Estudantes criam estufa que gera 50% mais energia do que consome
Quando as estufas se popularizaram, lá no século 19, elas revolucionaram a forma como as plantas e os produtos agrícolas eram cultivados. Hoje, o fato de que as estufas podem manter temperaturas constantes durante todo o ano faz com que sejam muito adotadas em climas mais severos. Mas é justamente aí que mora o problema: para funcionar, as estufas precisam consumir muita energia. Uma saída para esse impasse seria, é claro, se elas pudessem ser movidas a energia solar.
Pois na cidade de Barcelona, no Parque Natural Sierra de Collserola, um grupo de estudantes de arquitetura construiu recentemente um protótipo de estufa solar que produz sua própria energia e cultiva alimentos de forma autossuficiente. Construída com madeira de pinho proveniente da própria região, a estrutura de 12 metros quadrados fica em um pequeno terreno ao lado do Valldura Labs, um centro de pesquisa especializado em habitats autossuficientes. Embora essa estufa esteja localizada na natureza, o mesmo conceito pode ser replicado em telhados de cidades e em campos de refugiados, lugares onde é mais difícil de atender a necessidades básicas, como comida e energia.
Essa estufa experimental foi desenvolvida durante um programa de mestrado do Instituto de Arquitetura Avançada da Catalunha (IAAC). Liderados pelos arquitetos Vicente Guallart e Daniel Ibáñez, os alunos moraram no campus durante um ano e em apenas dois meses construíram a estrutura de dois andares.
Em 2014, Guallart escreveu um livro chamado “A cidade autossuficiente”. Na época, ele trabalhava como arquiteto-chefe de Barcelona e já defendia que os edifícios deveriam ser mais produtivos e que deveríamos produzir alimentos e energia localmente. De muitas maneiras, essa estufa é uma concretização da filosofia de Guallard.
A estrutura é distribuída em dois andares: as plantas germinam no de baixo e continuam a crescer no de cima. Um telhado de vidro inclinado ajuda a capturar a luz do sol durante o dia, enquanto a luz de LED e de UV ajuda a produzir alface, tomate e berinjela durante a noite. O telhado é decorado com painéis solares em um padrão quadriculado, enquanto as janelas da frente e de trás podem ser abertas para permitir a ventilação natural. Um sistema de irrigação enriquecida com nutrientes ajuda a acelerar o crescimento dos vegetais. Adicionando mais uma prática sustentável, em vez de apenas terra, eles reaproveitaram a serragem da madeira cortada na construção.
Tanto os painéis de LED quanto o sistema de irrigação da estufa são alimentados pelos painéis solares. Mas o sucesso é ainda maior: para funcionar, essa estufa necessita apenas de cerca de 50% da energia produzida por ela mesma. A outra metade é utilizada pelas instalações vizinhas do Valldura Labs. Guallart diz que os pesquisadores ainda poderiam cobrir todo o telhado com painéis solares e, assim, a sobra seria de 75% da energia. Mas restrições orçamentárias dificultaram a execução desse plano.
O protótipo foi concluído em setembro de 2021 e já inspirou o projeto de uma estufa na cobertura do edifício de madeira mais alto de Barcelona, que a empresa de Guallart (Guallart Architects) está projetando no momento. Com 149 metros quadrados e 2 metros e meio de altura, essa segunda estufa será mais de 10 vezes maior que o protótipo.
Estufas solares também podem ser construídas em cima de edifícios já existentes. “Se decidirmos que queremos produzir alimentos e energia em nossas cidades, podemos fazê-lo. A única coisa que precisamos fazer é adaptar os prédios, ou construí-los pensando nisso desde o início”, defende Guallart. Tudo se resume a quantos telhados planos sua cidade tem. E, segundo ele, em Barcelona cerca de 80% são planos.
Para Guallart, o objetivo final é construir comunidades capazes de cultivar os próprios alimentos e de produzir a própria energia. Nos arredores de Pequim, a Guallart Architects está trabalhando em um complexo habitacional autossustentável, com estufas comunitárias e telhados movidos a energia solar.
“Em vez de dar nosso dinheiro aos mercados que vendem alimentos e de pagar a empresas pela energia que usamos, devemos capacitar comunidades e edifícios, criando infraestruturas que os tornarão mais completos”, diz ele. “Podemos investir uma única vez e gerenciar para sempre.”