4 ideias “quarentonas” que vão ajudar a publicidade a encarar seu futuro

A indústria publicitária precisa resgatar as ideias de David Ogilvy para prosperar em um futuro incerto

Crédito: Fast Company Brasil

Jeff Beer 6 minutos de leitura

A publicidade sempre foi conhecida por se deixar levar pelas novidades. QR code! NFTs! Celebridades como diretores de criação! Conteúdos gerado pelo usuário! E agora: inteligência artificial! Sempre que surge uma tendência na cultura e na comunicação, as marcas e as agências de publicidade vão buscar uma forma de explorá-la.

Há 40 anos, quando o lendário publicitário David Ogilvy lançou seu livro “Ogilvy on Advertising” (Ogilvy sobre Publicidade), essas tendências – em sua maioria passageiras – ainda não existiam.

Ele é considerado um dos “pais” da publicidade moderna, tendo transformado sua agência, Ogilvy & Mather, em uma gigante global ao longo do século 20. Mas agora, como grande parte da indústria, ela foi absorvida por uma holding e se tornou uma submarca em um mar de tantas outras que procuram se diferenciar.

Para alguns, seu livro foi um marco na busca por reafirmar valores fundamentais em tempos de mudança. A Agência Review afirmou em 2012 que “em 1983, a revolução criativa havia se espalhado pelos Estados Unidos. Os longos textos de Ogilvy, suas imagens icônicas e apresentações fundamentadas eram, de certa forma, relíquias de uma outra era. ‘Ogilvy on Advertising’ foi uma tentativa de reposicionar sua agência nesse admirável mundo novo”.

Em 2023, a indústria publicitária se vê constantemente

Ao observar o Festival Cannes Lions é impossível não notar como alguns dos princípios fundamentais de Ogilvy continuam vivos.

forçada a lidar com um conjunto em constante evolução de ferramentas de comunicação e com a forma como as pessoas as utilizam. Já estamos no final da segunda década em que ela busca reposicionar seu mercado de US$ 73 bilhões nesse novo mundo. Um mundo onde, em um bom dia, uma gigante da tecnologia centrada em IA pode ver seu valor de mercado aumentar tanto quanto o valor do mercado publicitário como um todo.

A indústria da publicidade não é mais a mesma de 1983, tendo sido relegada ao segundo plano pelo avanço das empresas de tecnologia. Mas, ao observar o Festival Cannes Lions – que celebra as melhores campanhas do ano – é impossível não notar como alguns dos princípios fundamentais de Ogilvy continuam vivos. Essas ideias ainda podem servir como guias para aproveitar ao máximo qualquer tendência ou nova tecnologia.

Seus ensinamentos não podem e não devem ser esquecidos. Por isso, selecionei quatro das minhas citações favoritas de Ogilvy e reuni algumas das melhores campanhas do último ano que as incorporam. Esta lista está longe de ser completa, mas mostra que é possível encontrar lições valiosas no passado.

Crédito: Getty Images/ Fast Company

“Se estiver tentando persuadir as pessoas a fazer alguma coisa, ou a comprar algo, você deve usar a linguagem delas, que elas usam todos os dias, a linguagem na qual elas pensam.”

Quando falamos sobre linguagem, também estamos falando sobre linguagem cultural. Mas, com a mídia cada vez mais fragmentada, as marcas começaram a perder sua capacidade de se conectar com a linguagem cultural de seu público. É por isso que sempre admirei marcas que conseguem arrancar um sorriso inesperado com comportamentos esperados.

Um grande exemplo é a campanha premiada em Cannes do aplicativo de delivery mais popular da Argentina, Pedidos. Criada pela agência Gut Buenos Aires, a ação enviou notificações de entrega para seis milhões de clientes, que, no primeiro momento, ficaram confusos. Até que descobriram que não era um erro, mas sim um rastreador que acompanhava a chegada do troféu da Copa do Mundo. A marca aproveitou a linguagem cultural de um momento histórico, usando o próprio produto.

“Quando as pessoas leem seu texto, elas estão sozinhas. Finja que está escrevendo uma carta para cada uma delas, em nome do seu cliente. De um ser humano para outro, usando a segunda pessoa do singular.”

Isso me fez pensar no curta-metragem “Toxic Influence”de 2022, que faz parte do posicionamento pela "Real Beleza"da Dove. No ano passado, a marca focou na humanidade compartilhada entre mães e filhas, contando  histórias de pessoas reais.

A campanha criou deepfakes de cada mãe, oferecendo conselhos terríveis sobre saúde e beleza que suas filhas poderiam ouvir de influenciadores na internet. Todas ficaram naturalmente assustadas. O filme abordou diretamente algumas das maiores preocupações que a maioria dos pais têm em relação aos potenciais efeitos prejudiciais das redes sociais sobre seus filhos.

No início deste ano, Dove continuou a explorar o tema com a campanha vencedora do Cannes Lions chamada “#TurnYourBack”. A ação incentivava as pessoas a virar as costas para o filtro Bold Glamour, do TikTok (que se propõe a fazer uma espécie de “harmonização facial”) e para os padrões irreais de beleza que o app incentiva. A marca continua a usar sua voz para apoiar as preocupações dos pais e usuários de redes sociais sobre essas questões.

“Faça do produto o herói. Não existem produtos chatos, apenas redatores chatos.”

Um dos melhores exemplos disso foi o surpreendente comercial da The Farmer’s Dog, no intervalo do Super Bowl deste ano. A marca de ração para cães queria transmitir a ideia de que uma alimentação melhor poderia significar uma vida mais longa para o seu melhor amigo canino.

Isso poderia ter sido feito de forma simples e desinteressante, mas em vez disso, a empresa decidiu contar a história de vida de um cachorro sob a perspectiva da dona e do filhote. O curta arrancou lágrimas do público.

“Grandes ideias surgem do inconsciente. Isso se aplica nas artes, na ciência e na publicidade. No entanto, é necessário que o seu inconsciente esteja bem-informado, caso contrário, sua ideia será irrelevante. Alimente a sua mente com informações e, depois, abandone o seu pensamento racional.”

Um exemplo é a parceria entre o McDonald’s e a marca de streetwear Cactus Plant Flea Market para o lançamento de uma versão adulta do McLanche Feliz, em setembro do ano passado.

Todo o projeto, criado com a agência Wieden+Kennedy, surgiu a partir de um tuíte de um cliente que falava sobre como nunca sabemos quando será a última vez que comeremos um McLanche Feliz. Isso fez com que a empresa realizasse uma pesquisa aprofundada sobre como os consumidores se sentem em relação à nostalgia e como a marca se encaixa em suas vidas.

Com base nas lições aprendidas com o sucesso da campanha “Famous Orders”, que contou com a participação de celebridades como Travis Scott e BTS, o McDonald's percebeu o poder de utilizar seu lugar na cultura para promover itens essenciais do menu. A parceria com a Cactus Plant Flea Market foi um sucesso estrondoso, com 50% dos brindes colecionáveis disponíveis vendidos em apenas quatro dias.

Essa colaboração também fez com que #McDonalds entrasse para a lista de hashtags em alta do TikTok e, mais importante, estabeleceu um recorde semanal de transações digitais nos restaurantes da rede nos Estados Unidos.

Isso ajudou a empresa a alcançar nove trimestres consecutivos de aumento nas vendas nas mesmas lojas, com um crescimento de mais de 10% nas vendas nos EUA ao longo de 2022.

Sem dúvida, Ogilvy aprovaria.


SOBRE O AUTOR

Jeff Beer cobre publicidade, marketing e criatividade para a Fast Company. saiba mais