Sustentabilidade: entenda quais os temas que vão dominar o ano

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Paula Pacheco 10 minutos de leitura

O ano de 2025 começou com o tema da sustentabilidade sob um clima que combina pressão e expectativa. Por um lado, há a construção de diálogos para que sejam anunciadas decisões concretas sobre financiamento da descarbonização da economia de países pobres durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), em Belém, entre 10 e 21 de novembro.

Por outro lado, o que se vê é o enfraquecimento da pauta ESG não apenas entre grandes corporações, mas também do lado governamental. O caso de maior destaque é o dos Estados Unidos, maior economia do mundo.

Conforme prometido durante a campanha presidencial, o presidente republicano Donald Trump assinou na segunda-feira (20), dia da posse, a saída do país da lista de signatários do Acordo de Paris.

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O tratado internacional, adotado em 2015, aborda as mudanças climáticas e fala da mitigação, adaptação e financiamento desses impactos, além do compromisso de seus signatários de manter o aquecimento global do planeta bem abaixo de 2°C até o final do século e a necessidade de avanço nos esforços para limitar o aumento da temperatura em até 1,5°C.

O QUE DIZEM OS ESPECIALISTAS

Entre os cinco especialistas em ESG e sustentabilidade ouvidos pela FastCo Money, prevalece um otimismo em relação à COP na capital paraense - um dos grandes temas de 2025.

Presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), Marina Grossi acredita que 2025 promete ser um grande ano para o país. "Será a primeira COP realizada na Amazônia e a expectativa é que seja um grande evento, com forte apelo social e em prol da natureza. Isso porque somos um país extremamente rico em biodiversidade, com um importante papel no combate ao aumento da temperatura do planeta, apesar da grande desigualdade social", aponta.

Ainda segundo Marina, há a expectativa de que a COP30 ajude a mostrar ao mundo que "é crucial conectarmos as agendas de clima, natureza e sociedade". Entre temas prioritários para o setor empresarial, representado pelo CEBDS, estão a descarbonização, bioeconomia e agricultura regenerativa

Marina acredita que o ano facilitará as discussões sobre outras pautas importantes, como a atenção maior aos povos indígenas e quilombolas e o avanço da pauta do financiamento para o clima. "Está cada vez mais claro que não basta estabelecer metas e colocar a sustentabilidade no discurso, é preciso partir para a ação."

Ainda segundo a presidente do CEBDS, na COP29, houve um progresso quanto ao financiamento, mas ele foi insuficiente. É necessário, segundo Marina. aumentar a contribuição financeira dos países desenvolvidos para aqueles em desenvolvimento, e assim fazer a agenda do desenvolvimento sustentável avançar na velocidade necessária.

A especialista defende ainda o que ela chama de mecanismos financeiros inovadores, como o blended finance - ou financiamento misto, como é conhecido o investimento que une recursos públicos, de fomento ou filantrópicos a capital privado com objetivo de financiar projetos de impacto positivo social, ambiental ou de desenvolvimento econômico - para ajudar a alavancar soluções sustentáveis.

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PAÍSES PRECISAM AMPLIAR O DIÁLOGO

Para que o mundo avance na ambição climática e na implementação, segundo Marina, é crucial que países ricos e em desenvolvimento ampliem o diálogo. "Também será preciso ter esforços conjuntos do poder público, setor empresarial, mercado financeiro e sociedade civil, para construir um verdadeiro legado da COP30. Eu diria que o foco de 2025 deve estar voltado para duas palavras: implementação e legado."

A sustentabilidade em 2025, para o sócio líder de sustentabilidade e CSO LATAM da EY, Ricardo Assumpção, vai exigir uma combinação entre os avanços tecnológicos, a alteração nas políticas públicas e governamentais e, ao mesmo tempo, uma crescente conscientização sobre como a preservação do meio ambiente vai influenciar a vida das pessoas. Paralelamente, o mundo estará em alerta sobre a possibilidade deste ser o ano mais quente da história, como visto em 2024.

