2014. Na época, conduzi vários encontros para discutir o que significava longevidade com diferentes grupos de pessoas.

No âmbito das empresas, não dá mais para negar a transformação demográfica. Estamos ganhando 1% de pessoas 50+ a cada ano.

Percebi que havia um tripé permanente de preocupações com relação ao envelhecer: medo de ficar doente, de não ter dinheiro e do isolamento social. Mesmo com as discussões feitas em estados, países e classes sociais diferentes, as preocupações eram basicamente essas.

Estamos vivendo uma nova longevidade. No âmbito pessoal, é um tema de diversidade que vai impactar qualquer pessoa, querendo ou não. Temos uma vida mais longa e ela muda o jeito que a gente vive e trabalha.

Quanto mais consciência tivermos sobre esse tema, mais fácil vai ser construir essa nova relação para ter uma vida boa. No âmbito das empresas, não dá mais para negar a transformação demográfica.

O Brasil é um dos países que envelhece mais rápido no mundo. Estamos ganhando 1% de pessoas 50+ a cada ano. Hoje, elas são 25% de todos os brasileiros e daqui a pouco serão 40%. Empresas que não estejam atentas a isso, que não mudem a forma de se relacionar com seus funcionários, que não consigam atrair pessoas mais velhas, mantê-las no quadro de funcionários e ativar esses talentos vão enfrentar dificuldades com mão-de-obra.

Isso já está acontecendo. Essa guerra de talentos que a gente vê em algumas áreas certamente é por uma miopia de olhar só para o grupo jovem, que historicamente sempre resolveu os problemas do mercado de trabalho. É o grupo que sempre foi atraído para as empresas. Só que isso mudou. A pirâmide mudou, precisamos ampliar as possibilidades de atrair pessoas diferentes.

FC Brasil – Como as organizações podem combater o etarismo? Que medidas práticas podem ser tomadas para se chegar a esse objetivo?

Sérgio Serapião – Um bom começo é reconhecer que vivemos em uma cultura jovem-cêntrica. Até pouco tempo atrás, as pessoas morriam muito cedo, por volta dos 45 anos. Ganhamos muitos anos de vida em muito pouco tempo, mas o nosso “chip cultural" ainda percebe a fase juvenil, o jovem adulto, como ápice da vida. Não consegue ver as belezas que há nas fases posteriores.

É preciso diagnosticar o gap de diferentes idades na empresa. Quantas pessoas foram contratadas nos últimos 12 meses que eram 50+?

Estamos com o chip ultrapassado, achando que, a partir dos 40 anos, é só “ladeira abaixo”, e não é. Tem uma série de ganhos. Não vamos perder inteligência relacional porque passamos dos 40. O mesmo vale para todas as múltiplas inteligências. Os anos jogam a favor na construção de soft skills.

O que precisamos é atualizar o chip cultural. Esse chip – que está na sociedade e embutido nas culturas corporativas – foi decantado nos processos do RH. Nos processos seletivos, de carreira, modelo de avaliação… Todos acabam demonstrando viés inconsciente com a idade. Especialmente em relação aos mais velhos.

Como primeiros passos, precisamos tomar consciência dessa realidade e diagnosticar o gap de idades diferentes que existe na empresa, sem levar em conta as questões hierárquicas. Quantas pessoas foram contratadas nos últimos 12 meses que eram 50+? Será que chegou a 25%, que é a representatividade desse grupo na população? Provavelmente, não.

FC Brasil – Quais os principais desafios para ter a combinação de gerações dentro de uma empresa?

Sérgio Serapião – O desafio é criar um ambiente e uma cultura inclusiva para todos, todas e todes. Cultura intergeracional é mais do que ter cinco gerações na empresa. É ter, em um mesmo nível hierárquico, diferentes tipos de idades. Os pares com idades diferentes, e não apenas o chefe mais velho com um funcionário subordinado que é mais jovem.

É preciso estar aberto ao novo. Essa vai ser a característica da longevidade - a capacidade de navegar no novo.

Essa cultura, para dar conta de ser realmente inclusiva, vai ter que ter a consciência da interseccionalidade do tema – idade e gerações. Uma mulher preta 50+ é diferente de um homem branco 50+. Os marcadores identitários e as suas vulnerabilidades e preconceitos tendem a se exponencializar conforme a idade. Não podemos ignorar as outras diversidades, não pode ser uma caixinha isolada.

O que tenho visto que realmente funciona é prototipar, usar um jeito de pensar ágil, ter exercícios de colocar squad intergeracional, um time terceiro intergeracional, para ver os reais conflitos que vamos vivenciar na cultura corporativa. Tem uma grande diferença quando a gente desassocia idade e nível hierárquico.

FC Brasil – Que conselho daria para o profissional 50+ que, no momento, passa por uma recolocação do mercado ou um reposicionamento de carreira?

Sérgio Serapião – O importante é contextualizar primeiro. Quando prestei vestibular, há 30 anos, me perguntavam o que eu ia ser quando crescesse – engenheiro, administrador... Havia um entendimento de que a carreira seria uma só, fosse ela em uma única empresa ou em várias. Era esperado que a carreira durasse entre 20 e 25 anos. Isso mudou.

As mudanças são cada vez mais rápidas. O futuro do trabalho são relações cada vez mais flexíveis e menos rígidas.

A grande novidade que a longevidade traz é uma vida mais longa conjugada à aceleração tecnológica. Isso nos coloca um desafio que nunca tivemos, que é a necessidade de criar círculos profissionais durante a vida. Não é só mais uma carreira, são duas ou três, talvez múltiplas carreiras em paralelo. Isso traz uma demanda para a pessoa continuar a aprender por toda a vida, estudar por toda a vida.

É preciso ter consciência de que vai ter que abandonar uma carreira por causa da tecnologia. Não se trata mais de uma carreira ascendente, são vários ciclos. É preciso repensar o estilo de vida para se adequar a esses ciclos. Existe um esforço maior para ter vínculos de relacionamento mais profundo, porque é preciso estar sempre aberto para a reinvenção.

Para quem já está nessa situação, isso não quer dizer que tem que abandonar a carreira anterior, mas estar aberto ao novo. Seja o novo uma nova carreira ou novos elementos que surgiram rapidamente com a tecnologia e a inovação. Essa vai ser a característica da longevidade: a capacidade de navegar no novo.

FC Brasil – Qual o futuro das relações de trabalho?

Sérgio Serapião – Nos últimos cinco anos, houve uma mudança rápida e drástica no ambiente de trabalho. Não só a pandemia, mas a tecnologia, nos trouxeram os modelos de trabalho remoto e híbrido. Mais do que isso, tem uma demanda latente por uma força de trabalho bem menos rígida do que havia.

Cultura intergeracional é ter, em um mesmo nível hierárquico, diferentes tipos de idades.

Era comum avaliar o grau de solidez e maturidade de uma empresa a partir do número de funcionários. Provavelmente, esse indicador vai passar a ser uma métrica muito mais para indicar o risco da empresa do que sua solidez.

As mudanças são cada vez mais rápidas, temos tecnologias surgindo e as habilidades que a empresa precisa não necessariamente estão no grupo de funcionários. Elas podem estar em outras pessoas. Isso muda tudo. O futuro do trabalho são relações cada vez mais flexíveis e menos rígidas.

Não dá para pensar um futuro do trabalho que não seja flex, que não seja tecnológico e que não seja com pessoas diversas. A tecnologia diminuiu a barreira de entrada para o processo educacional das empresas. Elas perceberam que há força em não ficar em um grupo tão pequeno e homogêneo de pessoas. E é algo que tende a continuar crescendo.


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