Já pensou em investir em ativos verdes?
Com a proximidade da COP30 e o avanço dos extremos climáticos, investimentos com viés ambiental estão em alta; especialistas ensinam como identificar chances reais e fugir do greenwashing

Em um ano em que o Brasil sediará a COP30 — Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas — e em meio a eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes, muitos investidores estão se perguntando: será que vale a pena direcionar parte da carteira para ativos verdes? E mais importante: como fazer isso de forma consciente, sem cair em armadilhas de marketing ou greenwashing?
COMO IDENTIFICAR UM ATIVO VERDE?
Nem tudo o que brilha é sustentável. Um dos maiores desafios dos investidores está em diferenciar ativos com impacto real daqueles que apenas usam o ESG como estratégia de marketing.
Como explica Luzia Hirata, head ESG da Santander Asset Management os ativos verdes têm como lógica o direcionamento dos seus recursos para projetos e atividades que tenham benefício ambiental, social ou ambos.
"Ele devem ser monitorados ao longo da emissão, de forma que comprove o direcionamento adequado do recurso. Para isso, são realizadas verificações no início da emissão (para demonstrar que esteja adequado às características ambientais ou sociais) e periodicamente após a emissão (para garantir o direcionamento adequado)", detalha a executiva
“O que diferencia um ativo verde legítimo de um ESG de prateleira é a transparência”, explica João Kepler, CEO da Equity Group. Para ele, projetos ambientais auditados, com metas mensuráveis e relatórios claros são fundamentais.
Na mesma linha, Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio, reforça a importância da rastreabilidade: “ativos realmente verdes contam com auditorias independentes, relatórios de impacto e critérios objetivos vinculados a princípios como os Green Bond Principles ou à taxonomia verde nacional”.
PRINCIPAIS ATIVOS VERDES DISPONÍVEIS NO BRASIL
Para quem deseja começar a investir com viés ambiental, as opções vêm se ampliando no Brasil.
CRIs lastreados em construções sustentáveis: esses certificados captam recursos e destinam a empreendimentos imobiliários com foco em práticas ESG. A partir de R$ 50.
Fundos ESG: consideram os critérios Environment, Social & Governance ou Ambientais, Sociais e de Governança em português, além dos aspectos de seleção tradicionais para a composição da sua carteira. Há opções a partir de R$ 100;
Debêntures verdes:(títulos de dívida de renda fixa emitidos por empresas para financiar projetos com impacto ambiental positivo). A partir de R$ 1 mil;
ETFs temáticos (Exchange Traded Funds ou Fundos de índices, em português): tem suas carteiras construídas com exposição a ativos específicos do mercado. Há ETFs a partir de R$ 10;
Certificados de crédito de carbono: são títulos que representam a redução ou remoção de uma tonelada de dióxido de carbono (CO₂), ou de outro gás de efeito estufa da atmosfera. Esses créditos são usados para compensar emissões de empresas, governos ou indivíduos que querem reduzir seu impacto ambiental. A partir de R$ 1 mil; e
CRIs lastreados em construções sustentáveis: esses certificados captam recursos e destinam a empreendimentos imobiliários com foco em práticas ESG. A partir de R$ 50.
ENTENDA QUAL É O REAL IMPACTO POSITIVO
“Hoje o investidor pode acessar diversas opções com viés ambiental. Cada um tem seu perfil de risco, retorno e liquidez”, afirma o CEO da Equity Group. Ele reforça que o mais importante é entender como o ativo se conecta com uma agenda real de impacto positivo.
Monteiro acrescenta que a base de ativos já é “relevante para quem busca investir com viés ambiental no Brasil”, citando também os ETFs sustentáveis como o ISE e o ICO2, listados na B3.
GREENWASHING: COMO NÃO CAIR NESSA CILADA?
Com o crescimento da demanda por investimentos sustentáveis, aumentou também o número de produtos com discurso ambiental, mas sem entrega concreta.
“Greenwashing é quando uma empresa comunica compromissos sustentáveis que não se refletem em ações concretas”, resume Kepler. Segundo ele, o investidor precisa olhar além do selo e investigar a governança, os indicadores ambientais reais e o histórico da empresa ou gestora.
Garantir que o emissor atenda aos requisitos estabelecidos, por meio da contratação de um verificador externo, que irá emitir um documento chamado SPO – Second Party Opinion (Opinião de Segunda Parte), é uma forma de escapar do greenwashing, aponta a executiva do Santander.
Este tipo de verificação, segundo Luzia, dá um maior conforto ao investidor, pois uma análise de uma parte externa tem como objetivo identificar o alinhamento e propor correções necessárias, se for o caso, antes da emissão ir a mercado.
"Além disso, é importante fazer as avaliações tradicionais sobre o emissor e a emissão, ou seja, avaliar o risco de crédito e identificar ratings externos do emissor/emissão, se houver", alerta a head ESG da Santander Asset Management.
Monteiro recomenda evitar promessas vagas, exigir relatórios periódicos e contar com verificação por terceiros. “Transparência e rastreabilidade são essenciais para diferenciar marketing de impacto real.”
EXISTEM SELOS OU CERTIFICAÇÕES CONFIÁVEIS?
Ainda que o ecossistema de validação ambiental esteja em amadurecimento no Brasil, há iniciativas que ajudam a atestar a legitimidade de ativos verdes.