"A gente passa a entender que não dá para trazer tudo para a sustentabilidade, mas sim que a gente deve levar a sustentabilidade para tudo", sintetiza o executivo da EY

10 TEMAS URGENTES PARA FICAR DE OLHO

Assumpção relaciona os 10 temas que devem ganhar força ano longo do ano. Com um olhar holístico, o especialista passa pela economia circular, energia renovável, agricultura sustentável, política, investimentos e educação. Confira quais são os destaques:

1) Economia Circular - mais discussões sobre reutilização, reciclagem e a relação direta com a vida das pessoas.

2) Energia renovável: expectativa de ampliação do termo e do conceito da energia renovável, impulsionada por novas inovações tecnológicas e políticas de incentivo.

3) Transporte sustentável - consolidação dos veículos elétricos e híbridos, mais infraestrutura para bicicletas e outros meios de transporte pouco poluentes.

4) Agricultura sustentável: atividade com grande demanda por água deve passar por uma fase em que o uso do recurso natural será repensado.

5) Construção verde: crescimento do uso de materiais ecológicos e de tecnologias de eficiência energética nos projetos.

6) Tecnologia e inovação: seu uso, por exemplo, por meio da Internet das Coisas, deve avançar para permitir o monitoramento e gerenciamento do uso de recursos naturais.

7) Consumo consciente: atrelado à decisão das pessoas e oportunidade identificada nos negócios.

8) Políticas e regulações: ganham um fôlego maior, por exemplo, com o ISSB (sigla em inglês para o Conselho Internacional de Padrões de Sustentabilidade, que trata das normas de divulgação de relatórios financeiros com informações sobre sustentabilidade, sob os aspectos ESG e mudanças climáticas).

9) Investimento sustentável: as regras passaram a ser melhor entendidas, com as taxonomias muito mais claras.

10) Educação e conscientização: são pontos que unem trabalho, finanças e agenda de pessoas e empresas. Mas já é possível ver cada vez mais a integração da agenda da sustentabilidade aos currículos escolares, campanhas mais amplas de conscientização e cursos universitários que não tratam do tema isoladamente, mas com impacto em outros cursos, como engenharia e economia.

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PRESSÃO DE TODOS OS LADOS

A transição econômica de baixo carbono tem condições de ser o principal tema da COP30, analisa Renato Paquet, CEO e fundador da Polen, ecólogo formado pela UFRJ com ênfase em ecologia industrial, além de diretor-presidente de cleantechs da ABStartups.

O empreendedor pondera que há uma série de condições que podem alimentar os debates em torno de uma economia mais limpa. Brasil e Mercosul têm se aproximado cada vez mais da China, que historicamente não é signatária dos acordos internacionais para o clima, assim como os Estados Unidos no governo Trump 1 e agora no segundo mandato.

Na outra ponta, diz Paquet, o Brasil enfrenta pressões no G20, na União Europeia e, principalmente, da França, que prega a taxação de carbono e ameaça não adquirir produtos de biomas como o Cerrado, Amazônia e Pantanal, que concentram entre 70% e 80% da produção agropecuária brasileira.

"Essa balança de poder entre a sustentabilidade brasileira, que avança cada vez mais com resíduos, com carbono, tudo sendo regulamentado, e a dependência do nosso agro dos mercados europeu, americano e chinês, fazem com que eles tenham cada vez mais pressão sobre nós. Por isso, talvez o principal tema da COP sejam os acordos comerciais entre os países e as barreiras de carbono para cada um deles", analisa o fundador da Polen. 

Paquet também tem expectativas quanto ao avanço no mercado de carbono, recentemente regulado no Brasil. Empresas que emitem mais de 10 mil toneladas de carbono por ano passam a ser obrigadas a neutralizar suas emissões, o que, segundo o empreendedor, representa um avanço significativo na agenda de sustentabilidade.

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Velma Gregório, fundadora e CEO da consultoria ÓGUI, mira uma série de temas relacionados à sustentabilidade para ficarem no radar neste ano, como o papel do setor privado, das finanças, das energias renováveis, da regulação, da transparência de dados, da proteção dos direitos humanos e da diversidade. Confira abaixo mais detalhes:

1) Setor privado - medição e gerenciamento dos impactos financeiros das mudanças climáticas de olho no resultado nas empresas. A formalização destrava o capital do setor privado e mercado financeiro. O Brasil, nesse contexto, é importante por ser apontado como solução para as mudanças climáticas.

