Como saber se você corre o risco de perder o emprego para uma IA
Neurocientista computacional analisa o passado em busca de respostas
O interesse pelo ChatGPT explodiu desde que a OpenAI o lançou em novembro de 2022. Em apenas dois meses, o chatbot alcançou um marco histórico: 100 milhões de usuários. As reações a essa tecnologia vão da admiração pela velocidade e clareza das respostas ao receio sobre o impacto da IA no mercado de trabalho e no futuro.
Quase diariamente, surgem notícias sobre aplicações surpreendentes do ChatGPT, desde ajudar médicos a demonstrar empatia até contribuir para a valorização de mercado de US$ 3 trilhões da Nvidia, que fabrica os chips gráficos (GPUs) usados para treinar redes de aprendizado profundo.
Frequentemente, depois das minhas palestras, me perguntam: “vou perder meu emprego para a IA?”. Com tantas manchetes alarmantes, é compreensível que as pessoas estejam apreensivas. Para entender o que esperar, vale a pena analisar o impacto de outro período de transformação: a Revolução Industrial.
A Revolução Industrial mudou radicalmente a vida das pessoas da época. A invenção do motor a vapor, por exemplo, aumentou a capacidade física humana, permitindo que um único agricultor arasse uma área centenas de vezes maior do que antes, quando usava cavalos. Com isso, a necessidade de agricultores diminuiu, mesmo com o crescimento populacional.
Quando o presidente Abraham Lincoln criou o Departamento de Agricultura dos EUA, em 1862, 90% dos norte-americanos eram agricultores. Em 1900, 40% da população ainda vivia em fazendas, mas hoje apenas cerca de 1% continua no campo.
No século 19, com a diminuição da demanda por agricultores, muitos de seus filhos migraram para as cidades em busca de emprego nas novas indústrias. Novas funções surgiram e o sistema educacional se expandiu para preparar a força de trabalho para operar máquinas. Essa transformação ocorreu ao longo de mais de um século, o que permitiu que gerações se adaptassem gradualmente.
O impacto foi maior em trabalhos físicos, como agricultura e construção, enquanto profissões que exigiam habilidades intelectuais, como médicos, advogados e professores, seguiram relativamente inalteradas.
A Revolução Industrial aumentou a capacidade física humana e a Revolução da Informação está expandindo nosso poder cognitivo.
Mesmo em setores manuais, como o transporte, as habilidades exigidas mudaram. Quando os automóveis substituíram os cavalos, o número de ferreiros nos EUA caiu de 15 mil em 1860 para cerca de mil hoje, apesar do crescimento populacional. Em compensação, existem atualmente cerca de 600 mil mecânicos de automóveis no país.
Os grandes modelos de linguagem (LLMs, na sigla em inglês) são a fase mais recente de uma revolução da informação que começou com os computadores em meados do século 20 e ganhou força com a internet nos anos 1990. Esta revolução já transformou quase todos os aspectos da nossa vida e continua evoluindo.
Ao longo dos últimos 50 anos, muitos acreditaram que a automação eliminaria empregos, causando rupturas. Por que essas previsões não se concretizaram? O trabalho foi reconfigurado e novos postos surgiram.
A era da informação trouxe muitos novos empregos: desenvolvedores de sites, designers digitais, profissionais de marketing, cientistas de dados, analistas de segurança cibernética, entre outros.
Se o impacto dos LLMs for semelhante ao da internet, podemos esperar uma variedade de novas funções relacionadas ao seu trabalho atual – funções que tendem a ser mais satisfatórias, já que tarefas repetitivas seriam automatizadas. Em vez de substituir empregos, veremos uma transformação.
Os LLMs ainda estão evoluindo, mas têm o potencial de revolucionar o trabalho profissional. Automatizando tarefas e facilitando o acesso a informações, eles podem tornar os profissionais mais produtivos, liberando tempo para focar em atividades criativas e estratégicas.
Os LLMs são a fase mais recente de uma revolução da informação que ganhou força com a internet nos anos 1990.
Diversas profissões já utilizam esses modelos para facilitar o trabalho diário – do direito à medicina, passando por jornalismo, publicidade, ciência e engenharia.
Alguns temem que a inteligência artificial possa substituir seus empregos, mas, para muitos, ela está acelerando tarefas repetitivas, liberando tempo para atividades mais envolventes e criando novas oportunidades. Surpreendentemente, a IA está realmente nos tornando mais inteligentes.
A Revolução Industrial aumentou a capacidade física humana e a Revolução da Informação está expandindo nosso poder cognitivo. Essa mudança está acontecendo de forma muito mais rápida, em décadas, e não em séculos, o que significa que transformações que antes levavam gerações vão ocorrer ao longo das nossas vidas.
Estamos vendo o futuro se desenrolar bem diante dos nossos olhos.
Trecho do livro “ChatGPT and the Future of AI: The Deep Language Revolution” (MIT Press), de Terrence J. Sejnowski, reproduzido com permissão.