Como a Nestlé está inovando ao colocar o impacto como prioridade
A gigante de 150 anos está investindo para liderar a verdadeira inovação no mercado de café - e o Brasil está no centro das atenções
Não resta dúvida de que a verdadeira inovação, hoje, está na capacidade de acomodar o item impacto dentro da equação econômica de maneira eficaz e sem comprometer a qualidade dos produtos ou serviços. Dá trabalho e nem todas as empresas têm fôlego para transformar seus processos e investir verdadeiramente nisso, a menos que já nasçam partindo desta premissa (ou seria promessa?).
A jornada em busca deste tipo de inovação é o que me move como jornalista, e é emocionante encontrar uma boa história para contar neste imenso universo que é o ESG hoje, repleto de boas intenções e discursos e tão pouco investimento transformador.
O primeiro impacto ao conhecer a sede da Nestlé em Vevey, na Suíça (a convite da empresa, que pela primeira vez levou um grupo de jornalistas para conhecer um projeto in loco) foi, claro, a grandiosidade da estrutura naquela pequenina cidade, com três imensos prédios, que acomodam mais de três mil pessoas.
Mas rapidamente se percebe o (também imenso) esforço feito para reduzir o impacto do aparente “elefante”: transformações em anos recentes tiveram foco no uso eficientes da energia, indo desde as mais óbvias – como a eliminação de escadas rolantes – a um sofisticado sistema de refrigeração através do uso da água (do lago Léman) e de vidros fotocromáticos que auxiliam na manutenção da temperatura ambiente.
A Nestlé é uma imensa babel, abrigando pessoas do mundo inteiro, diversidade que se ouve nas muitas línguas faladas pelos espaços.
AGRICULTURA REGENERATIVA
Todas as grandes empresas como a Nestlé possuem imensos telhados de vidro quando o assunto é ESG. Mas faz parte do jogo compreender a complexidade das mudanças necessárias para se chegar a metas como a de se tornar carbono neutra até 2050.
Parece uma eternidade, mas não tanto para uma empresa presente em 186 países, com 354 fábricas (em 79 países) e duas mil marcas. Outra promessa é ter 100% das suas embalagens recicláveis ou reutilizáveis até 2025, utilizando apenas um terço de plástico virgem nos processos.
Hoje, a maior pegada de carbono da Nestlé está na agricultura – 70%, mais precisamente. E é na agricultura regenerativa que se encontra a maior aposta da empresa, que tem no café o seu mercado mais importante do ponto de vista global. Por isso mesmo, há especial interesse no futuro deste segmento e na produtividade das fazendas localizadas em países como Brasil, Vietnã, México, Colômbia, Costa do Marfim, Indonésia e Honduras.
Estes são mercados prioritários para a expansão de programas de regeneração e também voltados para melhorar a qualidade de vida das pessoas que trabalham em toda a cadeia do café – com foco em remuneração, direitos humanos, proteção infantil. Há planos de ampliar esses programas também na Índia, China, Tailândia, Filipinas, Rwanda, Uganda, Kenya, no Peru e na Nicarágua.
O mundo vem tomando mais e mais café – e em 2050 estará bebendo 50% mais do que hoje, segundo dados apresentados por Marcelo Burity, head global de desenvolvimento de café na divisão Nescafé.
Embora seja surpreendente o fato de que uma em cada sete xícaras de café tomadas ao redor do mundo é da marca Nescafé, não há tanto a comemorar quando as mudanças climáticas já estão afetando consideravelmente a produção deste café pelo mundo. Há urgência.
Fazendo esta conta, a Nestlé investe forte para ser parte integrante das mudanças que precisam ser feitas em fazendas e regiões produtoras de café: já há um intenso trabalho em andamento com cerca de 100 mil fazendeiros.
Porque não basta “exigir” certificações. É preciso, reconhecendo as dificuldades da redução de impacto, ser parte da solução. Até 2025, a empresa quer ter 100% do seu café certificado. E, até 2030, produzir 50% do café via métodos de agricultura regenerativa – o maior desafio de todos.
BRASIL, GIGANTE DO CAFÉ
Das 10 milhões de toneladas produzidas no mundo, o Brasil é responsável por cerca de 35%. Desta produção, 10% são comprados pela Nestlé. De toda a produção global, apenas13% é certificada, ou seja, o café é produzido de acordo com regras de fornecimento responsável (o “responsible sourcing“). Da produção certificada, 80% são adquiridos pela Nestlé.
