Governo dos EUA pressiona para desmembrar o império do Google. Entenda o caso

Da Standard Oil à Microsoft, processos antitruste remodelaram indústria inteiras. O do Google pode ser o próximo

Crédito: Freepik

Michael Liedtke e Chris Morris 4 minutos de leitura

O Google está prestes a encarar uma ameaça existencial, à medida que o governo dos Estados Unidos busca desmembrar a gigante da tecnologia como punição por transformar seu motor de busca revolucionário em um monopólio implacável. Está em curso a discussão da sentença do julgamento do Google por práticas contra a livre concorrência.

O embate decisivo se estende pelas próximas três semanas, em um tribunal de Washington, onde audiências vão definir as penalidades que a empresa enfrentará por operar um monopólio ilegal no setor de buscas online.

O Departamento de Justiça dos EUA (DoJ) quer que o poder judiciário determine uma reestruturação radical, proibindo o Google de firmar acordos bilionários com a Apple e outras empresas de tecnologia – contratos que, segundo o governo, blindam o buscador da concorrência. Entre as exigências estão o compartilhamento de dados com rivais e até a possível venda do navegador Chrome.

O momento de acerto de contas chega quatro anos e meio após o DoJ ter movido um processo histórico, acusando o Google de abusar de seu domínio como porta de entrada para a internet, sufocando a concorrência e a inovação por mais de uma década.

Depois que o caso foi a julgamento em 2023, um juiz federal decidiu no ano passado que o Google realmente firmou acordos anticompetitivos para manter seu buscador como opção padrão em iPhones, PCs e dispositivos Android.

Embora as sanções tenham sido propostas durante o governo de Joe Biden, elas continuam sendo defendidas pelo DoJ sob a administração de Donald Trump, que foi, inclusive, responsável por iniciar o processo. Agora, além das acusações de caráter econômico, o governo também tenta enquadrar o poder do Google como uma ameaça à liberdade.

O Google, por sua vez, argumenta que as mudanças propostas são exageradas e desnecessárias, já que sua popularidade entre os consumidores é o principal motivo de seu domínio de mercado.

“As medidas sem precedentes propostas pelo governo prejudicariam consumidores e a inovação, além de comprometer a concorrência no setor de buscas, anúncios e diversos outros mercados correlatos”, afirmaram os advogados da empresa em documento entregue antes das audiências. “Elas têm pouca ou nenhuma relação com as condutas consideradas anticompetitivas e vão contra a legislação.”

PRECEDENTES HISTÓRICOS

O julgamento promete ser o clímax do maior caso antitruste nos EUA desde o processo movido contra a Microsoft no fim dos anos 1990, quando o governo dos EUA acusou a empresa de usar o sistema Windows para derrotar rivais.

Casos assim não são inéditos, mas não se via uma tentativa de desmembramento em larga escala de uma empresa tão conhecida há mais de 25 anos. E o histórico mostra que os resultados desses embates variam bastante.

MICROSOFT

Em 2000, a Microsoft quase teve que separar o Windows

do Office, depois de ser considerada culpada de sufocar a concorrência no mercado de PCs. A decisão foi revertida em instância superior, mas as restrições impostas abriram espaço para concorrentes como o próprio Google. Com os navegadores ganhando protagonismo, isso se mostrou decisivo.

AT&T

Depois de várias tentativas desde 1913, o governo finalmente

conseguiu em 1984 dividir a gigante das telecomunicações em várias empresas regionais – as chamadas "Baby Bells". A concorrência aumentou, os preços caíram e parte dessas empresas se fundiram novamente, como no caso da Verizon, que hoje rivaliza com a própria AT&T.

STANDARD OIL

Em 1911, o império petrolífero de John D. Rockefeller foi

dividido em 34 empresas, incluindo ExxonMobil, Chevron e BP. A divisão transformou o setor e deu origem ao "princípio da razoabilidade" (que assegura a coerência entre a aplicação e a finalidade do direito, garantindo a sua utilização justa), usado até hoje em processos antitruste.

IBM

Pressionada por um processo antitruste em 1969, a IBM

decidiu, por conta própria, separar seus negócios de hardware e software, evitando uma condenação formal. A medida favoreceu a concorrência e contribuiu para o surgimento do computador pessoal.

AMERICAN TOBACCO

Também dividida em 1911, a American Tobacco deu origem

a empresas como R.J. Reynolds e Liggett & Myers. Mas, diferentemente de outros casos, a separação pouco afetou o mercado: a concorrência não aumentou e a indústria seguiu dominada por poucos grandes players, com o consumo impulsionado por pesadas campanhas publicitárias.

Agora, todos os olhos se voltam ao Google e ao que o desfecho desse julgamento poderá significar para o futuro das gigantes da tecnologia.


SOBRE O AUTOR

Michael Liedtke é repórter de negócios e tecnologia da Associated Press. Chris Morris é jornalista, escritor, editor e apresentador es... saiba mais