2) Energias renováveis - com a questão da biodiversidade e solucoes baseadas na natureza, também existe aí uma oportunidade para o Brasil quanto ao financiamento de projetos. Mas existe o risco da transição - por exemplo, como escolher a melhor tecnologia, como diminuir a dependência do petróleo, a possibilidade impacto caso haja um aumento de preço da energia e do crédito de carbono. Já a oportunidade está em escalar soluções e captar recursos disponíveis.

3) Aumento da regulação nacional e internacional - hoje há algumas litigâncias internacionais envolvendo questões climáticas, por vezes sem parâmetro legal para a tomada de decisão, que levam ao crescimento de leis nacionais e internacionais para equilibrar o mercado. Há o risco de demora para a preparação das novas regras e no acesso ao capital no curto prazo por conta da adaptação.

4) Aumento das exigências de reporting - dar transparência a dados confiáveis, baseados na ciência, principalmente para os investidores entenderem o risco que vão tomar e ter comparabilidade global.

5) Conhecimento e divulgação da sua materialidade financeira - entender o impacto que a empresa gera e as consequências financeiras. A materialidade se torna uma ferramenta de gestão e traz uma visão de curto, médio e longo prazo. O maior risco sobre os impactos materiais é não confiar que sejam reais e a vantagem aparecerá no desenho de planejamento para adaptação e regeneração.

6) Medir e gerenciar os temas da biodiversidade - o Brasil é protagonista em soluções baseadas na natureza. Já vemos o nascimento do mercado de créditos de biodiversidade. A bioeconomia como solução de desenvolvimento sustentável para regiões, com a preservação na natureza, caminha ao lado uma tendência forte de economia circular com vistas à preservação da biodiversidade.

7) Proteção dos direitos humanos - o tem deve fazer parte do escopo do setor privado. Não existe crédito de carbono sem pensar na sua integridade, ou seja, se ele está beneficiando a população do entorno onde ele está sendo gerado. Há ainda aspectos sobre condições de trabalho, segurança, que vêm sendo muito questionados.

8) Uso da diversidade e da inclusão como ferramenta de gestão - tendência baseada em dados, não mais em comunicação, por meio de censos, com autonomia na gestão de pessoa. É uma oportunidade de atração de jovens talentos e de redução de rotatividade no quadro de funcionários.

"Todas essas megatendências têm potencial de impactar negativamente as finançaas do setor privado, mas se forem bem planejadas, olhando como forma de gestão permanente e integração da questão de sustentabilidade, pode trazer melhorias no curto, médio e longo prazo", pondera Velma.

ADAPTAÇÃO ÀS MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO CENTRO

Onara Lima, consultora especialista em ESG, concorda que o Brasil poder ter um papel importante na pauta da sustentabilidade como sede da COP30. No entanto, ela admite que há dúvidas sobre como país vai se sair na missão.

São muitas frentes de trabalho, como a taxonomia sustentável (em consulta pública), o desafio de traduzir dados de sustentabilidade para uma linguagem financeira por conta do ISSB, compromissos assumidos pelo G20 (do qual o Brasil faz parte) e a necessidade de dar escala a essas frentes de discussão junto ao mundo corporativo.

Nesse ambiente, lembra Onara, não dá para deixar de fora os desafios da inteligência artificial - do ponto de vista energético, com o aumento do consumo, mas também as possibilidades de uma maior confiabilidade e rastreabilidade dos dados atrelados a aspectos socioambientais que serão reportados pelas companhias.

"Em meio a tantas discussões, triviais ou não, não podemos deixar de olhar sempre sob o aspecto climático, com um olhar para essa transição, para uma resiliência climática. Não há dúvida de que a necessidade de adaptação às mudanças climáticas será continuará como grande tema neste ano", observa a consultora em ESG.


SOBRE A AUTORA

Paula Pacheco é jornalista old school, mas com um pé nos novos temas que afetam, além do bolso, a sociedade, como a saúde do planeta. saiba mais