A invisibilidade dos 50+ visível na publicidade


Tati Gracia 4 minutos de leitura

Enquanto o mercado debate a melhor forma de se comunicar com os millennials e a geração Z, a população envelhece.

Já são mais de 50 milhões de pessoas com 50+ no Brasil, representando 25% da população brasileira. Pela primeira vez na história, temos mais avós do que netos no país.

Essa população já ultrapassou a de cinco anos e, em 2030, teremos mais 50+ do que a Gen Z.

Temos hoje a menor taxa de natalidade da história (1,7). Isso significa que a população brasileira continua a crescer não pela fertilidade, mas porque as pessoas estão vivendo mais.

No Brasil, 86% dos 50+ possuem renda própria e pelo menos 11 milhões de brasileiros dependem da renda deles para viver.

Os 50+ são responsáveis por mais de 20% do consumo, o que equivale a cerca de R$ 1,8 trilhão. É a chamada “economia da prateada”.

Apesar de terem dinheiro e vontade de consumir, quatro em cada dez brasileiros com mais de 55 anos reclamam: “faltam produtos e serviços que satisfaçam minhas demandas e necessidades”.

Exemplos não faltam. Na medicina, ainda pouca ênfase em geriatria e desconhecimento sobre gerontologia não estimulam a formação de profissionais nessas especialidades. Nas corporações, segundo um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os maiores de 50 anos não chegam a 5% da força de trabalho nas grandes empresas.

GUIA DE COMBATE AO ETARISMO

A invisibilidade dos maduros também é perceptível nas campanhas publicitárias, que não incluem personagens 50+; nos pontos de venda, que não pensam na acessibilidade, iluminação das lojas e atendimento dessa faixa etária; no desenvolvimento de produtos – desde letras pequenas nos rótulos até a dificuldade de abertura de potes e embalagens; na experiência digital, que leva em consideração apenas jornadas de sucesso para millennials; e nas cores e formatos de roupas, que ainda insistem que mulheres maduras usem apenas cores bege e sem graça. Inclusive, os convido a conhecer o Guia de Boas Práticas de Combate ao Etarismo, da Associação Brasileira de Anunciantes (ABA).

Já passou do tempo de criarmos propagandas reais sobre os novos maduros para combater o etarismo.

Tem mais um fator que não pode deixar de ser mencionado: se os 50+ “dentro da caixinha” já são ignorados pela sociedade, imagine aqueles sobre os quais não falamos. É a invisibilidade das velhices ignoradas: maduros de baixa renda; analfabetos digitais; LGBTQIA+; PCDs... Ainda há muito o que ser feito para incluí-los nessa conversa.

Já passou do tempo de criarmos propagandas reais sobre os novos maduros para combater o etarismo. Uma das principais dicas para isso começar a acontecer é também uma das mais óbvias: para gerar uma comunicação eficaz com os mais velhos, é necessário ter criativos maduros no time. Apesar de óbvia, essa ideia está longe de se tornar realidade. No mundo, apenas 5% dos funcionários de agências de publicidade têm mais de 50 anos!

O preconceito etário, assim como as outras discriminações sociais, é baseado em estereótipos. Por isso, é preciso acrescentar a este debate o papel da mídia e da indústria na manutenção dos estereótipos idadistas.

O discurso anti-idade está presente nas campanhas publicitárias e nas promessas de produtos voltados à saúde, moda e beleza que retratam o corpo que amadurece como inimigo, provocando diferentes maneiras de rejeição à figura do velho e reforçando o polêmico conceito que qualifica a velhice como doença.

Se você não faz um produto ou serviço igual para uma criança de cinco anos e um adolescente de 15 anos, é impossível criar para os 50+ como se, dos 50 aos 100, esses consumidores fossem um grupo uniforme de pessoas.

NOVA IMAGEM

A falta de conhecimento e representatividade desse público resulta em uma comunicação negativa e cheia de estereótipos ultrapassados sobre o que significa ser velho hoje. Quando os maduros estão nas propagandas, quase nunca são retratados de forma autêntica, o que se traduz em uma falta absurda de empatia, respeito e imaginação.

É só digitar no Google, na busca por fotos de pessoas mais velhas, que você encontrará imagens em preto e branco e geralmente com personagens tristes e rabugentos.

. No mundo, apenas 5% dos funcionários de agências de publicidade têm mais de 50 anos.

Se procurar fotos nos bancos de imagem que representem bem a diversidade de corpos, cabelos e pele dos brasileiros já é um desafio, se somarmos a diversidade de idade fica quase impossível utilizar imagens prontas nas campanhas e projetos.

O ideal é, então, criar fotos novas com modelos que representem os novos maduros.

Nos Estados Unidos, a AARP (American Association of Retired Persons) lançou, em 2019, em parceria com a GettyImages, o primeiro banco com fotos de norte-americanos 50+ dessa nova geração de prateados ativos, felizes e diversos.

Entender o impacto econômico no comportamento de consumo e na empregabilidade dessa população passa, portanto, a ser determinante para companhias e marcas que desejam ser inclusivas e longevas.

O problema vem da incapacidade das empresas de traduzir o “envelhecer” na terceira pessoa e transformá-lo em uma oportunidade na primeira pessoa. Afinal, vamos admitir: temos, de fato, uma relação ambivalente com a idade – e essa ambivalência leva à inação.

Os números comprovam: cinco anos após o início, 70% dos negócios estabelecidos por empreendedores 50+ ainda estão em operação, na comparação com apenas 28% de empreendimentos lançados por empresários mais jovens.

Um fundador de startup de 60 anos tem três vezes mais chances do que um de 30 anos de lançar um negócio de sucesso.

Com a nossa nova longevidade, é hora de passarmos a medir a idade em potencial futuro – não apenas em cronologia de anos vividos.


SOBRE A AUTORA

Tati é referência em comportamento de consumo e empatia no Brasil. Mestre em Análise do Comportamento Humano, é autora do livro “Empat... saiba mais