Futuros, no plural
Sendo esta a minha primeira coluna para a Fast Company Brasil, talvez deva – antes de qualquer coisa – me apresentar, como mandam os manuais de etiqueta. Meu nome é Tiago, tenho 43 anos e (quando falo de trabalho) as pessoas associam ao meu nome algumas palavrinhas. A mais recorrente, sem dúvida, é o termo ‘futuros’. Sim, ‘futuros’. No plural.
A escolha de ‘futuros’ não é por acaso. E quem nos explica isso com maestria é a bielorrussa Lera Boroditsky, cientista cognitiva que se aprofundou nas nuances do relativismo linguístico. Ou nas implicações da linguagem para o nosso modo de pensar. Porque, sim: o jeito como você fala muda o jeito como você pensa. A intencionalidade na escolha do vocabulário é, também, um GPS para os caminhos da sua neuroplasticidade e da sua estrutura psíquica.
Escolher um único futuro e ignorar o outro – e todos os demais tons de cinza – é uma miopia.
Portanto, quando escolho ‘futuro’, no singular, indico a mim mesmo um jeito de viver mais determinístico, mais fatalístico. É como se houvesse apenas uma linha (em vez de um cone) de tempo, com um futuro pré-determinado. E, se ele já está pré-determinado, onde está o livre arbítrio e o protagonismo das nossas ações? Para onde vão todas as decisões que tomamos no dia a dia?
‘Futuro’, no singular, ignora completamente a ideia de coexistência e de multidimensionalidade. Nos leva para a perigosa polarização de certo versus errado, caindo no erro lógico do terceiro excluído. Quando me perguntam se o futuro da alimentação será orgânico ou sintético, sempre respondo: "os dois, e outros infinitos tons de cinza".
Porque, obviamente: teremos toda uma nova geração de nutrição advinda dos laboratórios – fenômeno este nunca antes testemunhado pela humanidade. Mas também teremos novas ferramentas para promover ainda mais a agricultura de subsistência, cultivada bem próxima de quem a consome.
Escolher um único futuro e ignorar o outro – e todos os demais tons de cinza – é uma miopia. (Fica aqui um asterisco: esse é um dos perigos de boa parte dos reports de tendências. Falaremos disso em outra coluna.)
quanto mais futuros são acolhidos, mais madura e consciente fica a conversa.
‘Futuro’, no singular, também nos joga para um passado que não entendia a importância da diversidade e inclusão para os ambientes de inovação. Se estamos pensando num único futuro, várias perguntas se tornam necessárias. Quem decidiu esse futuro? Essa pessoa pertence a qual gênero, etnia, nacionalidade? A quem interessa esse futuro? Quais vieses inconscientes foram ignorados ao criá-lo?
Pelos meus estudos, geralmente o que acontece nesses ambientes (onde se pensa um único futuro) é:
1. Um guru comunica a sua narrativa e coloniza outras mentes;
2. Uma vez colonizadas, elas acreditam nessa tendência e trabalham para que este futuro se torne realidade;
3. A intenção faz com que este futuro, (que antes era apenas uma hipótese) de fato aconteça;
4. Isso valida a autoridade do guru e conforta as mentes colonizadas, dando recompensas financeiras e emocionais a todos os envolvidos – e estimulando que este loop não seja quebrado;
5. Raras exceções percebem que esta é, na maioria das vezes, apenas uma profecia que se autorrealiza.
Portanto, quanto mais futuros são acolhidos, mais madura e consciente fica a conversa. Ponto importante a ser destacado desde já, nesta primeira coluna, com todas as letras, para que não sejamos vítimas de um paradoxo.
Afinal, este espaço privilegiado me dará o direito de compartilhar inúmeras perspectivas futuras. Mas ele não pode, em hipótese alguma, criar a estrutura que critiquei no parágrafo anterior.
Nunca se esqueça: o que eu disser aqui é apenas uma visão dentre as múltiplas visões possíveis. Ficarei feliz em dividir a minha com você. Mas você se importa de dividir a sua comigo também?