Cadê o dinheiro? Saiba encontrar e contestar descontos, como o do INSS

Aprenda a passar um pente-fino nas contas e a identificar descontos não autorizados na aposentadoria, no holerite ou a assinatura recorrente que passa despercebida

Calculadora com lupa mostrando investimentos e o estado de atenção
Deagreez via Getty Images

Márcia Rodrigues 7 minutos de leitura

Você acompanha de perto todos os débitos que saem da sua conta, salário ou benefício? Se a resposta for “não”, é bem possível que esteja perdendo dinheiro sem saber. Descontos não autorizados, como os que recentemente afetaram aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), devem servir de alerta. É preciso olhar com mais atenção para o nosso próprio extrato. E isso vale para todos.

LEIA (MESMO) OS CONTRATOS

Muitos desses débitos se escondem em documentos que a maioria das pessoas assina sem ler na íntegra, segundo Luciana Ikedo, planejadora financeira e autora do livro Vida Financeira - Descomplicando, economizando e investindo.

“Extratos bancários, faturas, holerites e até contas de consumo podem trazer cobranças que não fazem sentido, como assinaturas renovadas automaticamente ou contribuições sindicais não autorizadas”, explica.

A seguir, veja como identificar essas cobranças, entender seus direitos e agir para recuperar o que é seu.

ONDE OS DESCONTOS SE ESCONDEM?

O primeiro passo para descobrir se há algum valor indevido saindo do seu bolso é revisar regularmente, de acordo com Luciana, os seguintes documentos:

  • Extratos bancários e do cartão de crédito;
  • Faturas de contas como luz, telefone e internet;
  • Demonstrativo de pagamentos do INSS;
  • Holerite; e
  • Contratos e cláusulas que autorizem débitos automáticos.

A varredura deve ser feita pelo menos uma vez por mês, segundo a especialista. “Separe uma hora mensal para fazer essa faxina financeira. Passe um pente-fino em tudo o que foi cobrado no período e compare com seus registros”, orienta Luciana.

SINAIS DE QUE ALGO ESTÁ ERRADO

Como saber se você está pagando por algo indevido? A planejadora financeira alerta para alguns sinais comuns:

  • Tentativas de pagamento recusadas por saldo insuficiente;
  • Mensagens ou e-mails informando renovação de serviços;
  • Juros e taxas inesperadas na fatura;
  • Diferença entre o valor bruto e o líquido recebido no banco;

Esses sintomas indicam que é hora de investigar, segundo a especialista.

Você não precisa fazer tudo sozinho. Luciana recomenda usar recursos como alertas de transações em tempo real no banco ou cartão de crédito. Eles ajudam a identificar cobranças quando ocorrem e agir rapidamente.

E OS APOSENTADOS E PENSIONISTAS?

No caso de beneficiários do INSS, o histórico de consignações e o extrato de pagamento são essenciais. “Avalie cada linha de desconto, confira se o valor líquido bate com o que foi depositado e questione qualquer cobrança desconhecida”, orienta Luciana.

A planejadora financeira ressalta que até sindicatos e associações conseguem incluir descontos sem consentimento claro, com aval do próprio INSS, o que torna o acompanhamento ainda mais importante.

CLÁUSULAS ESCONDIDAS E SERVIÇOS ESQUECIDOS

Há sim contratos com cláusulas que autorizam cobranças automaticamente, pontua Luciana. Embora a prática seja legal, isso não significa que o consumidor deve aceitar sem questionar. “Por isso, é fundamental ler tudo com atenção antes de assinar e manter controle sobre o que foi contratado”, diz.

Inclusive, hoje, muitas autorizações são feitas por meios digitais, como e-mail, link, biometria ou senha. “Mesmo eletronicamente, é preciso ter atenção redobrada”, alerta a planejadora financeira.

ME COBROU SEM EU SABER. E AGORA?

Do ponto de vista legal, qualquer cobrança feita sem autorização clara do consumidor é ilegal, explica o advogado Alexandre Berthe, especialista em direito do consumidor. Isso vale para contas, cartões, benefícios do INSS ou contracheques.

Se o desconto foi feito sem o seu consentimento, você tem o direito de:

- Solicitar a suspensão imediata;

- Pedir reembolso (em dobro, se houver má-fé);

- Requerer indenização por danos morais em alguns casos; e

- Exigir todas as informações sobre o débito (data, origem, valor).

QUEM É O RESPONSÁVEL PELA COBRANÇA?

Berthe esclarece que a responsabilidade depende da situação:

- Empresa credora: quando é ela quem iniciou a cobrança sem consentimento;

- Banco ou instituição financeira: se permitiu a cobrança sem validar a autorização;

- INSS: em casos de descontos em benefícios feitos sem consentimento legítimo; e

- Responsabilidade solidária: quando banco e empresa compartilham a culpa.

Por isso, entender como o desconto foi cadastrado é fundamental para saber quem deve responder pelo problema.

