Baterias usadas de carros elétricos agora geram energia para data centers

Novo projeto mostra que é possível construir centros de dados mais rápido, gastando menos – e ainda reduzir as emissões

Crédito: Redwood Energy/ Freepik

Adele Peters 4 minutos de leitura

Nos últimos dois meses, começou a ser implementado em uma área industrial do estado de Nevada, nos Estados Unidos, um projeto inédito: a maior microrrede do mundo feita com baterias reutilizadas de veículos elétricos, desenvolvida para abastecer um data center. É o primeiro de uma série de projetos planejados pela empresa de reciclagem de baterias Redwood Materials.

A startup tem recebido um número crescente de baterias usadas – só no último ano, foram dezenas de milhares, e a expectativa é de que esse número chegue a centenas de milhares nos próximos 12 meses.

Muitas dessas baterias ainda têm vida útil suficiente para serem reaproveitadas antes que seus materiais sejam reciclados. Isso pode ajudar a enfrentar um dos grandes desafios da transição energética: como construir novos data centers de forma mais rápida e acessível, sem sobrecarregar a rede elétrica nem aumentar as emissões de carbono.

“O volume de baterias com vida útil restante e que são mais baratas de reutilizar cresceu drasticamente nos últimos anos”, explica JB Straubel, CEO da Redwood Materials.

Straubel foi um dos fundadores da Tesla, mas deixou a empresa em 2019 para se dedicar à criação de uma nova cadeia de suprimentos de materiais críticos para baterias nos EUA, aproveitando o volume crescente de resíduos.

No ano passado, a Redwood começou a produzir comercialmente material ativo de cátodo – um dos componentes essenciais das baterias – a partir de resíduos reciclados. Sua unidade de reciclagem já é lucrativa: gerou US$ 200 milhões em receita no último ano. Agora, a empresa também vê uma grande oportunidade em dar uma segunda vida a algumas baterias antes de reciclá-las.

COMO AS BATERIAS GANHAM UMA SEGUNDA VIDA

Quando estão em carros ou caminhões, as baterias precisam atender a diversas exigências. “É uma aplicação que exige muito”, diz Straubel. “É necessário recarregar rápido, geralmente em estações de recarga rápida. E também manter boa parte da autonomia original do veículo.”

Mas mesmo quando perdem uma parte significativa dessa capacidade – o que as torna inviáveis para continuar sendo usadas nos veículos –, elas ainda podem ser aproveitadas para armazenar energia.

Nesse tipo de uso os ciclos de recarga e descarga podem ser mais lentos. Mesmo com metade da capacidade original, a bateria ainda é capaz de manter uma rede elétrica ou uma microrrede funcionando de maneira confiável. Em alguns casos, ela pode durar anos antes de precisar ser reciclada.

Crédito: Redwood Energy

No campus da Redwood, mais de 800 baterias reutilizadas foram conectadas a um sistema com oito hectares de painéis solares. Juntas, essas baterias fornecem energia para um novo data center construído pela Crusoe, empresa especializada em infraestrutura computacional de baixo carbono.

Esse centro opera totalmente fora da rede elétrica tradicional, sem depender de um sistema de backup externo. “Ainda assim, esperamos que ele seja muito confiável”, afirma Straubel. “Em alguns casos, pode até ser mais confiável, porque há menos pontos de falha.”

Crédito: Redwood Energy

Para viabilizar isso, a equipe instalou uma quantidade relativamente grande de painéis solares e capacidade de bateria. Em outros projetos, a ideia é construir microrredes conectadas à rede elétrica, mas que permitam que os data centers operem com energia renovável própria durante a maior parte do tempo.

Em alguns casos, geradores a gás também podem ser usados como backup. Mesmo assim, há vantagens claras em funcionar com energia renovável e fora da rede.

POTENCIAL DE ESCALA

Provedores de data centers que pretendem usar energia solar precisam encontrar terrenos bem localizados. Mas uma análise recente mostra que há mais do que terra suficiente nos EUA para atender à enorme demanda energética desses novos centros – mesmo em cenários altamente ambiciosos, que projetam a necessidade de até 300 gigawatts adicionais até 2030.

O estudo considerou a viabilidade de microrredes compostas por 90% de energia renovável e 10% de gás, mas também identificou locais com potencial para operar com 100% de fontes renováveis.

A Redwood já está desenvolvendo outras microrredes para novos data centerss. E, à medida que mais baterias de veículos elétricos usados se tornarem disponíveis, elas poderão ter um papel ainda mais relevante no sistema energético como um todo.

Crédito: Redwood Energy

“O volume de baterias usadas do setor automotivo e de transporte é muito maior do que o do setor elétrico”, afirma Straubel. “No longo prazo, acredito que as baterias de veículos elétricos – sejam de caminhões, carros ou robotáxis – vão ter um papel extremamente importante no armazenamento de energia em larga escala.”

Esse reaproveitamento também ajuda a baratear o armazenamento de energia – algo essencial para permitir a expansão das fontes renováveis. “Hoje, a energia renovável é a forma mais barata de geração que temos”, conclui.

“E isso só vai crescer. Mas ela é intermitente. Precisamos de uma solução economicamente viável para entregar energia limpa de forma contínua, se quisermos que ela realmente escale. E, para mim, esse é o principal uso das baterias no longo prazo.”


SOBRE A AUTORA

Adele Peters é redatora da Fast Company. Ela se concentra em fazer reportagens para solucionar alguns dos maiores problemas do mundo, ... saiba mais