Por que a decisão de tirar a sigla HBO do streaming é boa para a marca

Adotar o nome Max ajuda a proteger a marca premium HBO

Créditos: HBO Max/ Vladimir Sukhachev/ iStock

James Surowiecki 4 minutos de leitura

Quando a Warner Bros. Discovery anunciou que seu serviço de streaming HBO Max seria renomeado e que passaria a se chamar simplesmente Max, muitos fãs ficaram chocados – como era de se esperar.

O escritor de romances policiais Don Winslow expressou bem o sentimento coletivo quando chamou a mudança de “uma das formas mais estúpidas de acabar com uma marca em toda a história do entretenimento”.

A reação do público foi compreensível. A HBO – lar de “Família Soprano”, “The Wire”, “Game of Thrones”, “Veep” e de muitos outros títulos – tem a marca mais respeitada da televisão e uma das mais respeitadas na história do entretenimento. E, longe de demonstrar sinais de queda, tem lançado séries aclamadas pela audiência e pela crítica, como “The White Lotus”, “The Last of Us” e “Succession”.

Portanto, abrir mão da sigla de seu serviço de streaming e trocá-la por uma palavra tão genérica como “Max” (que, se tiver alguma conotação, evoca os filmes cafonas e leves que o canal Cinemax costumava colocar no ar tarde da noite) parece até um ato de autossabotagem.

Família Soprano (Crédito: HBO)

Só que, ao contrário do que possa parecer, a mudança realmente faz sentido. Se a Warner Bros. Discovery estivesse planejando manter a HBO Max praticamente como já é – um serviço de streaming que combina um catálogo extraordinário de conteúdo de TV  com uma biblioteca de filmes online completa e de alta qualidade  – então, de fato, seria melhor manter também o nome.

Só que essa não é a estratégia da empresa. Em vez de continuar a administrar o serviço como, digamos, uma espécie de marca de luxo do streaming, a Warner Bros. Discovery pretende rivalizar diretamente com a Netflix, adicionando ao catálogo muitos reality-shows e programas de não-ficção dos canais da Discovery (que incluem Lifetime, A&E, The Food Network, TLC, entre outros).

The Last of Us (Crédito: HBO)

A ideia é que o novo Max seja menos um serviço de streaming premium e mais um atacadão de programas, onde os assinantes poderão continuar assistindo a séries como “Família Soprano” e filmes do Studio Ghibli, mas também terão acesso a episódios de “90 Dias Para Casar” e “Do Velho ao Novo: Bem-vindo ao Lar”. 

Aparentemente, a HBO Max está indo muito bem, obrigada. Somadas, a HBO e a HBO Max têm mais de 70 milhões de assinantes em todo o mundo, e a própria HBO continua extremamente influente entre os formadores de opinião.

Mas a Warner claramente acha que a estratégia atual tem um teto. Afinal, de acordo com a Nielsen, a HBO Max responde por apenas 1,3% de toda a televisão assistida nos EUA – menos de um quinto da Netflix e menos da metade da Amazon Prime.

Em parte, isso pode estar acontecendo porque, embora a HBO Max tenha um catálogo de conteúdo incrivelmente rico, a maioria dos usuários mal o acessa. Segundo a Warner Bros. Discovery, 75% da exibição do HBO Max vem de cliques na tela inicial do site. 

A empresa poderia, é claro, expandir seu serviço e manter o nome HBO associado a ele, esperando aquilo que os profissionais de marketing chamam de “efeito halo” – quando algum fator interfere na opinião das pessoas sobre uma marca.

Succession (Crédito: HBO)

Mas há boas razões pelas quais “HBO” não é o nome ideal para um serviço de streaming mais voltado para o mercado de massa. Embora a marca obviamente, e com razão, atraia muitos telespectadores, pode ser que outros tentem evitá-la, justamente por causa da sua associação com conteúdo mais cult, em vez de programas fáceis de assistir. 

Além disso, a reputação da HBO com serviços de streaming também não é boa, por conta dos frequentes problemas técnicos que atormentaram o HBOGo, o precursor da HBO Max.

A mudança, porém, pode ser entendida principalmente como uma forma de preservar o nome da HBO. Se o serviço continuar com o mesmo nome depois que boa parte da programação for composta por reality shows, o efeito disso para a marca provavelmente será negativo. Em lugar de elevar a programação da Discovery +, a mistura poderia acabar diluindo a marca HBO.

Nesse sentido, a consequência mais importante de renomear o serviço, paradoxalmente, pode ser proteger a marca HBO, de forma semelhante à Toyota reservar a marca Lexus para seus carros de luxo.

The White Lotus (Crédito: HBO)

A HBO – ativo mais valioso da Warner Bros. Discovery – não vai desaparecer. A marca ainda estará presente em sistemas de TV a cabo e continuará sendo um dos hubs do serviço de streaming.

Dessa forma, a Warner Bros. Discovery espera atrair novos assinantes para a Max, prometendo que vão poder assistir aos seus programas populares de crime e de comida, mas terão também a chance de mergulhar pela primeira vez nas sagas dos Sopranos ou de “Succession”.

Este é, com certeza, um movimento impulsionado pelo comércio, não pela arte. Isso confirma o fato de que o streaming hoje está praticamente tomado por conteúdos de televisão, e não por filmes, bem como o domínio dos reality shows na programação. 

Nesse sentido, o caráter genérico do nome Max parece ser uma metáfora adequada para o atual cenário de streaming, que tem tudo a ver com quantidade em detrimento da qualidade.

Então, sim, se você é fã de conteúdo de alta qualidade, chamar o novo serviço de Max é uma mudança meio deprimente. Mas, ao menos do ponto de vista comercial, esse caminho tem uma boa chance de ser o certo.


SOBRE O AUTOR

James Surowiecki é jornalista e escritor, autor de "A Sabedoria das Multidões". saiba mais