O futuro é coisa do passado
Além de anteciparem características do presente, clássicos da ficção científica desenharam cenários que influenciam até hoje como imaginamos o futuro
E se eu dissesse que o futuro não é algo que está por vir, mas algo que já foi escrito? Que aqueles bilionários obcecados por ficção científica são, na verdade, profetas tecnológicos disfarçados?
O que obras como "1984", de George Orwell, e "Admirável Mundo Novo", de Aldous Huxley, têm em comum com os smartphones, as redes sociais e os algoritmos que moldam nossas vidas?
A resposta é simples: além de anteciparem características do nosso presente, esses clássicos da literatura desenharam cenários que influenciam até hoje a forma como imaginamos o futuro.
A ficção científica sempre transcendeu o entretenimento, funcionando como uma lente para identificar tendências e refletir sobre dilemas éticos, sociais e tecnológicos ainda por vir. Ao revisitarmos este passado, percebemos que o futuro, frequentemente, já está inscrito em suas páginas. Basta existir uma ideia boa que sempre teremos alguém tentando transformar aquilo em realidade.
Já dizia Einstein, “a distinção entre passado, presente e futuro é apenas uma ilusão teimosamente persistente”.
Grandes histórias de ficção científica compartilham uma característica comum: servem como verdadeiros “experimentos mentais”. Elas propõem perguntas como “e se...?”.
E se a inteligência artificial assumisse o controle de nossas vidas ("Eu, Robô", de Isaac Asimov)? E se vivêssemos em uma sociedade onde tudo fosse transmitido em tempo real ("O Show de Truman", que remete a ideias exploradas em "Fahrenheit 451", de Ray Bradbury)?
Esses cenários, inicialmente fictícios, frequentemente se convertem em inspirações para inovações tecnológicas reais. Um exemplo clássico é o livro "Neuromancer", de William Gibson. Publicada em 1984, a obra introduziu o conceito de “ciberespaço” e explorou temas como realidade virtual e hacking.
O universo que Gibson nos apresenta tem como exemplo pessoas que conseguem conectar suas mentes ao computador e navegar com seu avatar em um universo composto por bits e bytes, além de conversar e interagir, instantaneamente, com pessoas que estavam fisicamente longe.
Embora à época essas ideias parecessem distantes da realidade, hoje vivemos exatamente nesse universo conectado que Gibson imaginou. E vou além: se quiserem entender realmente tudo que o tal do metaverso é capaz de proporcionar, leiam "Jogador Nº 1", de Ernest Cline.
Além de inspirar conceitos visionários, a ficção científica também previu tecnologias que, inicialmente, pareciam “coisas do futuro”, mas que demoraram anos – ou até décadas – para se integrar ao nosso cotidiano. Alguns exemplos mais notáveis: QR Code, realidade aumentada (RA), realidade virtual (VR), Second Life e o metaverso, videoconferências, entre outros.
A ficção científica não apenas antecipa inovações tecnológicas, mas também examina seus impactos sociais e éticos. Autores como Philip K. Dick alertaram sobre os perigos do controle estatal e da manipulação de informações (como em "Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?", que inspirou o filme "Blade Runner"). Júlio Verne, no século 19, imaginou submarinos e viagens espaciais que só se concretizariam muitas décadas depois.
Para profissionais de marketing, a ficção científica oferece mais do que inspiração criativa. Ela é um estudo valioso sobre a relação entre tecnologia, pessoas e narrativas. Hoje, em um mundo no qual o futuro chega cada vez mais rápido – com IA generativa, realidade aumentada e o metaverso se tornando parte do cotidiano –, a compreensão dessas dinâmicas é essencial.
Quer prever o comportamento do consumidor nos próximos cinco ou 10 anos? Estude como as pessoas reagem às mudanças tecnológicas descritas em histórias fictícias.
Grandes histórias de ficção científica servem como verdadeiros “experimentos mentais”.
Quer criar campanhas mais ousadas? Explore obras como "Snow Crash" ou as reflexões éticas de "Black Mirror", que claramente dialogam com a tradição da ficção científica clássica.
Se quisermos compreender (ou mesmo prever) o que nos aguarda, é necessário revisitar o que já foi imaginado. Ler ficção científica é como viajar no tempo: ela revela os sonhos e temores de gerações passadas e nos permite entender como essas visões moldaram nosso presente. Mais do que isso, ensina que o futuro não é uma inevitabilidade – ele depende das escolhas que fazemos no presente.
Por isso, da próxima vez que pensar em como será o mundo daqui a 10 anos, não busque respostas apenas em relatórios de tendências ou na inteligência artificial. Retorne às obras de Asimov, Bradbury, Gibson e Le Guin. Elas não contêm todas as respostas, mas certamente o ajudarão a formular as perguntas certas.