Furacão com nome de mulher
Mariana Ribeiro compartilhar nomes de mulheres-furacão que estão provocando mudanças profundas na forma de exercer o poder no Brasil e no mundo

Um grupo de pesquisadores da Universidade de Illinois e do Estado do Arizona decidiu, há cerca de 10 anos, investigar uma pergunta inusitada: por que furacões com nomes femininos matam mais gente nos Estados Unidos do que aqueles batizados com nomes masculinos?
Para desvendar esse mistério, os cientistas bolaram um experimento. Apresentaram para um grupo de pessoas cenários hipotéticos de tempestades se aproximando, com ordens de evacuação voluntária.
Quem recebeu alertas sobre furacões com nomes masculinos, tipo "Hurricane Brad", levou a situação mais a sério do que quem ouviu falar da "Hurricane Ashley". Por serem subestimados, furacões femininos geram menos preparação e, tragicamente, mais mortes.
Historicamente, os EUA tiveram muito mais furacões com nomes de mulher. Quando os meteorologistas do U.S. Weather Bureau tiveram a ideia de começar a batizar furacões com nome de gente, fizeram a escolha pelos nomes femininos inicialmente com duas funções, uma mais oficial e outra mais oficiosa: que fossem nomes fáceis de memorizar e que passassem uma noção de “fúria” e de “imprevisibilidade” – não à toa, pairava no ar a suspeita de que escolhessem os nomes de suas (ex-) esposas ou namoradas, o que eles jamais admitiram publicamente.
Curiosamente, quando cederam à pressão para escolher um nome masculino, em 1979, optaram por “Bob” que, na minha visão, equivaleria no máximo a um furacão sentado à frente da TV, assistindo a uma partida de beisebol, tomando uma cerveja. Uma espécie de furacão “Homer Simpsons". Sorry, Bob, not sorry.
Brincadeiras à parte, o que este estudo escancara não é nenhuma novidade: vivemos numa sociedade que opera com base em modelos mentais profundamente enviesados sobre gênero, e esses vieses têm consequências reais, materiais e, não raro, letais.
quando uma mulher assume o poder, ela não devasta, ela reconstrói.
Ainda assim, são justamente as mulheres que estão mais comprometidas em solucionar as crises simultâneas que vivemos – climática, econômica, geopolítica, social. E elas estão fazendo isso de uma forma completamente diferente, mostrando que os mesmos modelos de dominação, opressão e concentração de poder que criaram esses problemas não conseguirão resolvê-los.
No Brasil, essa força transformadora já está redesenhando diversos espaços.
No mundo dos negócios, Fernanda Ribeiro fundou a Conta Black para resolver um problema que os bancos tradicionais fingiam não existir: o racismo estrutural no acesso ao crédito.
Érica Fridman, cofundadora da Sororitê, criou um venture capital para investir exclusivamente em startups lideradas por mulheres, entregando rentabilidade superior.
Ticiana Rolim, através da Somos Um, movimenta o empreendedorismo de mulheres de base e negócios sociais, com atenção especial ao Nordeste, gerando emprego, renda e prosperidade compartilhada.
Essa mesma força transformadora se manifesta em outras frentes. Sineia do Vale, à frente do Conselho Indígena de Roraima, treina mulheres para serem brigadistas de incêndio e proteger o território yanomami.

Suéli Feio transformou a Costurando Sonhos em Paraisópolis num polo de capacitação que viabiliza que mulheres quebrem o ciclo da violência doméstica.

Anna Muylaert, com sua sensibilidade transbordante em "A Melhor Mãe do Mundo", redefine narrativas sobre maternidade e classe social no cinema brasileiro.
Talvez os meteorologistas dos anos 1950 tenham acertado sem querer: mulheres realmente são como furacões – não pela "fúria" ou "imprevisibilidade" que eles imaginaram, mas pela capacidade de transformar completamente a paisagem por onde passam.

A diferença é que, quando uma mulher assume o poder, ela não devasta, ela reconstrói – sistemas mais justos, inclusivos e equitativos, abrindo caminhos antes impensáveis e deixando um rastro de mudanças que beneficiam toda a sociedade.
São elas que me inspiraram a aceitar o convite para esta coluna, que faz agora sua estreia. A cada mês, vou compartilhar com vocês nomes de mulheres-furacão que estão provocando mudanças profundas na forma de exercer o poder no Brasil e no mundo.
Essas mulheres apontam caminhos para como superarmos a crise mais aguda dos nossos tempos: a da imaginação.



