IA está tornando alguns empregos mais perigosos, em vez de mais seguros

Robôs e ferramentas de IA poderiam melhorar as condições de quem trabalha, mas em vez disso estão tornando algumas funções mais perigosas

Crédito: Freepik

Merrit Stüven 3 minutos de leitura

Tecnologias que vão da inteligência artificial à robótica avançada têm sido celebradas por sua capacidade de reduzir a carga de trabalho das pessoas. Mas, apesar das promessas, esses recursos não estão sendo aplicados para melhorar a vida nem para garantir a segurança dos trabalhadores.

Em 2023, uma média de 385 pessoas morreram por dia nos Estados Unidos em decorrência de condições de trabalho perigosas, além de mais de três milhões de casos de doenças e lesões ocupacionais registradas no ano.

Enquanto isso, gigantes da tecnologia como Meta, Microsoft, Amazon e Alphabet gastaram, apenas no primeiro semestre de 2025, US$ 155 bilhões em desenvolvimento de IA – quase o mesmo valor que o governo dos EUA desembolsou em educação, treinamento, emprego e serviços sociais ao longo de nove meses.

Muito pouco desse investimento, porém, foi destinado a proteger trabalhadores. A pergunta que fica é: o que isso diz sobre nós como sociedade?

No setor de saúde, uma das principais causas de lesões é o esforço físico de levantar ou ajudar pacientes. Já existem tecnologias assistivas que poderiam prevenir grande parte desses acidentes, como os exoesqueletos robóticos.

No entanto, não se vê uma corrida para desenvolver equipamentos que aliviem o trabalho de enfermeiros e cuidadores. Em vez disso, o que cresce é a criação de chatbots para substituir atendentes ou automatizar funções mais básicas.

Em armazéns, os robôs têm tornado o trabalho ainda mais perigoso. O aumento da velocidade de processos exige que trabalhadores também acelerem seu ritmo, o que gera mais acidentes. Entre 2016 e 2019, investigações revelaram que centros de distribuição da Amazon com robôs apresentavam taxas de lesão 50% maiores do que os que não usavam a tecnologia.

Mesmo em 2020, quando a empresa relaxou temporariamente suas metas de produtividade, a taxa de acidentes em locais com robótica ainda foi 14% mais alta. Embora os robôs mais recentes tenham mais mecanismos de segurança, atualizar equipamentos antigos não parece prioridade.

OMISSÃO E SUBUTILIZAÇÃO

Em uma visita a um grande centro de distribuição anos atrás, foi possível observar trabalhadores embalando caixas em velocidade extrema, cercados de telas e máquinas.

Placas de aviso alertavam para o risco de equipamentos pesados entrarem em movimento de forma repentina. A mensagem era clara: se houvesse acidente, a culpa seria do trabalhador por não ter sido cuidadoso o suficiente.

Robô Cardinal, da Amazon, separando encomendas de forma autônoma
Crédito: Amazon

Muitos recursos capazes de salvar vidas estão subutilizados. Novos sensores poderiam ajudar trabalhadores do setor de agricultura – uma das categorias mais mal pagas e, ao mesmo tempo, essenciais – a evitar doenças ligadas ao calor extremo.

Dispositivos vestíveis inteligentes já são capazes de monitorar poluição do ar e alertar trabalhadores expostos, de mineiros a faxineiros. Outras ferramentas podem corrigir posturas que causam lesões ou desligar máquinas automaticamente quando alguém chega muito perto.

Essas soluções poderiam evitar inúmeros acidentes, mas dependem de investimento e da participação dos próprios trabalhadores no processo de implementação, para que atendam às suas reais necessidades.

COMO AUMENTAR A SEGURANÇA DOS TRABALHADORES

Há empresas que já começam a envolver trabalhadores em decisões sobre tecnologia. A Microsoft, por exemplo, firmou parceria com a Federação Americana do Trabalho e Congresso de Organizações Industriais (AFL-CIO, na sigla em inglês) para incluir sindicatos no debate sobre IA.

Mas muitas profissões de baixa remuneração dificilmente receberão investimentos nesse tipo de proteção avançada. Por isso, especialistas defendem atualização das normas de segurança do trabalho, levando em conta as novas tecnologias disponíveis.

soluções dependem de investimento e da participação dos trabalhadores na sua implementação.

Um cenário de alta tecnologia não deveria incluir trabalhadores perdendo membros em fábricas, sofrendo danos pulmonares por produtos de limpeza ou enfrentando lesões por esforço repetitivo em troca de baixos salários.

É preciso agir: regulamentações que tornem obrigatória a adoção de tecnologias de segurança, incentivos para empresas que investem em proteção e espaço para que trabalhadores tenham voz nas decisões.

Com políticas públicas firmes e líderes empresariais comprometidos, ainda é possível corrigir a rota e construir um futuro em que a inovação também signifique mais dignidade e segurança para quem trabalha.


SOBRE A AUTORA

Merrit Stüven é diretora associada do Programa de Oportunidades Econômicas da Iniciativa Futuro do Trabalho, do Instituto Aspen. saiba mais