No Brasil – e quem afirma isso com orgulho é a head de ESG para cafés e bebidas na Nestlé Brasil, Taissara Martins – 100% do café que vai para as fábricas da empresa é certificado.
É importante reconhecer que não existe bala de prata quando o assunto é a redução do impacto no planeta. No caso da produção de café, o caminho passa pela combinação da implementação de novos modelos de agricultura (com o uso de árvores em combinação com o café para ampliar a sombra e proteger o solo, o chamado cover cropping) com a busca pela redução da pegada de carbono através de outros múltiplos esforços. Que vêm sendo realizados desde 2011, quando teve início a jornada de sustentabilidade da empresa.
Neste cenário, vem o surpreendente segmento de café porcionado, que representa 21% do mercado total de café e é o de mais rápido crescimento globalmente, apesar do polêmico uso das cápsulas feitas de plástico ou alumínio. Com a marca Dolce Gusto, a Nestlé vende uma em cada quatro cápsulas consumidas no mundo todo e 29% das máquinas de café.
Mas a empresa entende que cápsulas recicláveis já não representam o futuro do segmento. Por isso, há exatos cinco anos seu Centro de Tecnologia e Sistemas em Orbe, bem pertinho de Vevey (um dos dois únicos centros de inovação para cafés da empresa e o único dedicado a cápsulas), iniciou uma longa jornada em busca do café perfeito.
PESQUISA & DESENVOLVIMENTO
O café perfeito é preparado em máquinas de alta tecnologia (feitas para durar 10 anos e fabricadas com 50% de plástico reciclável), a partir de cápsulas compostáveis. Este encontro entre tecnologia e sustentabilidade demandou esforços de um time de cerca de 40 pessoas ao longo de meia década.
O resultado é a Dolce Gusto Neo, a primeira máquina de café de altíssima tecnologia que funciona com cápsulas que se decompõem completamente na natureza num prazo de seis meses.
O maior desafio, claro, ficou por conta do material a ser usado na cápsula, que não poderia comprometer nem o frescor do produto nem o seu desempenho na xícara. Era preciso proteger o café da oxidação e, ao mesmo tempo, ser 100% compostável. A cada solução testada (e foram mais de 150 tipos de papel), era preciso garantir o padrão na extração da máquina.
Foram muitas idas e vindas, frustrações e resiliência na equipe liderada pelo holandês Peter Mul, o gigante adorável (ele tem cerca de dois metros de altura) que comanda a área de P&D para Nescafé Dolce Gusto. Imagine passar por tudo durante a pandemia, com limitações de fornecimento de matéria-prima, entre tantas outras.
Chegou-se finalmente a um papel (certificado FSC) revestido com um filme de biopolímero muito fino, que protege contra a oxidação e se decompõe integralmente. No topo, um filme de celulose (também 100% compostável) que permite a impressão de um código a ser lido pela máquina.
INOVAÇÃO BASEADA EM DADOS
Os muitos detalhes do lançamento já publicamos aqui, assim como fizeram outros veículos da imprensa. Em dezembro, a novidade chega às prateleiras brasileiras, turbinada por uma campanha publicitária criada pela Marcel (traduzida e adaptada). Haverá ações mais localizadas a serem desenvolvidas pela agência Soko.
O que importa agora é que, a partir deste primeiro lançamento global da Nestlé no Brasil, com produção
em toda essa experiência, foi ótimo constatar a presença de muitas mulheres na liderança da Nestlé.
exclusiva por aqui, a empresa vai analisar e testar resultados para, só então, decidir os próximos passos. Além de coletar os dados de uso dos consumidores que comprarão a novidade a partir do mês que vem, dados também virão de um grupo de 400 pessoas que receberam primeiro o produto para testar durante um mês.
É o caminho da verdadeira inovação: resiliente e cuidadoso. Dando, eventualmente, alguns passos para trás, para dar muitos para a frente. Como diz Tiago Buischi, gerente executivo de marketing de Nescafé Dolce Gusto no Brasil, foram “colocadas as sandálias da humildade numa grande companhia”.
Não posso deixar de registrar que, em toda essa experiência, foi ótimo constatar a presença de muitas mulheres na liderança da Nestlé, entre elas a incrível Julia Lauricella, a alemã que é diretora do Centro de Tecnologia de Sistemas em Orbe; Claudia Afonso, a portuguesa que é porta-voz da Nestlé na Suíça; a brasileira Taissara Martins, head de ESG para cafés e bebidas na Nestlé Brasil; e Celine Colin, a francesa head de marketing de Nescafé Dolce Gusto.
A repórter viajou para a Suíça a convite da Nestlé.