Cientistas finalmente conseguem gerar energia com fusão nuclear

É um marco histórico, mas ainda é apenas um pequeno passo na busca por energia livre de carbono

Crédito: Istock

Alex Pasternack 4 minutos de leitura

O Departamento de Energia dos EUA anunciou que os cientistas do Laboratório Nacional Lawrence Livermore, na Califórnia, conseguiram pela primeira vez realizar um experimento de fusão nuclear em que a energia produzida superou a energia consumida pela reação – um grande avanço na longa busca por energia potencialmente ilimitada livre de carbono.

Desde a década de 1940, os cientistas pesquisam maneiras de aproveitar a reação que alimenta o Sol na esperança de gerar uma fonte de energia mais limpa do que os combustíveis fósseis e a fissão nuclear. As reações de fusão, que resultam da fusão de núcleos, geram uma imensa quantidade de energia, sem emitir carbono nem produzir lixo radioativo.

Apesar de experimentos passados terem nos dado a bomba de hidrogênio e as armas nucleares mais poderosas já construídas, os usos para o dia a dia nunca se materializaram. Agora que alcançamos esse marco tão aguardado, a energia de fusão parece mais próxima do nunca. Mas isso não significa que vamos ter acesso a ela tão cedo.

COMO ATINGIR O GANHO LÍQUIDO DE ENERGIA

Para atingir a ignição por fusão, um experimento de US$ 3,5 bilhões do Laboratório Livermore em uma instalação construída especificamente para esse objetivo, a National Ignition Facility (NIF), usou um processo chamado fusão por confinamento inercial, que envolve disparar centenas de feixes de laser de alta potência em uma cápsula esférica de diamante polido contendo uma pequena pastilha de combustível deutério-trítio.

Os feixes de laser fazem com que a cápsula imploda, comprimindo o combustível a pressões maiores que a do Sol para criar um plasma de hidrogênio e – esperam os cientistas – forçar os núcleos dos átomos a se fundirem, liberando uma tremenda quantidade de energia.

A ignição que a NIF produziu em um experimento na semana passada gerou 3,15 megajoules de energia, um ganho de aproximadamente 54% sobre os cerca de 2 megajoules que a reação consumiu dos lasers, sugere a análise do laboratório.

O diretor do Livermore, Kim Budil, disse que a busca pela ignição por fusão no laboratório foi “um dos desafios científicos mais significativos já enfrentados pela humanidade” e que os pesquisadores “deram os primeiros passos experimentais em direção a uma fonte de energia limpa que poderia revolucionar o mundo."

Crédito: Laboratório Nacional Lawrence Livermore

QUAIS SÃO OS PRÓXIMOS PASSOS DA FUSÃO?

Para se tornar uma fonte de energia comercial viável, os reatores de fusão precisarão ser capazes de extrair uma quantidade significativa de energia líquida da reação. Muitos cientistas acreditam que as usinas de fusão ainda levarão décadas até que se tornem uma realidade e será necessário muito mais investimento.

Pelo menos 33 empresas diferentes estão estudando a fusão nuclear, de acordo com a Fusion Industry Association, uma associação comercial independente sem fins lucrativos. De junho de 2021 a junho de 2022, elas levantaram US$ 2,83 bilhões, elevando o investimento total do setor privado para quase US$ 4,9 bilhões.

Pela primeira vez, o mercado de títulos verdes da Europa está disposto a financiar projetos de energia nuclear.

O governo norte-americano também tem ajudado. Em julho, o Departamento de Energia dos EUA anunciou a destinação de valores entre US$ 50 mil e US$ 500 mil a 10 empresas de fusão que trabalham em projetos com universidades e laboratórios do país.

David Kirtley, CEO da Helion Energy, que pretende produzir energia líquida a partir de fusão em 2024, espera que os resultados da NIF impulsionem toda a indústria. “Embora a NIF não esteja focada na produção de energia comercial, sua pesquisa é útil para empresas do setor como a Helion, já que elimina os riscos e estuda a física por trás do processo de fusão”, disse ele.

A energia nuclear convencional, gerada por fissão em vez de fusão, também parece mais atraente. Com os preços de energia em alta, junto com as demandas por independência energética e uma necessidade urgente de energia livre de carbono, vários governos estão aumentando os investimentos ou revisitando seus antigos projetos de energia nuclear, incluindo Japão, Coreia do Sul, Alemanha e o estado da Califórnia.

Pela primeira vez, o mercado de títulos verdes da Europa está disposto a financiar projetos de energia nuclear. Nos EUA, a Lei de Redução da Inflação destinará milhões a novos projetos, incluindo reatores modulares, incentivos para produção nuclear e mineração doméstica de urânio. E, após anos de financiamento mínimo, US$ 280 milhões serão destinados à pesquisa sobre energia de fusão.

Tendo em vista os muitos marcos que ainda terão de ser alcançados, a indústria precisará de todo o investimento que conseguir.


SOBRE O AUTOR

Alex Pasternack é jornalista e escreve sobre urbanismo, recursos naturais, arquitetura e transportes. saiba mais