COP29: como os países pobres planejam arranjar dinheiro para ações climáticas

Três questões principais dominam o debate: o valor necessário, a proporção entre doações e empréstimos e quem arcará com os custos

Crédito: Sergei Grits/ AP

Seth Borenstein, Sibi Arasu e Melina Walling 3 minutos de leitura

Assim como uma alavanca pode mover objetos pesados, as nações ricas esperam usar a “alavancagem financeira” para levantar os recursos que os países mais pobres precisam para enfrentar as mudanças climáticas.

A proposta envolve uma combinação complexa de doações, empréstimos e investimentos privados e se tornou o principal tema das negociações climáticas na COP29. Mas os países em desenvolvimento temem sair prejudicados, recebendo menos recursos do que o necessário e acumulando ainda mais dívidas.

Esta semana, no Brasil, líderes das 20 maiores economias do mundo emitiram um comunicado apoiando financiamentos robustos para os países mais pobres, além de mecanismos financeiros de alavancagem. O anúncio foi bem recebido por analistas e defensores do clima.

Na COP29, em Baku, o dinheiro é o foco central. Negociadores estão trabalhando para definir novos valores que ajudarão as nações em desenvolvimento a adotar energia limpa, se adaptar às mudanças climáticas e lidar com desastres naturais. Esses valores substituirão a meta atual de US$ 100 bilhões por ano, estabelecida em 2009.

Os debates giram em torno de três questões principais: qual será o valor total, a proporção entre doações e empréstimos e quem arcará com os custos.

A definição do valor total é o maior desafio e, segundo Yalchin Rafiyev, principal negociador da COP29, só será resolvida após os outros dois pontos serem definidos. Ele compara o processo a um efeito dominó, no qual uma decisão desencadeia as demais.

Até agora, os países ricos têm relutado em sugerir um valor inicial para as negociações. Rafiyev afirmou que a presidência da conferência está pressionando essas nações, argumentando que “o montante deve ser justo e ambicioso, atendendo às necessidades e prioridades globais”.

DOAÇÕES, EMPRÉSTIMOS E INVESTIMENTOS PRIVADOS

Especialistas calculam que o financiamento necessário esteja em torno de US$ 1 trilhão, enquanto os países em desenvolvimento estimam que precisam de US$ 1,3 trilhão. No entanto, as nações ricas ainda não apresentaram uma proposta concreta para esses recursos.

A União Europeia deve finalmente sugerir um valor, que deve ficar entre US$ 200 bilhões e US$ 300 bilhões por ano, de acordo com Linda Kalcher, diretora executiva do think tank Strategic Perspectives. Esse número pode ser até quatro vezes maior que a meta original de US$ 100 bilhões, acrescenta Luca Bergamaschi, cofundador do think tank italiano ECCO.

Yalchin Rafiyev (Crédito: COP29)

Ainda assim, há uma diferença considerável entre os US$ 200 bilhões propostos e os US$ 1,3 trilhão solicitados. Essa lacuna pode ser preenchida com o uso de “alavancagem financeira”. Por exemplo, cada US$ 1 investido em um banco multilateral de desenvolvimento pode gerar até US$ 16 em investimentos adicionais para financiar a transição energética.

Por outro lado, para projetos de adaptação às mudanças climáticas, o retorno é menor, gerando cerca de US$ 6 para cada dólar investido, segundo Avinash Persaud, conselheiro climático do Banco Interamericano de Desenvolvimento.

Mas quando se trata de compensar países pobres já prejudicados pelas mudanças climáticas – como os da região do Caribe, devastada por furacões – a alavancagem financeira não funciona, pois não envolve retorno de investimento. Nesse caso, doações diretas são essenciais, explica Persaud.

Até agora, os países ricos têm relutado em sugerir um valor inicial para as negociações.

Se a maior parte do financiamento climático vier na forma de empréstimos, isso pode agravar a situação de países que já estão endividados. “No fim, tudo isso é apenas uma forma elegante de dizer ‘mais dívidas’”, critica Michai Robertson, negociador de financiamento climático da Aliança dos Pequenos Estados Insulares.

O grupo defende que a maior parte do US$ 1,3 trilhão solicitado seja composta por doações e empréstimos de longo prazo, com juros baixos. Apenas cerca de US$ 400 bilhões deveriam vir de empréstimos alavancados.

“A alavancagem será uma peça crucial da solução”, reconhece Inger Andersen, diretora do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Porém, ela ressalta que doações diretas e alívio de dívidas também serão fundamentais.


SOBRE O AUTOR

Seth Borenstein, Sibi Arasu e Melina Walling são repórteres da Associated Press. saiba mais