Do descarte ao desejo: como a caxemira reciclada virou símbolo do novo luxo
Peça da marca americana Reformation mostra como o luxo entrou na era da circularidade e como materiais reciclados estão conquistando espaço no guarda-roupa premium

Tem a mesma aparência e toque de qualquer outro suéter de cashmere luxuoso. Mas um novo suéter oversized da Reformation é feito inteiramente de fibra reciclada, um marco que levou três anos para ser alcançado.
A marca agora produz um cardigã, um suéter de gola redonda, um suéter com decote em V e outros cinco modelos a partir de uma mistura cuidadosamente desenvolvida de 95% de cashmere reciclado e 5% de lã reciclada. Trata-se de um material inesperado que tornou viável a fibra 100% reciclada.
Algumas outras peças da linha ainda utilizam uma pequena quantidade de cashmere virgem, mas a Reformation pretende eliminá-lo completamente.
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“Realmente tem uma pegada de carbono desproporcional e surpreendentemente grande em comparação com outras fibras”, afirma Kathleen Talbot, diretora de Sustentabilidade da Reformation.
Em 2023, a empresa calculou que, embora o cashmere virgem representasse menos de 1% dos materiais utilizados, era responsável por quase 40% da pegada de carbono da marca.
Leia mais: Crise no bolso, carrinho cheio: o que explica o apetite de compra dos brasileiros na Black Friday: Do descarte ao desejo: como a caxemira reciclada virou símbolo do novo luxoA maior parte do cashmere vem da Mongólia e da China, onde as cabras de cashmere são penteadas uma vez por ano para a obtenção de sua lã fina e macia; Um único suéter pode usar cashmere de quatro ou cinco cabras.
Com o aumento da demanda, agora existem mais de 90 milhões de cabras na China e cerca de 25 milhões na Mongólia. O sobrepastoreio está transformando pastagens em desertos. As cabras também produzem metano, um potente gás de efeito estufa.
BRIGA CONTRA DESAFIOS AMBIENTAIS
Usar cashmere reciclado ajuda a evitar esses desafios ambientais, mas historicamente tem sido difícil. A reciclagem encurta a fibra, o que pode torná-la mais frágil e mais propensa a formar bolinhas.
"Não queremos lançar um produto reciclado que não tenha o mesmo desempenho, seja de qualidade inferior ou menos durável", diz a executiva. "Para nós, isso não é sustentável."
Leia mais: Como um conceito econômico explica o caos do trânsito e pode ajudar a reinventar as cidades: Do descarte ao desejo: como a caxemira reciclada virou símbolo do novo luxoA empresa trabalhou com fornecedores para desenvolver um método próprio de torcer o fio, lavá-lo e finalizá-lo para obter o toque e a durabilidade ideais. Primeiro, eles conseguiram uma mistura de 70% de cashmere reciclado e 30% de fibra virgem, depois 90% reciclado e, por fim, 95% reciclado.
“Em cada uma dessas etapas, para ser sincera, pensávamos que aquele seria o nosso limite máximo, com base no desempenho do fio e do produto”, explica.
Quando atingiram 95%, perguntaram aos fornecedores por que não conseguiam chegar a 100%. Tecnicamente, disseram os fornecedores, era possível. Mas, como as fibras recicladas mais curtas são mais propensas a quebrar, o fio teria que ser fiado incrivelmente devagar. Isso encareceria tanto a produção do material que o tornaria inviável comercialmente.
Foi por isso que a equipe de design recorreu à lã para produzir o produto 100% reciclado. Mesmo após a reciclagem, a lã era “ligeiramente mais longa e espessa do que as fibras de cashmere”, cita a executiva. “Nossos fornecedores estavam confiantes de que isso daria a estabilidade necessária e garantiria a resistência durante o processo de fiação e tricô.” A pegada de carbono da mistura é 96% menor do que a do cashmere virgem e utiliza quase 90% menos água na sua produção.
Após dezenas de testes, eles seguiram em frente com a ideia e passaram meses testando peças de roupa feitas com o material. Internamente, a "Força-Tarefa de Melhores Materiais" da empresa, composta por cerca de 20 líderes, usou os novos suéteres reciclados no escritório e em casa, lavou-os e monitorou se eles se comportavam tão bem quanto suéteres feitos com material virgem.
"Nunca queremos promover algo apenas pelo impacto que não tenha, ao mesmo tempo, uma proposta de valor realmente convincente", diz a diretora de Sustentabilidade da Reformation.
AUMENTANDO A ESCALA
Quando a empresa começou a incorporar mais cashmere reciclado, obter o fio reciclado era um desafio. Agora, devido à maior demanda por fibra reciclada, a cadeia de suprimentos se adaptou. "O fornecimento de fibras recicladas não é mais o mesmo limitador de cinco ou dez anos atrás", afirma ela.
Atualmente, a maior parte vem de resíduos de cashmere em fábricas. Mas, à medida que a Reformation e outras marcas coletam mais roupas usadas para reciclagem, o cashmere pós-consumo pode se tornar uma fonte ainda maior.
Leia mais: Qual é o valor ideal para economizar aos 20 anos? Veja se você já atingiu : Do descarte ao desejo: como a caxemira reciclada virou símbolo do novo luxoOlhando para o futuro, a empresa poderá fabricar alguns produtos com uma mistura de cashmere reciclado e "regenerativo" — produzido com métodos de pastoreio sustentáveis — porque uma pequena porcentagem de clientes tem alergia à lã. Mas também planeja continuar a utilizar o material 100% reciclado em mais produtos.
"Nem todo problema tem solução tecnológica", diz a diretora de Sustentabilidade da Reformation. "Mas esses são os tipos de problemas que podemos resolver. E vimos um progresso enorme nos últimos três anos."