Entre os principais selos, Monteiro cita o “Ações Verdes”, da B3, e certificações do Inmetro baseadas na ABNT. “Também há uso crescente de verificadoras internacionais para green bonds e títulos ambientais”, sinaliza Monteiro.
Kepler complementa: “Temos a Climate Bonds Initiative e auditorias independentes, mas ainda é preciso ir além do selo e buscar informações sobre o projeto e sua rastreabilidade”.
INVESTIR EM EMPRESAS POLUENTES TEM RISCO?
Os investimentos em empresas poluentes apresentam risco para o investidor? A resposta é unânime: sim. A transição climática, antes vista como tendência, agora é uma realidade com impacto direto no mercado financeiro.
“Empresas com alta pegada de carbono tendem a enfrentar maior regulação, dificuldade de financiamento e desvalorização estrutural”, alerta Monteiro. Para ele, ignorar esses fatores é subestimar um risco sistêmico em formação.
Kepler concorda: “É um risco silencioso que o investidor não pode ignorar. ESG deixou de ser bônus e virou critério de sobrevivência”.
O ESG PERDEU FORÇA NOS ÚLTIMOS ANOS?
Apesar do esfriamento do tema ESG em alguns países — como os Estados Unidos sob influência do governo de Donald Trump —, os especialistas acreditam que o movimento está mais vivo do que nunca.
“O que houve foi uma filtragem natural”, explica Kepler. “Muitos embarcaram na sigla sem consistência, e o mercado começou a exigir mais substância”.
Monteiro acrescenta que, embora o ambiente político tenha afetado o discurso ESG, fóruns multilaterais e eventos como a COP mantêm o tema em evidência e devem impulsionar uma retomada.
COP30: IMPULSO AO INVESTIMENTO SUSTENTÁVEL?
A realização da COP30 em solo brasileiro tem potencial de transformar o país em protagonista climático, atraindo capital estrangeiro e pressionando o setor privado.
“A COP reposiciona o Brasil e pode acelerar o fluxo de capital para projetos sustentáveis, especialmente em infraestrutura verde, créditos de carbono e bioeconomia”, prevê Monteiro.
Kepler compartilha da visão otimista: “isso gera atenção internacional, atrai capital estrangeiro e pressiona empresas a se posicionarem. Para quem investe com propósito, é uma oportunidade de estar no timing certo da agenda global”.
ATIVO AMBIENTAL INFLUENCIA VALOR DE MERCADO
Segundo os especialistas, aspectos ambientais já têm impacto direto no valuation de empresas. Aquelas que não adotam boas práticas podem sofrer com boicotes, processos regulatórios e dificuldade de acesso a capital.
“O mercado já precifica esse tipo de passivo”, afirma Kepler. Ele sinaliza que hoje, uma empresa que ignora questões ambientais pode ter seu valor de mercado reduzido”.
Monteiro complementa: “Empresas com práticas ambientais frágeis sofrem descontos em valuation e maior aversão de fundos institucionais”.
INVESTIR COM PROPÓSITO E COM RETORNO
Outro mito derrubado pelos especialistas é o de que ativos sustentáveis oferecem menor rentabilidade.
“Não é mais necessário abrir mão de retorno”, afirma Monteiro que destaque que as debêntures de infraestrutura e ETFs ESG já entregam performance alinhada ao mercado, com menor risco reputacional e fiscal.
"O investidor não precisa escolher entre retorno e propósito”
João Kepler, CEO da Equity Group
Kepler concorda: “Já existem ativos verdes com rentabilidade competitiva, inclusive acima da média, dependendo do setor. O investidor não precisa escolher entre retorno e propósito”.
POR ONDE COMEÇAR UMA CARTEIRA VERDE?
Para quem está dando os primeiros passos no mundo dos investimentos ambientais, a recomendação é começar com cautela e foco na diversificação.
“O equilíbrio entre propósito e prudência é o caminho mais sólido”, orienta Monteiro, sugerindo uma composição com ETFs ESG líquidos, fundos sustentáveis e um título de renda fixa verde.
Kepler reforça a importância de entender o próprio perfil de risco e diversificar a carteira: “o futuro é verde, mas o risco ainda é parte do jogo”.
Os ativos verdes podem fazer parte de uma estratégia de médio e curto prazo também, explica a head ESG da Santander Asset Management. Há emissões com essas características, pois não necessariamente precisam focar no longo prazo.
Algumas estratégias de fundos de investimentos tradicionais podem incluir ativos verdes em conjunto com demais ativos, o que tem sido mais comum nas estratégias locais, acrescenta Luzia. "Muitas vezes, o volume de ativos verdes disponíveis no mercado não é suficiente para um portfólio 100% dedicado. Portanto, ativos verdes são utilizados em diversas estratégias, sejam elas sustentáveis ou não, de curto, médio ou longo prazo", orienta.
SAIBA MAIS SOBRE ESG E A COP30
Quer saber mais sobre os possíveis ganhos do Brasil com a COP30 e a relevância do conceito ESG nos negócios? Assista o terceiro episódio do Na ponta do Lápis, webcast da FastCo Money, com Ricardo Assumpção, da EY. A entrevista completa você encontra no link. Clique aqui.