O futuro dos games é UGC


Paulo Aguiar 4 minutos de leitura

Este ano tive a oportunidade de participar do SXSW, com uma agenda focada em games e metaverso e, logo na sequência, conhecer a Game Developers Conference (GDC), em San Francisco.

Lá, pude acompanhar os lançamentos da indústria e o mais importante: conversar com grandes nomes e ver de perto reações e questionamentos de desenvolvedores e usuários sobre as novidades, tentando responder ao objetivo desse artigo (e à pergunta de milhões): qual o futuro dos games?

Sem querer pagar de guru aqui, gostaria de levantar o óbvio quando analisamos o sucesso de Roblox, Minecraft e Fortnite – games que juntos somam mais de 500 milhões de usuários ativos mensalmente, além dos bilhões de downloads e a gratuidade. Os três têm um ponto em comum responsável pelo constante crescimento de players: a possibilidade de o jogador criar o seu próprio jogo.

O Roblox é precursor desta visão. O "jogo de criar jogo" traz números de audiência absurdos, como podemos ver em um dos seus games de maior sucesso, o Adopt Me, que totaliza 32 bilhões de gameplays. A critério de comparação aleatória, o vídeo mais visto da história do Youtube tem 12 bilhões de views.

Mais impressionante ainda é a declaração do CEO da plataforma (em janeiro de 2023), afirmando que existem mais de 70 experiências criadas por usuários que ultrapassaram a marca de um bilhão de gameplays. É isso mesmo: jogadores estão criando experiências que alcançam bilhões de engajamentos, superando a audiência de grandes títulos feitos por grandes desenvolvedores.

Crédito: Roblox Corporation

A Epic Games recentemente fez um anúncio que potencializa  a tendência de conteúdo gerado pelo usuário (UGC, na sigla em inglês). Além de lançar o UEFN, nova ferramenta de criação que expande muito as possibilidades de desenvolvimento, eles anunciaram um modelo de revenue share sem precedentes na indústria: uma divisão de 40% dos lucros líquidos do Fortnite com os criadores de jogos, baseado no engajamento dos games.

O impacto que esse anúncio traz para a comunidade criativa da indústria e até mesmo para os estúdios/ desenvolvedores é gigantesco. Preparem-se para uma nova safra de jovens milionários "criadores independentes" de games.

O movimento da Epic, em um primeiro momento, parece ousado demais. Mas, se formos levar em consideração o crescimento de experiências sendo lançadas no game e o esforço que os criadores fazem nas redes para levar audiência aos seus jogos, os 40% destinados à comunidade podem ser vistos também como um investimento em growth (crescimento).

Assim como o que fez o YouTube foram os youtubers, é preciso ampliar o número de grandes criadores na plataforma para que ela se consolide. O comparativo com o YouTube é cada vez mais válido, já que a usabilidade do modo criativo do Fortnite se assemelha à experiência de escolher um bom vídeo.

Crédito: Epic Games

A área de escolhas de games do Fornite é muito semelhante à home do YouTube, com categorias, algoritmo priorizando engajamento e a batalha de atenção por meio de thumbs e contagem de views/ jogadores.

Todos esses movimentos, big numbers e comportamentos nos fazem acreditar que o futuro dos games está não apenas no consumo e engajamento, mas no potencial criativo da comunidade. É uma questão de tempo para que jogos feitos por usuários ganhem tanta atenção quanto os de renomados publishers, para que disputem prêmios, carteira e, principalmente, tempo de sessão do grande público.

Estamos falando da creators economy em sua forma mais interativa. Plataformas como Roblox, Fornite e Minecraft representam um futuro incrível não só para os criadores de jogos, mas também para os influenciadores/ creators que podem desenvolver sua própria experiência, sem precisar de um investimento milionário ou uma grande empresa.

Por aqui, seguimos não só acompanhando mas também nos unindo a essa corrente por meio da Surprise, um coletivo criativo de Fortnite com mais de 12  criadores. No último mês, lançamos três jogos, todos feitos com a comunidade, para comunidade.

O resultado? Mais de três milhões de gameplays e uma média de permanência de 40 minutos na experiência – tudo isso sem nenhum investimento em mídia.

Crédito: Mojang Studios

Pensando com uma cabeça de marketing, em que plataforma seria possível reter a atenção de três milhões de pessoas por 40 minutos (e não segundos)? Quanto vale esse hiperengajamento?

Agora, imagine se as marcas olhassem para esse universo com tanta empolgação quanto abraçam o "metaverso" web 3, que extraiu alguns bilhões de dólares de marqueteiros ansiosos? Acredito que os números de engajamento seriam maiores.

Por fim, um conselho aos publicitários e entusiastas de comunicação que pretendem se aventurar nos UGC games, especialmente àqueles que buscam resultados significativos muito além do "mapa criativo da marca X": o criador de jogos é diferente. É preciso entender do game, da comunidade e de como inserir uma marca de forma relevante.

Assim como o marketing se adaptou aos influenciadores, será necessário se adaptar aos games. A boa notícia é que a fórmula é a mesma: cocriação, liberdade e respeito com a comunidade que construiu todo esse caminho até aqui!

GLHF.


SOBRE O AUTOR

Chief Creative Officer da 3C Gaming, Paulo Aguiar tem 15 anos de experiência liderando times e projetos criativos, muitos deles em mai... saiba mais