Kung-Fu live streamer e a criatividade do e-commerce chinês
“A ideia é mais importante que a tecnologia”, diz Adams Fan, CCO da F5 Xangai, especialista em varejo eletrônico
O e-commerce chinês dita tendências para negócios pelo mundo. Com 780 milhões de consumidores ativos, o varejo online da China é responsável por metade de todas as transações do setor no mundo. O que há por detrás desses números? Criatividade, flexibilidade e adaptabilidade. É o que afirma Adams Fan, Chief Creative Officer (CCO) da agência F5.
Fan falou com a Fast Company Brasil pouco antes de sua apresentação no Festival Cannes Lions 2023, onde fez apresentação sobre o lado criativo da revolução do e-commerce chinês. Ele trata do assunto com a propriedade de quem lidera campanhas para as gigantes de tecnologia Baidu, Alibaba e Tencent. De fato, a F5 é a única agência do país a trabalhar em parceria com as chamadas BAT.
Os trabalhos renderam à agência algumas indicações e premiações no Cannes Lions em anos passados. Mas eles só funcionam porque acompanham a velocidade de mudanças do e-commerce no país. Antes de falar de tecnologia, o executivo comenta sobre a filosofia que move o mercado digital chinês: a do copo meio vazio.
Não se trata de uma visão pessimista do mundo, mas da observação que há sempre espaço para acrescentar algo novo e “descartar o antigo”. “Não deixe o conhecimento antigo dominar a sua cabeça. O foco não é apenas em usar tecnologias novas, mas em jogar as concepções tradicionais e antigas no lixo sempre que for necessário”, disse Fan.
A visão “sem vícios” para acontecimentos novos é o que move tendências como o live commerce. O formato de um influenciador apresentando produtos ao vivo para a venda numa mesma plataforma já movimenta US$ 700 bilhões na China. Em 2022, o influenciador chinês, Li Jiaqi, vendeu US$ 2,9 bilhões em produto numa única live de oito horas.
KUNG-FU LIVE STREAMER
Apenas a audiência do influenciador não é o bastante para fazer uma live de sucesso. A onda do live streaming precisa de uma boa dose de criatividade para chamar a atenção de um consumidor entre um canal e outro.
Em sua apresentação, Fan falou sobre o fenômeno do Kung-Fu live streaming. “O live streaming é uma tendência que os criativos têm que ter no radar para levar o e-commerce a um novo patamar”, afirmou.
Com criatividade, as campanhas de e-commerce podem levar a verdadeiras mudanças de hábitos dos usuários. Em 2016, a Alipay criou a Ant Forest, um programa de pontos virtual que premia o estilo de vida “carbono negativo”.
Um mini aplicativo dentro do Alipay permitiu que os consumidores plantassem “árvores virtuais”, que crescem com cada atitude ou compra “verde”. Quando a árvore virtual floresce completamente, a Ant (holding dona do Alibaba) planta uma árvore de verdade. Em cinco anos, o projeto já promoveu o plantio de mais de 330 milhões de mudas em florestas chinesas.
No ano passado, a F5 se uniu à Ant Forest para criar um sistema que beneficia os fãs de comida apimentada. O cartão de fidelidade dos pratos apimentados de uma rede chinesa era revertido em plantio de pimenteiros.
A tecnologia, neste caso, foi usada para engajar as pessoas. “Só uma mensagem ou só uma tecnologia não faz mais sentido. É preciso maravilhar as pessoas com o uso combinado de comunicação, criatividade e tecnologia.”
EXPERIÊNCIA EM PRIMEIRO, SEGUNDO E TERCEIRO LUGAR
Para o varejo online, outra filosofia precisa estar no centro das decisões: a experiência do usuário é rainha. Campanhas precisam ser coordenadas com os esforços das plataformas para entregar tudo com excelência, criando um ciclo positivo em todos os pontos da jornada.
Fan brinca que não adianta o produto estar bem posicionado em um marketplace, por exemplo, se a entrega não for rápida ou se chegar o produto errado para o comprador.
Só uma mensagem ou só uma tecnologia não faz mais sentido. É preciso maravilhar as pessoas com o uso combinado de comunicação, criatividade e tecnologia.
As apostas para o futuro do e-commerce – como uso de veículos autônomos para delivery – vêm todas para tornar a experiência mais poderosa. O executivo da F5, no entanto, aposta em uma tendência para dominar a próxima era do e-commerce: a IA generativa.
O executivo lembra que, no mundo do e-commerce, a inteligência artificial já é commodity, usada em sistemas de recomendação e de análise de dados. O que a IA generativa vai fazer é trazer tal capacidade para dentro das agências e para a comunicação das marcas.
A tecnologia tem o potencial de levar as criações humanas para além da imaginação. “A IA generativa pode tornar qualquer pessoa um diretor de criação. Mas existem bons diretores e maus diretores”, lembrou Fan.
Em 2020, por exemplo, a F5 recriou novas sinfonias de Mozart por meio de IA generativa para uma campanha da Pfizer. A tecnologia foi usada para mostrar o que o compositor poderia ter criado caso tivesse vivido até os 80 anos.
Por mais que não tenha sido criada para um e-commerce, a campanha demonstrou a principal filosofia que leva a inovação ao mercado: a ideia é mais importante que a tecnologia.
Confira cobertura Cannes Lions 2023!