Especialista em aprendizagem explica por que aprendemos mais quando erramos

Tornar o aprendizado inicial mais difícil e desafiador, onde você pode falhar ao resolver um problema, pode ser bom para processo de aprendizagem

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Manu Kapur 4 minutos de leitura

Imagine que você está assistindo a um filme, uma obra deliciosamente envolvente e divertida. Agora imagine que a pessoa sentada ao seu lado é um diretor famoso, especialista em cinema. Será que vocês dois verão o mesmo filme?

Em certo sentido, sim: a mesma sequência de imagens aparecerá diante de ambos. Mas o que você vai notar nas imagens, os padrões que vai ver, o significado que vai atribuir a vários elementos do filme, até mesmo as coisas que depois se lembrará de ter visto, provavelmente serão diferentes – a menos que você também seja um especialista.

Décadas de pesquisa sobre a diferença entre especialistas e novatos demonstraram claramente que os primeiros veem coisas de forma diferente do que os segundos. Novatos tendem a ver características superficiais, mas os especialistas veem o que é essencial, a estrutura profunda e os elementos críticos. E é ao enxergar a estrutura profunda que surge a compreensão e o aprendizado eficaz.

Acontece que ver não é apenas um exercício perceptivo, mas também cognitivo. Não vemos apenas com os olhos, mas com a mente. Ver é uma função do que se sabe. E aqui está o paradoxo (e desafio) de ensinar um novato.

Um novato, por definição, não tem o conhecimento necessário para ver o que é crítico. No entanto, ele precisa, de alguma forma, ser capaz de enxergar os aspectos essenciais para desenvolver sua expertise.

A solução para o paradoxo está em perceber que a primeira tarefa de ensinar não é exatamente ensinar, mas preparar o novato para ver com os olhos de um especialista.

De fato, meu erro como professor de matemática foi supor que meus alunos poderiam entender os princípios que eu estava tentando lhes mostrar. Em vez disso, eu precisava ativar a capacidade deles de ver os aspectos críticos do problema antes de esperar que pudessem compreender completamente a solução.

Percebi que a melhor maneira de ensinar algo é envolver os alunos em atividades de resolução de problemas especificamente projetadas para que eles lutem produtivamente e até falhem, e só então dar-lhes a explicação correta ou uma aula expositiva.

é natural procurar o caminho mais fácil. No entanto, tornar o aprendizado fácil nem sempre facilita o aprendizado.

Em lugar de esperar que o fracasso acontecesse, queria provocá-lo e, a partir dele, criar oportunidades de aprendizado ensinando depois de os alunos terem tentando resolver o problema sozinhos, transformando o fracasso inicial em aprendizado profundo, ou seja, em "falha produtiva".

Desde que tive essa percepção, descobri que, ao falharem e começarem a entender as razões de suas falhas, os alunos podiam começar a abordar um problema de uma maneira que lhes permitisse enxergar os elementos essenciais para o sucesso. Eles estariam, então, preparados para aprender com explicações, instruções ou feedback de especialistas.

Como aperitivo, deixe-me dizer que os alunos que passaram pela "falha produtiva" demonstraram uma compreensão bem mais profunda dos conceitos, bem como uma maior capacidade de transferir o que foi aprendido para novos problemas, do que os alunos que receberam instrução direta.

Moral da história: ao aprender algo novo, é muito fácil encontrar o caminho de menor resistência. E é natural procurar o caminho mais fácil. No entanto, tornar o aprendizado fácil nem sempre facilita o aprendizado. Se não for projetado para aproveitar o fracasso nas fases iniciais, o aprendizado tende a ser superficial e inflexível.

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Com a falha produtiva, o aprendizado se torna profundo, flexível e adaptável. A ideia sugere que tornar o aprendizado inicial mais difícil e desafiador, onde você pode lutar e até falhar ao resolver um problema ou realizar uma tarefa, pode ser bom para o processo de aprendizagem.

Para deixar claro, a proposição da falha produtiva não é simplesmente que o fracasso, se e quando ocorrer, deve ser visto e usado como uma oportunidade de aprendizado. Claro que todos cometemos erros de vez em quando, tropeçamos e falhamos. Todos podemos nos relacionar com essas experiências, e acredito que algumas das nossas lições mais profundas podem vir de nossos erros.

Com a falha produtiva, o aprendizado se torna profundo, flexível e adaptável.

Na falha produtiva, a pergunta é: se o fracasso é realmente um bom professor, por que espera que ele aconteça? Por que não projetamos intencionalmente para que isso ocorra?

Vamos usar a energia solar ou eólica como uma analogia. Sabemos que essas são fontes naturais de energia. Esperamos que elas gerem energia por acaso? Não. Projetamos ferramentas e tecnologias para aproveitar essa energia para nosso uso.

O mesmo vale para o fracasso. A proposição é que, em vez de esperar que aconteça, devemos ser mais proativos e projetá-lo intencional e sistematicamente, para que todos possam ter a oportunidade de aprender com ele. Ao projetar dessa forma, podemos acelerar o processo de aprendizado inicial e alcançar resultados impressionantes.


SOBRE O AUTOR

Manu Kapur é especialista em ciência da aprendizagem e lideram a Future Learning Initiative na Universidade de Zurique. saiba mais