Os prováveis efeitos de um novo governo Trump na economia nacional e internacional

Tudo vai depender de quem ele nomeará como seus principais assessores e as tarifas que vai de fato implementar

Crédito: Justin Merriman/ Bloomberg

Reuters 7 minutos de leitura

O retorno de Donald Trump à Casa Branca, após vencer as eleições presidenciais dos EUA, pode remodelar os negócios internamente e influenciar o mercado internacional. Vai depender muito de quem ele nomeará como seus principais assessores e as tarifas que ele vai de fato implementar.

A seguir, alguns dos principais temas e setores a se observar:

TARIFAS

Trump propôs uma tarifa de 10% sobre todas as importações dos EUA e de 60% sobre produtos fabricados na China, o que, se implementado, afetaria toda a economia ao elevar os preços ao consumidor.

O centro de estudos Tax Foundation calculou que as tarifas aumentariam os impostos em US$ 524 bilhões por ano, reduziriam o PIB norte-americano em pelo menos 0,8% e eliminariam 684 mil empregos, principalmente do varejo, o maior empregador do setor privado. Trump também sugeriu que poderia impor uma tarifa de 25% sobre as importações do México.

Essas propostas tarifárias poderiam reduzir o poder de compra dos consumidores locais entre US$ 46 bilhões e US$ 78 bilhões por ano, segundo um estudo da Federação Nacional de Varejo. As categorias mais afetadas seriam vestuário, brinquedos, móveis, eletrodomésticos e calçados, de acordo com o estudo.

Os varejistas mudariam suas operações para fora da China, optando por países como Bangladesh, Índia e Vietnã. Lojas de grande porte, como Walmart e Target, enfrentariam maiores custos na cadeia de suprimentos, enquanto supermercados como Kroger, Albertsons e Publix, que dependem minimamente da China, poderiam se beneficiar.

As tarifas também preocupam o setor de tecnologia. Nas últimas semanas, Trump criticou fortemente a Lei de Chips e Ciência, que busca subsidiar parcialmente empresas que constroem fábricas nos Estados Unidos. Ele afirmou que o país deveria impor tarifas sobre os chips que entram no país, especialmente os da TSMC, de Taiwan. As tarifas também aumentariam drasticamente os custos para as indústrias de energia renovável nos EUA, que dependem fortemente de componentes chineses.

E há ainda a questão da retaliação chinesa. A China é a maior importadora de soja e consumidora de carne suína do mundo, mas diversificou sua base de abastecimento desde as tarifas impostas por Trump em seu primeiro mandato. Além disso, a China não cumpriu totalmente o acordo de comprar mais produtos agrícolas dos EUA, assinado em 2020.

Trump prometeu, em seu segundo mandato, impor tarifas de 60% sobre importações da China, levantando preocupações de que Pequim retaliará reduzindo as importações de produtos agrícolas dos EUA.

PETRÓLEO: PERFURAR, MAS NÃO NO IRÃ

Os Estados Unidos já são o maior produtor mundial de petróleo e gás, mas Trump quer remover os últimos obstáculos. Ele prometeu suspender o congelamento de novas licenças de exportação de gás natural liquefeito, expandir leilões de perfuração, acelerar a concessão de licenças para novos oleodutos e deve tentar reverter ou enfraquecer as regulamentações destinadas a reduzir as emissões das usinas de energia e dos automóveis.

As propostas tarifárias de Trump poderiam reduzir o poder de compra dos consumidores em até US$ 78 bilhões.

Seu apoio à indústria de petróleo e gás também pode levá-lo a moderar sua oposição à Lei de Redução da Inflação, uma vez que as empresas de petróleo estão recebendo alguns financiamentos para iniciativas livres de carbono, como captura e sequestro de CO2.

O grande ponto de interrogação na política de petróleo é como Trump vai tratar exportadores rivais, incluindo Rússia, Arábia Saudita e Irã. É provável que alivie as sanções à Rússia, mas mantenha as impostas ao Irã, segundo Ed Hirs, especialista em energia da Universidade de Houston.

SINDICATOS

O movimento sindical fez grandes avanços sob o presidente Joe Biden, que chegou a participar de um piquete com trabalhadores da indústria automotiva. O sindicato da categoria quer se expandir e, em futuras greves, o governo federal poderia ser solicitado a intervir de forma a reduzir o poder de barganha dos trabalhadores – algo que os democratas, até agora, se recusaram a fazer.

Os republicanos em geral não são favoráveis aos sindicatos, mas Trump adota uma postura diferente, buscando apoio entre a classe operária. O forte apoio de muitos trabalhadores sindicalizados pode pressioná-lo a proteger esses eleitores, analisa Anthony Miyazaki, professor de marketing da Universidade Internacional da Flórida.

