Será que ainda precisamos de gerentes? Grande parte dos funcionários diz que não

Crédito: Fast Company Brasil

Claudia Penteado 5 minutos de leitura

A grande maioria dos trabalhadores americanos acredita que pode exercer suas funções com eficiência sem a supervisão de um gerente, e com a onda contínua de trabalhadores que vem pedindo demissão, empregadores deveriam prestar mais atenção a isso.

Numa pesquisa recente feita pela GoodHire com 3 mil trabalhadores americanos, 83% dos entrevistados afirmam que poderiam exercer suas funções sem a necessidade de um gerente. Esse número aumenta para 89% em cargos relativos a finanças e seguros, para 88% entre trabalhadores da saúde e para 87% dentre os que trabalham nos setores de hotelaria, ciência e tecnologia. Para além disso, 84% dos entrevistados afirmam que se sentem capazes de fazer o mesmo trabalho de seus gerentes e 82% afirmaram que considerariam pedir demissão se tivessem um gerente ruim. 

“Muitas vezes as pessoas equiparam a gerência com uma espécie de micro gerenciamento de pessoas, mas não acho que seja essa a melhor forma de gestão”, opina Mike Grossman, CEO da GoodHire. “As pessoas trabalham melhor quando não são micro gerenciadas, e na maior parte do tempo, elas não precisam de tanta supervisão”. 

Grossman diz que essa ampla sensação em relação aos gerentes pode ter duas causas: o modo como eles são selecionados e o modo como são treinados (ou não treinados). 

“Muitas vezes, as pessoas são meio autodidatas quando se trata de cargos de gerência, então não é surpreende que reproduzam comportamentos moldados em outras organizações, e muitas vezes essas não são as melhores práticas” diz ele. “O outro motivo é que muitas pessoas foram promovidas a gerentes porque eram muito autocentradas – estavam em busca de seus próprios objetivos e ambições – e o cargo acaba sendo uma recompensa para aqueles que não são tão empáticos”. 

De acordo com um estudo de 2018 da WestMonroe, 34% dos gerentes não recebem treinamento específico. Esse número salta para 59% dentre aqueles que supervisionam uma ou duas pessoas, e para 41% dentre os que supervisionam de três a cinco pessoas. Para além disso, 43% dos gerentes como um todo não recebe um treinamento específico ao cargo no seu primeiro ano de trabalho. 

PROCURA-SE GERENTES EMPÁTICOS

Enquanto gerentes muitas vezes chegam à gerência como forma de reconhecimento de suas performances profissionais, conquistas individuais raramente costumam ser bom indicador de habilidades gerenciais. Nos últimos ano, e sobretudo durante a pandemia, houve um reconhecimento mais amplo da importância de demonstrar empatia por parte dos gerentes. De acordo com um estudo recente conduzido pelo EY Consulting, 90% dos trabalhadores americanos equipararam liderança empática com uma maior satisfação no trabalho, 88% dizem que essa qualidade contribui para a lealdade do funcionário e 79% concordam que ela reduz a rotatividade no seio da empresa. 

“Os melhores gerentes são pessoas genuinamente preocupadas com seus colegas e que se comunicam com eles”, diz Grossman. “Não são só palavras, não é só retórica; eles de fato se importam com as pessoas, com o quanto elas estão satisfeitas, com seu desenvolvimento profissional e investem tempo e energia para ajudar os membros da equipe”. 

Todavia, de acordo com outra pesquisa recente, conduzida por Gartner, apenas 47% dos gerentes se sentem aptos a liderar com empatia. 

“Passamos de alguém que gerencia tarefas de seus funcionários a alguém que precisa ser praticamente um assistente social, ou um orientador escolar, que deve apoiar seus funcionários frente aos desafios, tanto no trabalho como na vida pessoal” diz Brian Kropp, chefe de pesquisa de RH da Gartner. “Se você não quiser que seus funcionários falem de suas situações pessoais, de suas necessidades pessoais, e se você não pode apoiá-los, então é provável que você não deva ser gerente”. 

FUNCIONÁRIOS PEDEM MAIS AJUDA A SEUS COLEGAS QUE A SEUS GERENTES 

Kropp acrescenta que gerentes são tradicionalmente promovidos porque adquiriram o domínio de um trabalho específico e são designados para ajudar outros a completar as mesmas tarefas. Ao longo do tempo, todavia, ele diz que as responsabilidades dos gerentes – e o número de funcionários que se reportam a eles – aumentaram drasticamente, tornando mais difícil qualquer acompanhamento mais pessoal. De acordo com a pesquisa da Gartner, 70% dos líderes médios de RH afirmam que os gerentes estão sobrecarregados. 

“Quando você compara hoje a 15 anos atrás, o leque de atuação de um gerente médio aumentou em 70%; portanto, esse gerente tem que lidar com mais relatórios diretos do que nunca”, diz ele. “Se eu sou um dos muitos funcionários que tenta falar com o meu gerente, isso só torna mais difícil que ele arrume um tempo para mim”. 

Segundo Kropp, o resultado é que funcionários se voltam para seus colegas para obter a ajuda e os conselhos que tradicionalmente deveriam buscar num gerente. “Os funcionários sentem que os gerentes sabem menos sobre o cotidiano do trabalho do que seus colegas e, por esse motivo, se voltam para eles para receber conselhos e treinamento de como trabalhar” diz ele. “Você soma esses elementos e tem um ambiente onde o funcionário geralmente tira mais proveito da relação com seus colegas do que com o gerente”.

GERENTES SÃO UM DOS MOTORES DO AMBIENTE DE TRABALHO TÓXICO

Não só gerentes perderam o posto de recurso a quem o funcionário se reporta, mas são também uma fonte primária de toxicidade no ambiente de trabalho. De acordo com um estudo recente conduzida pela CultureX, uma cultura corporativa tóxica é a principal causa de desgaste e é provável que seja 10 vezes mais responsável pela partida de um funcionário do que um salário.

“Líderes têm um papel desproporcional ao moldar culturas tóxicas e, sobretudo, microculturas tóxicas” diz Charles Sull, co-fundador da Culture X. 

 


SOBRE A AUTORA

Claudia Penteado é editora chefe da Fast Company Brasil. saiba mais