No Havaí, sobras de pranchas de surfe são usadas para construir casas
A Hawaii Off Grid usa sobras de espuma para fazer blocos de construção, uma solução mais resistente e mais eficiente em termos de energia

Na costa norte da ilha de Maui, no Havaí, em um prédio que já funcionou como uma fábrica de enlatar abacaxis, fica o escritório de uma empresa de arquitetura – bem ao lado de uma fábrica de pranchas de surfe. Quando os arquitetos se mudaram para lá, se deram conta de algo curioso: a cada poucos dias, os contêineres nos fundos se enchiam de pedaços de espuma das pranchas.
David Sellers, um dos arquitetos, percebeu que essa espuma toda poderia ser usada como material de construção – blocos isolantes que normalmente são feitos de uma mistura de concreto e espuma de poliestireno nova.
“Eu pensei: ‘a gente não devia estar jogando isso fora’”, conta Sellers, arquiteto principal da Hawaii Off Grid. “Vivemos em uma ilha, com espaço limitado. Como, então, seria possível usar esse material para fazer casas?"
Em 2023, a equipe recebeu uma pequena verba para desenvolver a ideia de reciclar a espuma das pranchas que era descartada em novos blocos. Aí veio o incêndio de Lahaina, na ilha de Maui, que destruiu mais de dual mil moradias (em 8 de agosto de 2023).
O pequeno escritório de arquitetura pausou o projeto e focou, a princípio, em ajudar a reconstruir casas. “Mas também sabíamos que íamos precisar de muitos materiais de construção”, diz Sellers.
“Precisávamos de materiais de construção resistentes ao fogo. Os blocos que inventamos têm algumas vantagens. Além de resistir ao fogo, em caso de furacões eles são quatro vezes mais fortes que uma parede de madeira padrão", explica.
Os blocos também são imunes a mofo, bolor e cupins, problemas comuns no Havaí. Suas propriedades de isolamento são o dobro do exigido pelo código de edificações local.

Além disso, o fato de serem eficientes em termos de consumo de energia é especialmente importante para a Hawaii Off Grid, que foca na pegada de carbono de cada um de seus projetos. Aliás, a empresa exige que todos os seus clientes se comprometam com edificações de emissão líquida zero.
Os blocos precisam de apenas cerca de um terço do cimento usado em blocos de concreto, sendo também uma alternativa acessível à madeira. “A madeira atingiu o preço mais alto de todos os tempos novamente, e a disponibilidade de materiais de construção anda escassa”, diz Sellers.
Os blocos são imunes a mofo, bolor e cupins, problemas comuns no Havaí
Para fazer os blocos, a empresa usa uma grande máquina para triturar a espuma das pranchas em pequenas bolinhas, que são misturadas com cimento Portland.
Elas criam uma consistência que Sellers compara a uma barrinha de grãos de arroz, pressionadas juntas em moldes de madeira. Os blocos de 30 cm de altura e 1,5 metro de comprimento são mais rápidos de empilhar durante a construção.
A empresa de design e construção acaba de concluir sua primeira casa usando os blocos feitos a partir da espuma das pranchas que seria desperdiçada, na zona que sofreu o incêndio em Lahaina. Outras estão a caminho.

Embora o incêndio tenha ocorrido há mais de 20 meses, o processo de reconstrução está apenas começando, atrasado pela necessidade de descontaminar as propriedades e pela burocracia. Agora, à medida que a construção começa a aumentar, a demanda por materiais também vai crescer.
Com o volume de resíduos de espuma produzido apenas pelo vizinho, a empresa calculou que teria o suficiente para construir de 10 a 20 casas por ano, muito mais do que precisa atualmente como uma pequena empresa.
Sellers também conversou com empresas como a Lowe’s sobre a reciclagem de embalagens de espuma após entregas de eletrodomésticos. Em teoria, pranchas de surfe antigas também poderiam ser recicladas, embora os surfistas costumem guardá-las e exibi-las, em vez de jogá-las fora.

Essa ideia poderia ser replicada por outros construtores, diz Sellers. Mas ele espera que a espuma de poliestireno um dia seja completamente eliminada – momento em que eles deixariam de usar os blocos como material de construção. “Espero que, no futuro, a gente não use mais soluções à base de petróleo”, diz ele.
As fabricantes de pranchas de surfe já estão experimentando outros tipos de materiais e outras empresas estão tentando encontrar alternativas para embalagens de espuma ou isopor. Por enquanto, os arquitetos planejam continuar reciclando o máximo de espuma das pranchas possível para mantê-la fora do aterro sanitário e da natureza.