5 perguntas para Camila Novaes, diretora de marketing da Visa Brasil
Camila Novaes é diretora de marketing da Visa Brasil e lidera o Comitê de Inclusão & Diversidade da empresa, atuando em frentes estratégicas voltadas para raça, gênero, pessoas com deficiência (PcD) e LGBTQIA+. Com experiência profissional de mais de 20 anos, ela passou por grandes corporações como Sony, Cielo e Mobile.
Desde 2016 na Visa, a executiva também se destaca por seu engajamento em iniciativas de diversidade. Foi membro da Rede de Profissionais Negros e do grupo Publicitários Negros.
Também lidera mentorias, conectando inovação e diversidade para criar impacto social. Reconhecida pelo prêmio "Women to Watch 2022, Camila reforça a importância de uma cultura corporativa mais justa e plural.
Nesta entrevista para a Fast Company Brasil, a executiva fala sobre inteligência artificial no marketing e a importância das politicas de DEI para os negócios.
FC Brasil – Como imagina o futuro do marketing em um mercado cada vez mais orientado por dados? Como vocês têm usado IA nas estratégias de marketing?
Camila Novaes – A inteligência artificial está presente na Visa desde 1993. Fomos os pioneiros na indústria de pagamentos ao adotar a tecnologia de forma preditiva para a detecção e prevenção de fraudes.
Estamos acompanhando um movimento de mercado significativo em prol da personalização e conveniência, o que demanda que as marcas compreendam melhor os hábitos e desejos dos consumidores.
Por isso, desde 2021, as campanhas que desenvolvemos contam com a expertise dos nossos especialistas em data science e marketing, reforçando nossa estratégia de oferecer serviços de valor agregado por meio de uma atuação 360º focada no sucesso dos nossos clientes.
Esse trabalho se materializa por meio da Visa Marketing Platform, uma solução que permite criar e executar campanhas personalizadas de acordo com o comportamento transacional de cada credencial, gerando resultados sólidos, alcançando CTRs de até 40% e taxas de abertura acima da média.
Um exemplo é nossa mais recente campanha proprietária, lançada durante o histórico jogo da NFL no Brasil para o Super Bowl LIX: “Super Bowl: Mais perto a cada jarda”.
Analisando o perfil de consumo de cada credencial, conseguimos identificar o interesse dos participantes em dois pacotes de viagem para o Super Bowl ou em prêmios de até R$ 1 mil, sorteados para mais de 200 portadores. A promoção conquistou um milhão de inscritos no primeiro fim de semana e, atualmente, ultrapassa a marca de dois milhões.
Outra solução que reforça o trabalho conjunto dos times de marketing e data science é a Jornada do Viajante. Usando modelos de inteligência artificial, processamos dados para oferecer comunicações personalizadas e ofertas de acordo com o perfil e o momento da viagem.
A assertividade das nossas campanhas resultou no aumento do engajamento em um dos principais programas para consumidores brasileiros, o Vai de Visa. Nos últimos quatro anos, a base de portadores de credenciais Visa cresceu quase 30 vezes, e o número de empresas parceiras no programa mais que quadruplicou entre 2012 e 2024, chegando a 88.
Além disso, a IA é uma forte aliada do trabalho em todas as áreas, não apenas no marketing. Temos acesso ao GitHub Copilot e a uma instância segura do GPT-4, o que não só otimiza nossos processos, mas também acelera o potencial de inovação.
A atuação das empresas tem que ir além da esfera econômica, englobando também a parte social.
O GitHub Copilot nos ajuda com soluções que agilizam tarefas repetitivas e aumentam a eficiência na programação. A instância segura do GPT-4, por sua vez, permite realizar análises avançadas, criar conteúdo técnico rapidamente e obter insights para a tomada de decisões.
Desde a análise de dados até a personalização de conteúdo e monitoramento de mídia, a IA tem se mostrado indispensável. Com essas soluções, aumentamos a produtividade de todo o time, permitindo que possamos focar em estratégias e inovações de alto impacto.