Greve dos portuários (Crédito: Marta Lavandier/ AP)

Ainda assim, seu histórico de indicações para o Conselho Nacional de Relações Trabalhistas resultou em uma redução dos direitos dos trabalhadores de formarem sindicatos. Se esse ciclo se repetir, isso poderá reverter os avanços obtidos pelos sindicatos desde a pandemia, incluindo esforços bem-sucedidos de organização na Starbucks e na Amazon.

FINANÇAS

No setor bancário, JPMorgan, Goldman Sachs, Bank of America e outros credores provavelmente terão um alívio no aumentos de capital, nas dificuldades em fusões e aquisições e sobre as "taxas abusivas" de Biden. Espera-se que o novo presidente indique republicanos pró-indústria como reguladores financeiros.

No entanto, esses ganhos podem ser anulados se Trump levar adiante políticas fiscais e comerciais que ampliem o déficit e aumentem a inflação, elevando, por sua vez, as taxas de empréstimos.

ANTITRUSTE E TECNOLOGIA

Trump pode recuar na tentativa do Departamento de Justiça de desmembrar o Google (da holding Alphabet) e preferir acordos com as empresas sobre questões de concorrência em vez de continuar com as ações judiciais. É quase certo que a líder da Comissão Federal de Comércio, Lina Khan, deixará o cargo.

De forma mais ampla, apoiadores de Trump no Vale do Silício, incluindo os investidores Peter Thiel e Marc Andreessen e o dono da Tesla, Elon Musk, querem menos regulamentação para novas tecnologias, desde inteligência artificial até foguetes. Eles têm um defensor no vice-presidente eleito J.D. Vance, ex-investidor de risco.

MÍDIA: CUIDADO COM O QUE VOCÊ DIZ

Dias antes da eleição, o dono do diário "The Washington Post", Jeff Bezos (fundador da Amazon), decidiu que o jornal não apoiaria nenhum dos candidatos, classificando a decisão como uma questão de princípio para recuperar credibilidade.

Centenas de milhares de pessoas cancelaram suas assinaturas, muitas acusando o jornal de covardia política. "USA Today" e "LA Times" também recusaram apoiar um candidato.

JD Vance, vice-presidente eleito (Crédito: Reprodução)

“A mensagem é bastante clara agora”, disse o ex-presidente da Comissão Federal de Comunicações (FCC, na sigla em inglês) Tom Wheeler. “É se render ao tirano antes mesmo de ser solicitado”, afirmou Helio Fred Garcia, professor adjunto da Escola de Estudos Profissionais da Universidade de Nova York e autor de dois livros sobre Trump.

Durante a campanha, o então candidato pediu à FCC que retirasse as licenças de transmissão das redes de TV ABC e CBS. A presidente da comissão, Jessica Rosenworcel, criticou a iniciativa, citando a proteção à liberdade de expressão. Mas a independência da FCC pode estar sob risco se Trump seguir com a promessa de colocar as agências reguladoras sob a autoridade presidencial.

QUAL SERÁ O PAPEL DE ELON MUSK?

Trump declarou que nomearia Elon Musk para liderar uma nova comissão de eficiência governamental. O CEO da Tesla afirmou que pelo menos US$ 2 trilhões poderiam ser cortados do orçamento federal de US$ 6,75 trilhões. A forma como isso ocorrerá pode ser uma peça-chave no próximo governo.

Eficiência significa menos regras e reguladores? Musk tem sido um crítico feroz, por exemplo, da revisão federal sobre sua empresa de foguetes SpaceX. Isso poderia significar menos supervisão sobre carros autônomos (um negócio da Tesla), lançamentos de foguetes e muito mais.

Crédito: Reprodução/ YouTube

Trump prometeu ser um “presidente das criptomoedas”, e um dos primeiros passos pode ser substituir Gary Gensler, atual presidente da Comissão de Valores Mobiliários (SEC) e opositor da indústria, que processou grandes players do setor.

O substituto de Gensler deverá revisar – e possivelmente anular – regras contábeis e criar isenções para a indústria em relação às regras da SEC. Musk também apoia as criptomoedas, assim como o apoiador de Trump no Vale do Silício Marc Andreessen e o vice-presidente eleito J.D. Vance.

Musk também é um grande defensor da energia sem carbono, com a Tesla sendo uma importante fornecedora de sistemas solares e baterias. Trump prometeu acabar com a indústria de energia eólica offshore e cancelar todos os fundos não utilizados da Lei de Redução da Inflação — a principal legislação climática de Biden.

Mas ele enfrenta dissidências em suas fileiras: parlamentares, empresas petrolíferas e outros veem enormes ganhos nos estados republicanos com essa lei. Musk tem aproveitado isso, construindo sua segunda fábrica de veículos elétricos dos EUA no Texas, por exemplo.


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