O que as startups brasileiras podem aprender com a inovação “made in France”
Modelo francês de ecossistema de inovação pode ser a saída para o mercado brasileiro passar pela atual escassez de investimentos
E se as startups brasileiras fossem para a França? O modelo de inovação francês, que centraliza os movimentos do ecossistema e cria oportunidades em conjunto, pode ser um caminho para o Brasil passar pelo “inverno das startups” sem tantas baixas e ainda fortalecer todos os participantes do mercado no processo.
O formato “made in France” pode parecer um contrassenso para um setor tão acostumado a se moldar pelo que acontece no Vale do Silício, mas pode levar a um crescimento sustentável do mercado como um todo.
“É complicado modelar o seu desenvolvimento a partir da primeira economia mundial. Não é exatamente um modelo replicável e que funciona em outros países. O Brasil poderia ganhar ao olhar para outras realidades, incluindo a da França e da Europa como um todo”, diz Xavier Leclerc, sócio da Templo Ventures, co-fundador da MOX Digital e dos eventos .Futuro.
Leclerc é um dos conselheiros do La French Tech, iniciativa organizada por startups francesas para criar comunidades dentro e fora do país. O movimento começou com “grupos de empreendedores que se correspondiam”. Acabou se tornando um fator que contribuiu não só para o país chegar à marca de 26 unicórnios (ou “licornes”, em francês) como também para a reeleição do presidente Emmanuel Macron este ano.
"O Brasil poderia ganhar ao olhar para outras realidades, como a da Europa."
“Um movimento centralizado, como na França, seria melhor para as startups brasileiras”, diz Leclerc, que apoia o braço da French Tech no Brasil. Atuando aqui há quase cinco anos, Leclerc acredita que a cena de inovação local é expressiva, porém dividida em capitais e em estados, o que gera disputas internas por mão-de-obra e financiamento.
Nada disso ajuda em momentos de escassez e de alta concorrência externa. “A disputa por mão-de-obra, por exemplo, é mundial”, comenta o executivo, ao lembrar que as startups europeias também precisam se proteger da saída de cérebros, que procuram companhias norte-americanas e salários em dólar.
PENSAR PARA FORA
Pensar em crescimento, para startups francesas, é planejar a ida para novos países. A abertura à internacionalização está no topo do planejamento daquelas que pretendem crescer exponencialmente na França.
Olhar para novos mercados e para oportunidades de ampliar as operações pode ser a forma de as companhias brasileiras sobreviverem a momentos de choque no mercado doméstico.
Leclerc, que atua em um fundo de capital de risco (ou venture capital, no jargão financeiro) na Templo, entende que o novo cenário para startups captarem investimentos será mais desafiador e exigirá que o faturamento seja alto. Abrir novos mercados consumidores é importante nesse contexto, para que se consiga testar alternativas mais rapidamente.
o novo cenário para startups captarem investimentos será mais desafiador.
Nesse ponto, a falta de uma associação única de startups brasileiras também é um empecilho ao movimento de internacionalização. “Não vejo um ecossistema brasileiro ainda, mas uma realidade brasileira”, afirma Leclerc. O modelo centralizado é uma forma de chamar a atenção para a cena como um todo, e não apenas para os grandes players.
Leclerc aponta para movimentos como o da French Tech, que atua no Brasil conectando companhias que tenham fundadores com raízes francesas ou que tenham estudado no país. É uma conexão que já chega a companhias como Loggi e Daki.
A internacionalização não se restringe aos produtos, pode abranger também os investimentos. Na França, por exemplo, as rodadas de venture capital não-europeias representam 48% do total. Já no Brasil, os fundos não-brasileiros são apenas 31% do total, segundo o executivo.
“A chegada dos fundos internacionais ainda está por vir”, comenta Leclerc, que vê oportunidades claras para startups brasileiras, principalmente as que atuam em setores como greentech e agritech. “Como atrair esse dinheiro? Fazendo barulho”, aconselha.
O importante mesmo é procurar por uma diversidade de modelos de negócio e de ecossistemas, diz Leclerc. “Se você achar que a mesma coisa vai ter resultados diferentes, é uma definição de loucura”, afirma – não sem um fundo de razão.