Queer spaces: guia traz os locais mais frequentados pela comunidade gay pelo mundo

Há um parque em Dhaka, capital de Bangladesh, que serve a duas funções muito diferentes, dependendo da hora. Durante o dia, oferece lazer para todas as idades; à noite, é um point de "pegação" LGBTQIA+. Essa versatilidade é algo comum em diversas cidades pelo mundo: quando parques, prédios e cidades não são projetados para incluir a cultura queer, as pessoas queer acabam se virando para torná-los seus também. Mas e se elas não precisassem se virar?
Uma publicação recém-lançada pinta um retrato caleidoscópico de espaços gay-friendly em todo o mundo. Intitulado "Queer Spaces: An Atlas of LGBTQIA+ Places and Stories" (Espaços Queer: um Atlas de Lugares e História LGBTQIA+), o livro reúne de bares, clubes, parques públicos, centros comunitários, teatros e casas particulares que não têm nada em comum além da vibe de seus ocupantes.

Alguns, como o parque de Bangladesh, foram subvertidos pela comunidade queer; outros, como o Victorian Pride Center, em Melbourne, foram criados para dar aos LGBTQIA+ um espaço de socialização. Mas, apesar de toda a diversidade destacada no livro, "Queer Spaces" deixa algo muito claro: não dá para projetar espaços queer se você não for queer. Se a intenção realmente é que todos se sintam incluídos, você pode – e deve – contratar arquitetos e designers queer.
"Queer Spaces" foi editado por Adam Nathaniel Furman – arquiteto londrino que se tornou um artista e designer conhecido por suas esculturas públicas marcantes e em cores vivas – e Joshua Mardell, historiador de arquitetura britânico. Juntos, eles reuniram mais de 50 colaboradores, de pesquisadores a planejadores urbanos e cineastas. Cada um deles escolheu um ou vários espaços queer que tivessem algum significado pessoal.
Os registros vêm dos quatro cantos do mundo: um clube do livro em Bangkok; uma praça pública em Amsterdã; um quiosque de praia em Perth, na Austrália; um clube em Porto Rico. Muitos dos espaços apresentados no livro levam vidas duplas, ou seja, servem a uma função durante o dia e a outra durante a noite.

Em Dakha, por exemplo, uma cidade descrita como “homofóbica, transfóbica e misógina”, o parque mencionado é uma prova do desejo universal de homens gays, bissexuais ou mesmo enrustidos de exercerem seu próprio espaço. “A ideia de alguém queer passear à vontade numa cidade como Dhaka pode parecer absurda, tendo em conta o risco de violência. Mas isso tem acontecido no XXX, um dos parques mais bonitos de lá”, escreve Ruhul Abdin. (O nome real e a localização do parque foram deixados de fora do livro, para proteger o colaborador.)

Para um livro sobre arquitetura (publicado nada mais, nada menos do que pelo Royal Institute of British Architects), "Queer Spaces" exibe mais as pessoas do que propriamente os edifícios. Talvez seja porque o que torna um edifício “queer” não é sua estética, seu layout, ou mesmo a sua intenção inicial. É o povo. “Você pode encontrar uma peça de arquitetura realmente sem graça sendo apropriada por uma comunidade queer e transformada em queer, ou uma conscientemente projetada por algum designer que se guia pelos vetores da sua própria identidade queer”, diz Furman.
O problema, diz Furman, é que os arquitetos cis costumam projetar edifícios como “espaços amplos genéricos”, que o fazem se sentir exposto. Esses espaços “altamente eficientes, extremamente mecânicos” são projetados por e para homens e mulheres cis, que se veem refletidos em todos os lugares que vão. Contudo, esses locais muitas vezes são vastos, carecem de recintos e de espaços íntimos e são desprovidos de arte.
“Quem está acostumado a viver em pequenos espaços escondidos não se sente confortável quando entra em espaços gigantes e minimalistas”, diz Furman, citando a nova arquitetura do metrô de Londres como exemplo. “Não há uma única obra de arte ali, e talvez algumas escadas rolantes tenham algo que supostamente seja arte, mas tudo parece mais o saguão de uma horrível torre corporativa”, diz ele.

A julgar pelos exemplos do livro, pode ser difícil definir uma estética queer. Mas, para Furman, ela começa toques de arte, de artesanato, de decoração e de ornamento no espaço público. “Essa é uma maneira fácil de introduzir culturas diferentes, para que mais pessoas se sintam representadas e se enxerguem ao seu redor”, dizem os autores.
Um número diversificado de espaços também é importante: recantos menores, para quem quer ficar sozinho, e espaços maiores, para quem quer se reunir. “Isso vai além das pessoas queer”, dizem eles. “Quem não se encaixa nos padrões, por quaisquer outros motivos, também pode se beneficiar desses lugares.”

Projetar espaços queer significa, então, projetar espaços diversos – desde que se deixe os designers queer assumirem a liderança desses projetos. “Mais do que criar espaços genéricos para a comunidade queer, trata-se de capacitar a comunidade a produzir trabalhos por conta própria”, diz Furman. “A abertura do espaço para o diferente dentro dessa profissão é a questão mais importante, e nisso ainda estamos lamentavelmente atrasados.”

