Porque a fast fashion é o novo cigarro
Embora a moda não mate aos poucos seus clientes, ela pode ser prejudicial da mesma forma, causando estragos no planeta
A geração Z está enfrentando um dos maiores paradoxos dessa nova era. Eles construíram toda uma reputação como a geração mais ecológica, mas compram mais roupas baratas e descartáveis do que qualquer outro grupo de consumidores.
Mas por que essa geração está ignorando informações contundentes sobre os maiores infratores da moda, ignorando suas próprias intenções sustentáveis e continuando a comprar fast fashion em um ritmo tão alarmante? A resposta é simples: a moda rápida é viciante.
Embora vira e mexe sejam divulgados dados bastante incriminadores, provando que cada estágio do ciclo de vida dessa indústria causa devastação ao planeta, a fast fashion tem poucas regulamentações, permitindo que gigantes como Shein se tornem tão populares que tenham mais downloads de aplicativos nos EUA do que a Amazon.
Se a fast fashion continuar sem controle e visando as gerações mais jovens de consumidores, ela se tornará a próxima indústria do tabaco. Embora a moda não mate aos poucos seus clientes, ela pode ser prejudicial da mesma forma, muitas vezes incentivando práticas trabalhistas antiéticas – e causando estragos em nosso planeta.
PRESSÕES IMPULSIONAM O CRESCIMENTO
Nossa pesquisa mostra que metade dos estudantes universitários acompanha tendências de fast fashion nas mídias sociais semanalmente. Entre a grande rotatividade das tendências nas mídias sociais e o volume impressionante de produtos que algumas das marcas de hoje estão lançando, as tendências da moda agora são diárias, em vez de sazonais.
a roupa que sai barata demais geralmente tem um custo alto para o meio ambiente.
A moda rápida instiga os piores instintos das pessoas para um burburinho de curto prazo, permitindo que os compradores consumam continuamente, na tentativa de acompanhar as modas intermináveis e passageiras das redes sociais e da cultura de celebridades.
Infelizmente para a geração Z, a gratificação instantânea de encontrar uma peça da moda em um desses sites geralmente neutraliza as consequências ambientais de longo prazo do consumo excessivo.
Além disso, nossa própria pesquisa descobriu que 65% dos consumidores da geração Z dizem que compram roupas em lojas de fast fashion porque economizam dinheiro. Esta geração ainda não tem mais de 25 anos, o que torna o preço uma preocupação fundamental que orienta suas decisões de compra.
Mas a roupa que sai barata demais geralmente tem um custo alto para o meio ambiente. Cerca de 70% das emissões de gases de efeito estufa da moda são atribuídas a atividades upstream, como a produção de novas roupas.
SEMELHANÇAS COM A INDÚSTRIA DO TABACO
Se isso tudo parece uma reminiscência da indústria tabagista, é porque é. Em seu auge, a indústria do tabaco dos EUA usou táticas semelhantes a essas que atualmente vêm sendo empregadas por marcas de moda rápida, para fisgar os consumidores e viciá-los.
Antes das principais regulamentações, os fabricantes de cigarros concentravam seus esforços de marketing em jovens adultos e incorporavam seus produtos na mídia, usando filmes e televisão para mostrar o ato de fumar como algo legal e sexy.
As empresas de tabaco também usaram preços baixos como uma tática de marketing voltada para consumidores jovens.
Basta lembrar Joe Camel, o desenho animado que se tornou uma figura atraente para jovens fumantes do sexo masculino. O personagem foi criado para construir lealdade entre os jovens, alimentando-se do desejo de se encaixar e ser popular, enquanto encobria os efeitos mortais do tabaco para a saúde.
As empresas de tabaco também usaram preços baixos como uma tática de marketing voltada para consumidores jovens. Em 1960, o custo médio de um maço de cigarros era de US$ 0,26 – o equivalente a US$ 1,49 atuais. Hoje, você pode encontrar itens na Shein a partir de US$ 1,50. Há vestidos por US$ 3, suéteres por US$ 5 e jeans por US$ 8.
Com novos produtos entrando no site diariamente – senão de hora em hora –, é quase impossível para os consumidores resistir a comprar as últimas tendências a preços baixos, apesar das crescentes informações sobre seu impacto destrutivo no meio ambiente.
ROUPAS DEVIAM VIR COM ETIQUETA DE ALERTA
Grandes restrições foram impostas à publicidade das empresas de cigarro nas últimas décadas, e a FDA (Food and Drug Administration, agência que autoriza a venda de alimentos e remédios nos EUA) agora exige declarações de advertência de saúde sobre produtos populares de tabaco.
A apresentação de informações sobre os riscos a longo prazo do tabagismo enfraqueceu a influência da indústria sobre os jovens adultos. Só depois que esses regulamentos foram aplicados a porcentagem de jovens fumantes nos EUA começou a cair de 68%, em 1965, para 9%, em 2017.
No ritmo atual, a indústria da moda está a caminho de consumir 26% do orçamento mundial de carbono até 2050.
É imperativo que nossa sociedade tenha aprendido a lição da eficácia da regulamentação governamental observando que aconteceu com a indústria do cigarro, e que apliquemos soluções semelhantes no campo do fast fashion – antes que seja tarde demais. No ritmo atual, a indústria da moda está a caminho de consumir 26% do orçamento mundial de carbono até 2050.
Embora a indústria da moda tenha começado a pressionar por uma regulamentação exigindo maior transparência dos varejistas por meio de divulgações ambientais, também precisamos expor com mais clareza as implicações da compra desses produtos para os consumidores.
Já é hora de as roupas de fast fashion começarem a vir com uma etiqueta contendo uma advertência, para que as gerações mais jovens entendam o quão prejudiciais esses produtos são para o planeta e para que possam fazer escolhas mais informadas sobre as roupas que compram.
No passado, a indústria tabagista causou sérios danos antes que o governo efetivamente interviesse para mitigar seu impacto. Agora, temos uma oportunidade de ouro para evitar cometer o mesmo erro com a moda. Qual caminho vamos escolher?