FC Brasil – Como você tem trabalhado a integração das práticas de ESG na Visa e quais são os principais desafios e oportunidades para alinhar essa agenda aos resultados financeiros e ao impacto social no longo prazo?
Camila Novaes – Há cinco anos, criamos o nosso Comitê Interno de Inclusão & Diversidade, com o qual realizamos um trabalho de educação e conscientização sobre os temas que abrangem esta frente, além de diversas iniciativas internas para promover um ambiente de trabalho respeitoso e diverso.
Analisamos a diversidade do quadro de colaboradores, levando em conta a composição demográfica e aspectos como gênero e etnia. Dessa forma, ajustamos nossos programas de contratação inclusiva, como o programa de estágio com recorte racial e a contratação de pessoas com deficiência.
Também estabelecemos metas de inclusão e diversidade (I&D) direcionadas à liderança, sustentadas por pesquisas de engajamento e satisfação dos colaboradores, que nos ajudam a medir a percepção interna sobre as iniciativas de diversidade e inclusão.
A partir dessas escutas, traçamos boa parte da estratégia do comitê. Essas métricas combinadas oferecem uma visão abrangente do progresso da Visa em direção a um ambiente mais inclusivo e diversificado.
Tudo isso só é possível porque reconhecemos a inclusão e diversidade nos nossos princípios de liderança e cultura. Isso nos permitiu aproveitar o poder da diversidade para impulsionar a inovação e fomentar o nosso crescimento enquanto negócio.
Ao posicioná-la como um pilar estratégico, conseguimos trabalhar e vencer juntos como parceiros, entendendo mercados mais diversos e potencializando nossos resultados. E é justamente esse engajamento contínuo que impede que a diversidade se torne apenas uma moda passageira.
A diversidade, portanto, não é uma agenda que podemos abandonar. Ela deve ser um pilar contínuo de transformação.
FC Brasil – Poderia dar exemplos de como essas práticas mexem no ponteiro dos negócios, ou seja, melhoram o desempenho de uma empresa?
Camila Novaes – A atuação das empresas tem que ir além da esfera econômica, englobando também a parte social. Negócios que não apoiam causas importantes e/ ou atuam de forma conflitante com algumas pautas tendem a ter cada vez menos sucesso financeiro. Por isso, é importantíssimo integrar diversidade e inclusão ao negócio.
Um grande exemplo de integração da diversidade e inclusão ao negócio e seu aspecto financeiro é o Visa Causas, iniciativa que permite aos portadores de cartões Visa contribuir para causas sociais cada vez que usam seu cartão. O programa facilita e incentiva a doação para organizações sem fins lucrativos e projetos sociais, colocando o consumidor no controle das nossas ações.
A cada compra realizada com um cartão Visa, uma pequena porcentagem do valor ou uma quantia fixa é doada automaticamente para uma causa escolhida pelo portador, e até o momento já foram realizadas quase 500 milhões de doações.
A parceria com o Parabank também se alinha perfeitamente com os valores da Visa. É um banco que foi criado por um ex-atleta paralímpico, pensado para atender as necessidades específicas do público PcD.
Lançamos os cartões inéditos, com as versões físicas com funções táteis, por exemplo, e benefícios como parcerias com clínicas de reabilitação e um canal de marketplace com atendimento personalizado.
Além disso, Visa e Parabank acreditam que a inclusão financeira é fundamental para promover a inclusão e a diversidade como um todo. Ao lançar um produto voltado especificamente para o público PcD, colaboramos com a inclusão de uma parcela da população que, muitas vezes, é excluída do sistema financeiro tradicional.
Já o Elas Prosperam promove ciclos de capacitação e mentoria para empreendedoras negras, com o objetivo de ajudá-las a impulsionar os seus negócios. Ao final de cada edição, cinco mulheres são selecionadas para ganhar um capital semente de R$ 10 mil.
