Renda fixa: como investir com a Selic alta sem cair em promessas

Especialistas explicam qual é a lógica dos investimentos e descartam ser possível cravar ganhos futuros no longo prazo a partir da atual taxa básica de juros

gráfico mostrando trajetória de alta
Crédito: Fast Company Brasil

Márcia Rodrigues 4 minutos de leitura

A maior taxa básica de juros dos últimos 15 anos tem feito muitos investidores, iniciantes e experientes, olharem com mais atenção para a renda fixa. Com um patamar elevado da Selic14,75% ao ano –, ativos como Tesouro Selic, CDBs e títulos atrelados à inflação voltaram ao radar com força. Mas será que dá para acreditar na promessa de que o dinheiro investido hoje pode dobrar em cinco anos? A resposta é: depende, e é preciso cautela.

ONDE ESTÃO AS MELHORES OPORTUNIDADES?

Neste cenário, quais são as melhores oportunidades? O que pode inviabilizar expectativas exageradas e como usar os juros altos a seu favor de forma realista e estratégica? As especialistas ouvidas pela Fast Company Brasil explicam o que esperar nas atuais condições.

Com a Selic em seu maior nível em 15 anos, os ativos pós-fixados seguem como destaque no cardápio da renda fixa, segundo Laís Costa, analista da Empiricus. O motivo? Eles oferecem retorno alto com baixa volatilidade.

Na mesma linha, Carol Stange, consultora de investimentos e educadora financeira, aponta o Tesouro Selic, CDBs de bancos médios com liquidez diária e LCIs e LCAs, isentas Imposto de Renda (IR) como “extremamente competitivos”, inclusive frente ao risco de mercado.

Os Certificados de Depósito Bancário são um investimento de renda fixa que funciona como um empréstimo do investidor para o banco que, em troca, paga juros. Ao investir em CDB Já as Letras de Crédito Imobiliário e do Agronegócio são títulos de renda fixa título emitido por instituições financeiras.

ALÉM DO PÓS-FIXADO

Para quem busca algo além do pós-fixado, ambas recomendam olhar com atenção para títulos híbridos atrelados ao IPCA, que combinam rentabilidade com proteção contra a inflação. “Estamos aumentando a exposição em títulos IPCA+ devido ao patamar historicamente atrativo dos juros reais e à expectativa de IPCA acima da mediana do mercado”, explica Laís.

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo é a inflação oficial do país. Os investimentos atrelados a ele, acompanham a variação dos preços e, consequentemente, o seu poder de compra.

As taxas de IPCA+6% ao ano já são vistas no mercado e podem ser interessantes para metas de longo prazo, como aposentadoria, segundo Carol, desde que o investidor tenha tolerância à volatilidade no caminho.

A ARMADILHA DAS PROMESSAS

A conta que leva à ideia de “dobrar o investimento em cinco anos”, como se tem escutado no mercado, se baseia em uma taxa prefixada média de 15% ao ano. De fato, segundo Laís, um título do Tesouro com vencimento em 2035 e taxa de 14,02% ao ano teria um retorno bruto de cerca de 93% em cinco anos — o que chega perto da duplicação.

Mas há uma diferença importante entre uma simulação matemática e a realidade. Para dobrar o capital nesse prazo, explica Carol, seria necessária uma rentabilidade líquida de aproximadamente 15% ao ano — o que é difícil de garantir, considerando a tributação e a inflação.

Além disso, a Selic não deve se manter alta por muito tempo. “A primeira variável que inviabiliza essa promessa é a própria queda da taxa Selic, já precificada para os próximos trimestres”, diz Carol. No contexto, estão ainda o impacto da inflação e da cobrança de imposto de renda sobre os rendimentos como fatores que diminuem o retorno real.

SIMULAÇÕES REALISTAS: QUANTO DÁ PARA ESPERAR?

Para ter uma ideia mais pé no chão, Carol traz um exemplo: um CDB que pague 100% do CDI com vencimento em cinco anos pode render, na média, cerca de 52,5% a 52,6% líquidos no período, considerando as projeções atuais para os juros. Um excelente retorno, mas ainda longe de dobrar o valor investido.

Já Laís reforça que, mesmo com uma taxa prefixada alta, é fundamental levar em consideração que a rentabilidade bruta não é líquida de IR e que nem todo investidor conseguirá travar essa taxa por cinco anos sem precisar resgatar o valor antes.

O PAPEL DA DIVERSIFICAÇÃO

Mesmo com a atratividade da renda fixa no atual ciclo, as especialistas são unânimes ao destacar a importância da diversificação.

“Os ciclos mudam. Quem fica 100% em pós-fixado pode travar retornos mais baixos lá na frente”, alerta Carol. Sua recomendação é uma carteira equilibrada que inclua também ativos híbridos, fundos imobiliários, fundos de infraestrutura e ações resilientes, especialmente se o objetivo for proteger o poder de compra e crescer o patrimônio.

Um portfólio de renda fixa equilibrado deve conter ativos atrelados a todos os indexadores (Selic, IPCA e prefixados), reforça Laís. “Fazemos apenas alocações táticas maiores ou menores conforme o momento do ciclo econômico”. Por exemplo, em tempos de Selic elevada, faz sentido aumentar o peso dos pós-fixados na carteira, mas sem abandonar completamente as outras categorias.

INVESTIDOR INICIANTE PODE APROVEITAR

O conselho das especialistas para quem está começando é: vá pelo caminho mais simples, seguro e eficiente. “Comece com o Tesouro Selic. Ele se beneficia da taxa elevada e não tem risco de crédito”, indica Laís.

Carol também recomenda evitar promessas de “ganhos fáceis” e se concentrar em produtos com boa liquidez, isenção ou baixa carga tributária e retorno real positivo, como CDBs de bancos confiáveis. E lembra: “investir não é sobre acertar o melhor momento, mas construir uma estratégia que resista ao tempo e aos ciclos econômicos”.


SOBRE A AUTORA

Márcia Rodrigues é jornalista especializada em economia e empreendedorismo. Vegetariana e apaixonada pela defesa de causas sociais, am... saiba mais