Imprimir um mini-fígado humano em 3D, a ambiciosa aposta da Dimension Bio
Com tecnologia que favorece a formação rápida de vasos sanguíneos, a Dimension Bio projeta um fígado funcional para uso temporário em pacientes críticos

Caralynn Nowinski Collens, Ramille Shah e Adam Jakus passaram anos desenvolvendo uma tecnologia inovadora para regenerar ossos lesionados. Os resultados, acreditavam, eram… apenas razoáveis.
A empresa que fundaram, a Dimension Bio, recebeu autorização da FDA (agência que regulamenta alimentos e remédios nos EUA) para sua abordagem: fornecer uma matriz, ou “base”, impressa em 3D para que novo tecido ósseo cresça ali.
Mas a regeneração não acontecia rápido o suficiente para competir com tratamentos tradicionais, como o transplante de tecido ósseo do próprio paciente.
Ainda assim, Collens, CEO da Dimension, vê a experiência como um saldo positivo: o processo serviu para validar a tecnologia e os protocolos da empresa junto à FDA. Isso pode ajudar a empresa a avançar rumo a um objetivo bem mais ambicioso nos próximos três anos: construir um fígado humano a partir de sua "base" e de células doadas.
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Na prática, seria uma versão miniaturizada e simplificada do órgão, capaz de funcionar o suficiente para manter uma pessoa viva. Isso poderia proporcionar tempo extra para que um fígado lesionado ou doente se recupere, ou garantir ao paciente uma janela maior até receber um transplante.
“As taxas de mortalidade são muito altas quando um paciente não consegue um transplante. É aí que queremos atuar”, explica Collens.
REIMPRIMINDO UMA CIÊNCIA CONHECIDA
Construir uma base onde células possam crescer não é novidade, nem o material usado pela empresa – o poliácido láctico-co-glicólico (PLGA). O composto está presente em diversos usos médicos, como suturas, preenchedores dérmicos e cápsulas microscópicas para liberação de medicamentos.
A inovação da Dimension Bio está em como utiliza a impressão 3D para construir a base de PLGA, parte de um sistema que a empresa batizou de BioNidum.

“Quando colocamos isso no corpo, surgem novos vasos sanguíneos muito rapidamente – e isso é incomum”, explica Collens, destacando que, normalmente, o sistema imunológico isola o corpo estranho e dificulta a vascularização.
Ela atribui o desempenho à estrutura da base, projetada com poros de diferentes tamanhos para facilitar a entrada das células e reduzir a resposta imune. Os poros maiores permitem que os vasos sanguíneos cresçam dentro do novo tecido.
A tecnologia nasceu no TEAM Lab, sigla de engenharia de tecidos e manufatura aditiva (o nome elegante para impressão 3D), fundado por Shah na Universidade Northwestern em 2010.
DA REGENERAÇÃO ÓSSEA AO MINI-FÍGADO
O CMFlex – o produto anterior da empresa para reparo ósseo – é considerado um “dispositivo médico”, o que exige uma revisão regulatória menos rigorosa do que a aplicada a medicamentos ou ao futuro mini-fígado da Dimension. Isso porque o CMFlex funciona apenas como uma base para que as células do próprio paciente cresçam, sem introduzir novas células.
Segundo Collens, o osso era o “fruto mais baixo da árvore” para provar a tecnologia, por ser um tecido naturalmente regenerativo. “Inseríamos essa matriz ou base para servir como guia, como um instigador do crescimento de novo osso.”
A FDA não exigiu testes em humanos para o dispositivo. Mas, embora as pesquisas com animais tenham sido bem-sucedidas, a Dimension decidiu realizar um programa piloto com pacientes antes de disponibilizar o produto.
O objetivo é construir um fígado humano a partir de uma "base" e de células doadas.
“Temos muitos exemplos de criação de osso em pacientes e animais”, diz Collens. “No entanto, não conseguimos fazer isso rápido o bastante para gerar a estrutura necessária – a estrutura no sentido da rigidez para suportar o peso e os impactos que o osso precisa suportar.”
A Dimension acabou decidindo que trabalhar com tecido seria mais impactante e optou por não levar o CMFlex ao mercado.
O plano agora é cultivar um fígado pequeno e simplificado sob a pele, oferecendo uma solução temporária até que o órgão completo se recupere ou o paciente receba um transplante.
Mas mesmo um mini-órgão é muito mais complexo do que o osso. “É um produto fundamentalmente diferente quando falamos em colocar células em uma base”, diz Collens.

Em testes conduzidos em camundongos com danos induzidos no fígado, a empresa afirma ter aumentado a taxa de sobrevivência em mais de 70% após implantar a base com células hepáticas de humanos e de roedores.
Isso exigiu centenas de milhões de células. Mas, segundo Collens, construir o mini-fígado humano pode exigir de cinco a 20 bilhões de células. Para humanos, a Dimension usará células-tronco para produzir esses bilhões de células hepáticas. Antes disso, vêm os testes em ratos e porcos.
O cronograma da empresa é agressivo: a meta é iniciar os ensaios clínicos em humanos em 2028.