Cuidado: confiar demais em bots de IA pode fazer muito mal ao seu cérebro

Estudo mostra que o uso excessivo de ferramentas como o ChatGPT pode prejudicar a memória, o pensamento crítico e a capacidade de escrita

Crédito: Tero Vesalainen/ Getty Images/ Freepik

Eve Upton-Clark 2 minutos de leitura

Se você preza pelo pensamento crítico, talvez seja hora de repensar o quanto tem recorrido ao ChatGPT.

Em um momento no qual muitos estudantes comemoram por ter usado a ferramenta em trabalhos escolares – e com 89% admitindo usá-la para fazer tarefas –, vale a pena refletir sobre o impacto que isso pode estar causando no nosso cérebro.

Um novo estudo realizado por pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos EUA, dividiu 54 participantes (com idades entre 18 e 39 anos, da região de Boston) em três grupos.

Cada um deles recebeu a tarefa de escrever redações com temas comuns nos exames de admissão para universidades norte-americanas, usando o ChatGPT, o Google (como ferramenta de busca) ou apenas o próprio raciocínio.

Os pesquisadores monitoraram a atividade cerebral com eletroencefalogramas, analisando 32 regiões do cérebro. O grupo que usou o ChatGPT teve o menor nível de atividade cerebral – e também o pior desempenho, tanto nos aspectos neurológicos quanto linguísticos e comportamentais.

Segundo o estudo, a IA reduziu a atividade em áreas ligadas à memória e ao aprendizado, já que parte do raciocínio e do planejamento foi “terceirizada” para o modelo.

Como consequência, os participantes relataram sentir menos autoria sobre os textos. Além disso, tiveram dificuldade para lembrar ou citar trechos do que haviam escrito – sinal de que não ativaram processos mais profundos de memória.

Com o tempo, os participantes que usaram o ChatGPT foram ficando cada vez mais dependentes. No final do experimento, suas redações se resumiam praticamente a copiar e colar.

EFEITOS DA IA NA ATIVIDADE CEREBRAL

Os dois professores que avaliaram os textos os descreveram como “sem alma”. A autora principal do estudo, Nataliya Kosmyna, disse à revista “Time: “era tipo: ‘me dá logo esse texto, ajusta essa frase aqui, edita isso e pronto’”.

Já o grupo que escreveu por conta própria apresentou o maior nível de atividade cerebral, demonstrou mais curiosidade e engajamento e também se sentiu mais satisfeito com os textos que produziu. Aqueles que usaram o Google também mostraram alta atividade mental e relataram uma boa experiência com o processo.

Com o uso crescente do ChatGPT entre estudantes, esses resultados acendem um alerta. Um relatório publicado pela OpenAI em fevereiro de 2025 mostrou que mais de 25% das interações de estudantes universitários com o chatbot são relacionadas à educação.

Crédito: melis82/ Rawpixel/ Envato Elements

As cinco principais finalidades envolvem escrita: começar projetos e trabalhos (49%), resumir textos longos (48%), gerar ideias criativas (45%), explorar novos temas (44%) e revisar redações (44%).

Apesar de ainda não ter passado por revisão por pares e contar com uma amostra relativamente pequena, os autores decidiram publicar os resultados para chamar a atenção para os riscos de longo prazo do uso de modelos de linguagem – especialmente agora que mais pessoas estão terceirizando tarefas (de relatórios a mensagens de texto) para a IA.

“O que me levou a divulgar o estudo antes da revisão foi o medo de que, daqui a seis ou oito meses, algum político resolva dizer: ‘vamos implementar o GPT na educação infantil’. Acho que isso seria extremamente nocivo”, avalia Kosmyna. “Cérebros em desenvolvimento são os que correm o maior risco.”

Então, da próxima vez que estiver travado na hora de escrever, tente insistir um pouco mais. Seu cérebro vai agradecer.


SOBRE A AUTORA

Eve Upton-Clark é jornalista especializada em cultura digital e sociedade. saiba mais