Nos EUA, empresas de cannabis investem no produto “comestível”
Marcas encontram uma alternativa lucrativa: vender diretamente ao consumidor produtos derivados de cannabis com doses mais baixas de THC

Em 2017, Nathan Cozzolino fundou a Rose, uma marca de Los Angeles que segue o conceito “da fazenda ao prato”. Ele e sua equipe cultivavam cânhamo e maconha orgânicos, produziam balas de goma com doses baixas de THC e ingredientes naturais e vendiam os produtos em dispensários licenciados (a venda é regulamentada em vários estados dos EUA).
Mas o modelo tinha um custo fixo alto, que ultrapassava US$ 80 mil por mês. Seis anos depois, mesmo presente em mais de 100 pontos de venda, a marca ainda não vendia o suficiente para cobrir os gastos.
Tudo mudou em julho de 2023, quando a Rose decidiu focar exclusivamente na produção de cânhamo. “Era isso ou fechar as portas”, conta Cozzolino. Ele abriu mão das licenças de cannabis, reduziu a operação e, em apenas 60 dias, colocou no ar um site para vender diretamente aos clientes.
No primeiro mês, a marca já havia conseguido equilibrar as contas. Hoje, a procura é maior do que a capacidade de produção e a equipe pode se dedicar ao que mais gosta: cultivar, desenvolver receitas e compartilhar os benefícios terapêuticos da cannabis.
A Rose faz parte de um movimento crescente no setor: a aposta em comestíveis à base de cânhamo, que oferecem efeitos similares aos do THC tradicional, mas com dosagens mais baixas.
Com a demanda aquecida por produtos de baixa dosagem, consumidores norte-americanos estão descobrindo uma nova conveniência: balas de goma, chocolates, balas refrescantes e bebidas com THC que podem ser comprados online e entregues legalmente em casa, sem a necessidade de ir até um dispensário.

O mercado de cannabis recreativa vem passando por mudanças nos últimos anos. Embora flores e vaporizadores ainda liderem as vendas, os comestíveis estão ganhando cada vez mais espaço – especialmente nos Estados Unidos.
Só em 2024, o setor movimentou US$ 10,6 bilhões e a expectativa é que esse número salte para US$ 47,1 bilhões até 2043, segundo um relatório da Research and Markets. Dentro desse universo, cresce o número de marcas que estão apostando no THC derivado do cânhamo – que é quimicamente idêntico ao extraído da maconha.
“A popularização dos comestíveis à base de cânhamo tem acelerado a normalização da cannabis”, afirma John Kagia, diretor de políticas de cannabis do estado de Nova York e analista da área.

Existem bons motivos para isso: os comestíveis de baixa dosagem fazem sucesso entre os consumidores. Uma lei de 2018, que retirou o cânhamo com até 0,3% de THC da lista de substâncias controladas nos EUA, abriu caminho para que as marcas atendessem essa nova demanda.
A expectativa é que usuários curiosos experimentem balas e bebidas e acabem se tornando consumidores frequentes.
O FUTURO DOS COMESTÍVEIS À BASE DE CÂNHAMO
Para quem já atua no setor, a popularização dos comestíveis parece um passo natural no avanço do consumo recreativo e medicinal da cannabis. “Eles são muito acessíveis”, diz Verena von Pfetten, cofundadora da plataforma de mídia Gossamer, ao lado de David Weiner. “Você não precisa aprender a enrolar um baseado nem comprar nenhum acessório.”
Além disso, as doses indicadas nas embalagens facilitam o controle de quanto THC está sendo consumido. Nada daqueles brownies que te derrubam por horas. As balas de goma representam 72% do mercado de comestíveis. Um suplemento em formato de goma é algo com que as pessoas já estão familiarizadas”, acrescenta Pfetten.
A loja online da Gossamer, que começou a vender comestíveis à base de cânhamo em 2024, oferece desde tinturas e balas até pré-enrolados. Os campeões de venda são os produtos com um ou dois miligramas.

Várias das marcas mais populares do setor já migraram para o THC derivado do cânhamo em suas linhas de produtos de baixa dosagem. Entre elas estão a Wyld; a Kiva (com um portfólio que inclui chocolates, gomas e balas de menta); a Sundae School (marca de mastigáveis); e a Cann, focada em bebidas.
Pfetten compara o conhecimento do público sobre a indústria da cannabis e seus produtos ao que existia sobre cuidados com a pele nos anos 1960. “Se naquela época você falasse com as mulheres sobre retinol, ácido salicílico e ácido hialurônico, a maioria não faria ideia do que se tratava”, ela comenta.
“Estamos só começando a chegar nesse ponto com a cannabis. Todo mundo sabe que ‘maconha dá barato’, mas, quando usamos termos como CBD, CBG, terpenos e THCV, ainda há muita coisa para explicar. Para que os consumidores compreendam os reais benefícios dos produtos, é preciso investir em informação – e boa parte disso está acontecendo online.”