Mais do que capacitar empreendedoras negras, essa iniciativa é uma forma de empoderá-las, fazendo-as entender a importância de seus negócios para o desenvolvimento econômico de suas comunidades e do país como um todo.
Por isso, além de aulas de finanças e gestão, elas também têm mentorias em temas como autoconhecimento e liderança. Em 2024, chegamos à quinta edição do Elas Prosperam. Desde 2020, já foram mais de 4,5 mil empreendedoras inscritas e mais de mil mulheres impactadas.
De 2017 a 2023, o investimento de US$ 200 milhões por meio da Visa Foundation possibilitou a reversão de US$ 2 bilhões para comunidades locais pelo mundo, apoiando mais de quatro milhões de pequenas e médias empresas (PMEs) e a criação de um milhão de empregos.
FC Brasil – Quais são os próximos passos, na sua opinião, para que as empresas brasileiras sejam de fato mais inclusivas?
Camila Novaes – É essencial que as empresas tenham valores alinhados aos de seus públicos e que esses valores também sejam autênticos. É o que chamamos de “walk the talk” – não basta apenas discursar a favor de uma causa, é necessário atuar proativamente por ela.
Definir um propósito de marca genuíno é um processo de dentro para fora, que começa já na cultura da empresa. A partir daí, podemos conectar o DNA da marca com as mensagens que vamos passar e a forma como vamos passá-las para o público.
A inclusão e a diversidade fazem parte do DNA e da cultura da Visa, e acreditamos que a promoção desses valores são fundamentais para o crescimento do negócio.
Defender inclusão e diversidade na estratégia de negócios não funciona a menos que esses valores sejam inseridos de forma genuína na base da cultura da empresa.
As práticas de ESG são trabalhadas tanto internamente como externamente, porque, ao nos abrir para escutar os grupos sub-representados, conseguimos conhecer suas dores e objetivos e entender como podemos colaborar para que esses grupos prosperem.
Em 2022, firmamos uma parceria com a Indique, consultoria de diversidade e inclusão que conecta a comunidade negra ao mercado de trabalho, para criar o nosso primeiro programa de estágio exclusivo para pessoas negras.
Os selecionados seguiram um plano de desenvolvimento que incluiu mentorias com um time de especialistas e também receberam bolsa auxílio e bolsa de estudo para cursar inglês. Dois anos depois, todos(as) profissionais foram efetivados.
Também firmamos, em 2022, uma parceria com a Fundação Getúlio Vargas para um programa de bolsas de estudos para alunos(as) negros, contemplando ajuda de custo, curso de inglês e mentorias.
Também integramos o movimento Mulher 360 e ONU Mulheres, onde empregamos uma filosofia global de equidade salarial e promovemos a qualificação em oratória para todas as mulheres.
FC Brasil – Temos visto um recuo em programas de diversidade e inclusão em várias empresas. Google, Meta e Microsoft são alguns exemplos que fizeram cortes recentes em seus programas de DEI. A que você atribui esse movimento e o que pode ser feito para não haver retrocesso?
Camila Novaes – Defender os valores de inclusão e diversidade na estratégia de negócios não funciona a menos que esses valores sejam inseridos de forma genuína na base da cultura organizacional, a começar pela constituição das equipes e pela construção dos propósitos da empresa.
Quando isso não é feito e o tema começa a “esfriar”, as iniciativas tendem a não se sustentar. Uma das principais barreiras é a falta de apoio dentro da própria companhia. Felizmente, não é o caso da Visa, mas há locais onde as iniciativas de diversidade e inclusão são vistas de forma secundária.
Essa situação está conectada a uma outra barreira bastante comum, que é a da falta de recursos – sejam eles orçamentários ou humanos – para viabilizar ideias e ações.
Para superar essas barreiras, é essencial que exista um compromisso genuíno e contínuo de toda a organização, especialmente da liderança. Uma comunicação didática somada a ações de conscientização que envolvam todos os colaboradores e estrutura orçamentária adequada são fundamentais para criar um ambiente verdadeiramente inclusivo e diversificado em qualquer negócio.