3 bolhas de IA estão inflando ao mesmo tempo – e isso pode ser uma coisa boa

Especulação financeira, excesso de infraestrutura e hype exagerado marcam a atual corrida da inteligência artificial

Créditos: tohamina/ Xadart Studio/ Freepik/ Pete Linforth/ Pixabay

Faisal Hoque 3 minutos de leitura

Quando até Sam Altman acha que existe uma bolha de IA, é porque provavelmente existe mesmo. Mas a situação é ainda mais complicada: não há apenas uma bolha de IA, mas três.

A primeira é o que economistas chamam de bolha de ativos ou especulativa. É quando os preços disparam muito acima de seu valor real. Um exemplo clássico é a “mania das tulipas” do século 17, quando especuladores elevaram o preço de bulbos a níveis astronômicos, acreditando que sempre haveria alguém disposto a pagar mais caro por eles.

Hoje, a Nvidia negocia a 50 vezes seus lucros; a Tesla, a impressionantes 200 vezes, apesar da queda nas receitas; enquanto o restante dos “sete magníficos” (Google, Amazon, Apple, Microsoft e Meta) também se beneficia das apostas em um futuro guiado pela IA. A chance de isso não ser uma bolha é mínima.

A segunda é a bolha de infraestrutura: investimentos massivos sem garantias de uso pleno da capacidade instalada. Já aconteceu antes: no fim do século 19, investidores construíram milhares de quilômetros de ferrovias desnecessárias; nos anos 1990, o mundo foi coberto por cabos de fibra óptica que só se tornariam realmente úteis décadas depois.

Agora, empresas gastam bilhões em GPUs, sistemas de energia e resfriamento, apostando que a demanda virá. Analistas da McKinsey falam em uma “corrida de US$ 7 trilhões” para escalar data centers de IA. Isso pode acabar como os ciclos de expansão e colapso ferroviário de 1800.

A terceira é a bolha do hype. É quando a promessa de uma tecnologia se distancia da realidade. NFTs foram um caso clássico. A inteligência artificial vive um momento parecido. Um estudo do MIT aponta que 95% dos projetos-piloto de IA não geram retorno algum.

POR QUE ESSAS BOLHAS IMPORTAM?

No mundo dos negócios, bolhas não têm o charme de uma taça de champanhe. A reação instintiva pode ser fugir da IA. Mas, segundo especialistas, duas dessas bolhas não devem preocupar a maioria das empresas.

A bolha não é inimiga. Ela pode ser a melhor aliada, desde que usada de forma estratégica.

A bolha especulativa atinge investidores que apostam em avaliações exageradas, o que é algo distante da realidade operacional da maioria das organizações. A bolha de infraestrutura, caso realmente leve a excesso de capacidade, pode até ser positiva: mais oferta tende a derrubar preços de serviços de computação.

O que merece atenção é a bolha do hype. E aqui está a virada: mesmo que 95% dos pilotos falhem, não significa que a IA não tenha valor, e sim que muitas empresas a estão aplicando da forma errada.

COMO TIRAR PROVEITO DAS BOLHAS DE IA

As bolhas de IA podem ser, na verdade, uma bênção para os pragmáticos. A especulação injeta bilhões em pesquisa e desenvolvimento que você jamais justificaria ao conselho de administração. Atrai os melhores talentos do mundo para startups que criam ferramentas que, mais tarde, você poderá usar. E gera infraestrutura em escala tão absurda que reduzirá custos no futuro.

Enquanto investidores discutem quanto vale cada negócio, sua empresa pode selecionar soluções comprovadas e com ROI claro. Quando o ajuste vier, haverá talentos disponíveis, ferramentas testadas e infraestrutura barata.

Créditos: Freepik/ Pixabay

A bolha das empresas pontocom, no final dos anos 1990 e início dos 2000, deixou como legado a banda larga e desenvolvedores web. A bolha da IA deixará clusters de GPUs e engenheiros de machine learning.

O movimento mais inteligente não é evitar a bolha nem tentar cronometrar investimentos. É deixar que outros assumam o risco de capital enquanto você colhe os benefícios operacionais. A bolha não é inimiga. Ela pode ser a melhor aliada, desde que usada estrategicamente.

UMA DISTRAÇÃO MUITO VALIOSA

Talvez o maior presente dessa agitação toda seja a distração que ela proporciona. Enquanto comentaristas discutem se a Nvidia está supervalorizada e conferências lotam com painéis sobre a “bolha da IA”, algo interessante acontece: o ruído cria a cobertura perfeita para que operadores sérios construam valor duradouro.

Essa dinâmica psicológica gera uma vantagem competitiva real. O debate sobre as bolhas de IA dá aos céticos uma espécie de "permissão racional" para esperar. Afinal, por que investir naquele projeto promissor se todo esse movimento vai acabar desmoronando?

Enquanto isso, empresas que implementam a IA de forma sistemática, em silêncio, enfrentam menos competição por talentos, menos pressão sobre prazos e menos escrutínio sobre suas iniciativas. Quanto mais alto o falatório sobre a bolha, mais espaço se abre para quem estiver disposto a adotar uma abordagem certeira dessa tecnologia.


SOBRE O AUTOR

Faisal Hoque é fundador da Shadoka, que desenvolve aceleradores e soluções tecnológicas para o crescimento sustentável. saiba mais