5 perguntas para Peter Bishop, futurista e fundador do Teach the Future

O pesquisador norte-americano é um dos principais nomes na consolidação dos estudos de futuros como campo acadêmico e prático

Peter Bishop, futurista e fundador do Teach the Future
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Redação Fast Company Brasil 5 minutos de leitura

O futuro não pode ser previsto, mas pode ser desenhado. Fundador e diretor do Teach the Future, movimento global de educação em futurismo, o pesquisador norte-americano Peter Bishop é um dos principais nomes na consolidação dos estudos de futuros como campo acadêmico e prático.

À frente da organização global que leva o pensamento de futuros para escolas e universidades, ele defende que preparar as novas gerações para a incerteza e para as mudanças é uma das tarefas mais urgentes da educação contemporânea.

Na semana passada, Bishop esteve no Brasil para dialogar com representantes do ecossistema brasileiro de associações futuristas. Em convite feito pela Teach the Future Brasil, o professor conversou com educadores, pesquisadores e formuladores de políticas que buscam incluir o pensamento sobre futuros nas escolas.

Bishop atua na área de estudos de futuros desde o começo dos anos 1980. Ele foi responsável por dirigir o primeiro programa acadêmico de formação de futuristas do mundo: o programa de Foresight da Universidade de Houston.

Membro fundador da Association of Professional Futurists (APF), também preside a consultoria Strategic Foresight and Development, especializada em aplicar técnicas de futuros ao ambiente corporativo.

Nesta entrevista, ele reflete sobre o papel da esperança diante da crise, a diferença entre prever e preparar o futuro e os desafios de ensinar a imaginar possibilidades em um mundo obcecado por certezas e tendências.

FC Brasil – Depois de mais de 40 anos trabalhando com cenários futuros, o que o tempo te ensinou sobre errar previsões?

Peter Bishop – Não acredito em erro, porque não fazemos previsões. Trabalhamos com cenários, e eles são múltiplos. Então, não se trata de acertar o que vai ou não acontecer, mas de pensar nas possibilidades.

Nos anos 1980, ninguém podia prever com precisão o fim da União Soviética ou a explosão da internet, assim como hoje não poderíamos prever o impacto do ChatGPT. E, pode acreditar, tudo isso também me pegou de surpresa.

A esperança é ativa, é a ideia de que podemos agir para fazer diferença e mudar os problemas.

Esses eventos mudaram o rumo do mundo, mas não invalidam o trabalho dos futuristas. Nosso papel é pensar o futuro esperado e também os futuros alternativos.

Esse hábito de imaginar o improvável é o que gera resiliência. Penso em astronautas treinando para todos os tipos de eventos que podem colocar suas vidas em risco. Eles se preparam para o que talvez nunca aconteça e, por isso, estão prontos quando algo inesperado acontece.

Pensar no futuro é esse hábito de abraçar as incertezas e entender que mudanças acontecem. E saber responder quando elas acontecem.

FC Brasil – Depois de tantas crises, como você mesmo citou, o que te mantém esperançoso ao projetar cenários para o futuro?

Peter Bishop – O que me mantém otimista é a história. Porque já estivemos aqui antes. A civilização humana já passou por momentos terríveis de guerras, colapsos, pandemias, e sobreviveu.

Isso não significa que tudo vai melhorar imediatamente. A segunda coisa em que acredito é uma frase que costumo usar: as coisas pioram antes de melhorar. Estamos desmontando estruturas, desmontando sociedades, modos de fazer as coisas e isso é uma pré-condição necessária para criar mudança.

Faço uma distinção importante entre otimismo e esperança. A maioria das pessoas acha que é a mesma coisa. Para mim, o otimismo é passivo: é acreditar que as coisas vão dar certo. A esperança é ativa, é a ideia de que podemos agir para fazer diferença e mudar os problemas. 

FC Brasil – As novas gerações vivem entre a ansiedade climática e o medo do apocalipse. Como cultivar esperança em tempos de redes sociais?

Peter Bishop – Vivemos em um mundo visto através de uma lente distorcida. A mídia sempre preferiu o que sangra, porque o que sangra é o que lidera. If it bleeds, it leads. Sempre começamos com o acidente de carro, o incêndio, o assassinato. 

As empresas sabem que o negativo prende o olhar e mantém as pessoas rolando a tela, e é assim que ganham dinheiro. Estamos nos alimentando diariamente de uma dieta de medo. Mas essa não é a única realidade. 

O antídoto é mostrar alternativas possíveis. Se os jovens entenderem que existem futuros positivos e que podem agir para alcançá-los, a ansiedade diminui. A ação é o antídoto do medo.

FC Brasil – A profissão de futurista não existia quando você começou a dar aula. Hoje em dia, apesar de ainda pouco conhecida, ela tem algumas figuras-chave, algumas celebridades que ganharam espaço com palestras e longos relatórios de tendência. Como o campo pode ir além dessa imagem?

Peter Bishop – O sucesso desses nomes é importante, porque dá visibilidade à área. Mas o risco é que o público passe a associar o futurismo apenas à ideia de prever tendências.

Peter Bishop, futurista e fundador do Teach the Future

Esses relatórios são bons e muitos deles são bem feitos, mas acabam simplificando o que é, de fato, o trabalho do futurista. Nosso papel não é apontar o que vai acontecer com certeza, nem falar das tecnologias que vão ser populares, e sim ajudar pessoas e organizações a pensar em possibilidades múltiplas.

A diferença é que nós fazemos o trabalho de base. Não oferecemos uma resposta definitiva, e sim um processo. É como uma due diligence do futuro: pensar em riscos, oportunidades, consequências.

Enquanto alguns preferem o simplificado, o “objeto brilhante” ou o conselho único, nós olhamos para o que pode dar errado também. Isso não é pessimismo; é responsabilidade.

FC Brasil – Uma das ações do Teach the Future no Brasil é conversar com escolas de ensino médio para tratar o assunto nos currículos. O que as crianças precisam entender sobre um futurista?

Peter Bishop – As crianças não precisam saber o que um futurista faz. Não se trata de divulgar a profissão. Mas precisam entender como a mudança funciona.

O ensino deve prepará-las para lidar com o inesperado e mostrar que o futuro é algo que pode ser influenciado. Elas têm que saber que o que esperam nem sempre vai acontecer, e que tudo bem. Precisam entender que podem influenciar o mundo à sua volta, sua equipe, sua escola, sua comunidade.

Não quero que se tornem futuristas. Quero que se tornem gestores, artistas, jogadores de futebol e engenheiros com uma visão do futuro que seja flexível e resiliente.


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