ONDE RECLAMAR E COMO RECUPERAR O DINHEIRO

Você pode registrar uma reclamação formal por diversos canais. A maioria funciona muito bem, segundo o advogado:

- SAC da empresa ou banco;

- Meu INSS (site ou app), Central 135, Ouvidoria;

- Banco Central;

- Procon (presencial ou online); e

- Consumidor.gov.br.

Após a notificação, o prazo médio de resposta é de até 15 dias. Se não houver resolução, é possível ir à Justiça. Para causas de até 20 salários-mínimos, não é necessário advogado no Juizado Especial Cível.

E O INSS?

Você teve desconto sem autorização na aposentadoria ou pensão do INSS? Conhece alguém que descobriu alguma fraude. Estes são os caminhos para interromper a fraude:

- Pelo aplicativo Meu INSS (disponível para Android iOS)

- Pelo site do INSS

- Pela Central 135

- A partir de 30 de maio, pelas agências dos Correios

O governo anunciou nesta segunda-feira (26) que, a partir da sexta-feira, dia 30, aposentados e pensionistas do INSS poderão ir a uma das 4.730 agências dos Correios do país para checar se houve algum desconto associativo não autorizado nos benefícios.

O atendimento em uma agência dos Correios é uma alternativa para quem tem alguma dificuldade com internet ou telefone. Ou ainda, segundo o governo, sente mais confiança em tirar dúvidas no atendimento presencial. Quem já fez a consulta sobre os descontos irregulares nos outros canais não precisa ir até a agência.

ATENDIMENTO PRESENCIAL

Quem optar pelo atendimento presencial deve levar um documento de identificação oficial. Não é preciso apresentar o extrato, contracheque ou comprovante de inscrição.

De acordo com nota divulgada pelo governo, o atendimento presencial será realizado por meio do acesso a uma plataforma eletrônica específica, independente da base de dados dos benefícios previdenciários.

Nas agências habilitadas, os aposentados e pensionistas poderão:

- Consultar se foi feito algum desconto não autorizado no benefício

- Requerer a contestação de descontos não autorizados

- Reconhecer a autorização de algum desconto

- Consultar sobre resultado da contestação (15 dias úteis após a entrada)

- Analisar e contestar a documentação apresentada pela associação

- Imprimir o protocolo, com orientações para acesso pelo 135 e Meu INSS

DE OLHO NOS GOLPES

Um dos alertas que o governo tem feito nas últimas semanas é quanto aos golpistas que têm abordado aposentados e pensionistas. O INSS não envia mensagens pelo WhatsApp e não envia funcionários à residência dos beneficiários.

Todos os aposentados e pensionistas do INSS que sofreram algum desconto de mensalidade associativa na folha de pagamentos referente a abril, de acordo com o governo, começaram a ter os valores devolvidos na segunda-feira (26). Ao todo, serão reembolsados, ao todo, R$ 292 milhões aos beneficiários.

Segundo o INSS, os descontos desse tipo foram suspensos. No entanto, como a folha de pagamentos referente a abril já estava fechada, os descontos ainda foram realizados nos pagamentos feitos entre 24 de abril e 8 de maio. O órgão reteve esses valores e não repassou o montante às entidades associativas. Agora, a devolução será feita com o pagamento regular dos benefícios, de 26 de maio a 6 de junho. Para isso, o beneficiário não precisa tomar nenhuma providência.

E OS DESCONTOS DE ANTES DE ABRIL?

No caso da devolução das mensalidades associativas antigas, o aposentado ou pensionista deverá informar ao INSS se não reconhecer que tenha autorizado o débito em folha. O pedido deve ser feito pelo Meu INSS (aplicativo ou site) ou pelo telefone 135. Não é necessário o envio de documentos ou oferecer qualquer informação, apenas dizer se autorizou ou não os descontos.

O INSS divulgou que vai acionar a entidade para que comprove a autorização. Caso não haja comprovação, ela terá de devolver os recursos ao Instituto, que depois fará o repasse ao beneficiário. O ressarcimentos será feita pelo INSS, pelo mesmo meio que faz os pagamentos regulares – conta bancária ou cartão magnético.

Até o último sábado (24), 2.054.741 pessoas contestaram descontos não autorizados e solicitaram o reembolso. Veja os detalhes do balanço:

- Consulta dos descontos de entidades associativas
- Quantidade de consultas: 2.102.201
- Quantos não autorizaram e solicitaram o reembolso: 2.054.741
- Quantos autorizaram: 47.460
- Canal de atendimento: Meu INSS = 1.899.180 (90,3%) e Central 135 = 203.021 (9,7%)
- Quantidade de entidades contestadas: 41.


SOBRE A AUTORA

Márcia Rodrigues é jornalista especializada em economia e empreendedorismo. Vegetariana e apaixonada pela defesa de causas sociais, am... saiba mais