Não importa o orçamento, nenhuma cidade está preparada para a crise climática

Lidar com emergências é parte fundamental do planejamento urbano, mas é preciso acrescentar resiliência e ações de mitigação de desastres

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Kristin Toussaint 4 minutos de leitura

 Enquanto vários incêndios florestais devastam Los Angeles, causando níveis sem precedentes de destruição, o orçamento da cidade está sendo alvo de escrutínio. Trata-se de um exemplo de desinformação que se espalhou durante a crise – e de um sinal das decisões cada vez mais complexas que as cidades precisarão tomar para enfrentar as realidades das mudanças climáticas.

Diversos artigos criticaram a prefeita de Los Angeles, Karen Bass, por cortar cerca de US$ 23 milhões do orçamento do corpo de bombeiros (enquanto direcionava mais recursos para a polícia), mas essa avaliação não é precisa. Um memorando em novembro destinou ao Departamento de Bombeiros de Los Angeles um adicional de US$ 76 milhões, resultando em um aumento de US$ 53 milhões no orçamento em comparação ao ano anterior.

Especialistas afirmam que essa visão limitada não captura o quadro completo e complexo dos orçamentos municipais ou dos recursos necessários para combater as mudanças climáticas de forma significativa. Governos locais estão enfrentando impactos crescentes das mudanças climáticas e, embora a maioria tenha departamentos de gestão de emergências, é difícil se preparar para algo que nunca aconteceu antes.

Para uma região como Los Angeles, que está próxima de tantas outras cidades, não é apenas o orçamento municipal que está em jogo. As cidades de Malibu e Santa Monica, na região metropolitana, têm seus próprios departamentos de gestão de emergências, bem como acordos de ajuda mútua nos quais municípios vizinhos se comprometem a auxiliar uns aos outros.

As cidades também dependem de auxílio dos governos estadual e federal para enfrentar emergências. Cada vez mais, as cidades estão dependendo do governo federal, diz Carlos Martín, arquiteto e engenheiro que trabalha com habitação e preparação para desastres, porque “os recursos não estão disponíveis localmente e os danos são muito maiores do que qualquer um poderia prever.”

ALÉM DA QUESTÃO DO ORÇAMENTO

Apenas comparar os totais de orçamento não mostra toda a dimensão do que uma cidade está investindo. “Simplesmente cortar ou aumentar um orçamento não significa que isso terá o [impacto correto],” diz Jason Grant, diretor da International City/ County Management Agency (ICMA), uma associação com mais de 13 mil funcionários de governos locais dos EUA.

Se a verba de um departamento de bombeiros foi reduzida, impossibilitando o aumento de capacidade ou a compra de equipamentos necessários, isso é uma coisa. Mas, se o orçamento aumentou porque todos receberam aumento salarial, sem que nenhum funcionário a mais tenha sido contratado, isso faria diferença na resposta a uma emergência? Segundo Grant, a prioridade deve ser entender o que está sendo financiado e como isso ajudará a lidar com os problemas enfrentados.

O Departamento de Bombeiros de Los Angeles (LAFD) realmente precisa de mais financiamento, mas é difícil determinar o quanto alterar o orçamento de 2024-25 teria ajudado em uma situação tão devastadora quanto essa, em que uma série de eventos climáticos se combinaram para criar as condições perfeitas para o desastre. “Nossa infraestrutura não está preparada para isso,” diz Martín.

Mesmo que o orçamento fosse maior, isso não significaria necessariamente que Los Angeles – ou qualquer outra cidade – estaria preparada para o próximo desastre. E alocar recursos para resposta emergencial trata apenas de um aspecto do problema.

Crédito: Ethan Swope/ AP

As cidades também precisam investir mais dinheiro em adaptação e mitigação climática. Estudos mostram que cada US$ 1 investido em mitigação de desastres economiza até US$ 13 em perdas decorrentes de desastres.

“É como tomar um remédio para prevenir a doença versus tratar a doença depois que ela aparece,” diz Martín. “É assim que devemos começar a pensar sobre esses eventos: o que antes considerávamos crises isoladas [agora] são questões crônicas.”

É um equilíbrio difícil, especialmente para cidades com orçamentos limitados, e envolve um processo de aprendizado. Os investimentos em clima podem envolver tentativa e erro e exigem um pensamento de longo prazo que vai além do enquadramento de um orçamento anual.

As cidades dependem cada vez mais de auxílio dos governos estadual e federal para enfrentar emergências.

As cidades podem investir em energia renovável e trocar suas frotas de ônibus por veículos elétricos como parte dos esforços de mitigação, mas é provável que isso não impeça um desastre natural de ocorrer no ano seguinte. O impacto climático dessas mudanças (e o financiamento necessário para elas) não é imediato.

As cidades precisam equilibrar todas essas questões: como se preparar, como mitigar, como garantir que possam responder quando algo acontecer e como priorizar necessidades. Esses pontos são mais importantes do que “analisar itens orçamentários em retrospectiva enquanto bairros inteiros estão em chamas”, diz Grant.

À medida que Los Angeles começa a se recuperar e reconstruir, os incêndios devem se tornar um marco a partir do qual outras cidades poderão aprender. Essas lições podem influenciar não apenas os orçamentos futuros do corpo de bombeiros, mas também esforços de mitigação, códigos de construção, leis habitacionais, políticas de seguro, entre outros fatores.

É esse cenário complexo de adaptação, mitigação, resposta e recuperação que os gestores municipais precisam aprender a equilibrar. “A última coisa que quero ver é pessoas investindo tanto em gestão de emergências e em socorristas sem pensar no planejamento de longo prazo e nas questões de equidade,” conclui Martín.


SOBRE A AUTORA

Kristin Toussaint é editora assistente da editoria de Impacto da Fast Company. saiba mais