Como a letra X virou um dos símbolos mais misteriosos de todos os tempos

As idas e vindas da letra mais versátil e cativante do alfabeto

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Elissaveta M. Brandon 4 minutos de leitura

Finalmente, Elon Musk conseguiu o que queria. Depois de várias tentativas, ele se apoderou oficialmente da letra X. Sua obsessão por ela remonta à virada do século, quando tentou batizar sua segunda empresa de X.com. Ela acabou ficando conhecida como PayPal e, mais tarde, Musk foi demitido da empresa.

Pouco tempo depois, ele fundou a SpaceX, relegando a letra preferida a um mero sufixo. Em 2015, lançou um Tesla SUV chamado Model X. Nem mesmo o filho caçula escapou do entusiasmo excêntrico do pai. O bebê se chama X Æ A-12 - ou "X", seu apelido para facilitar. 

Acontece que essa obsessão de Musk marca apenas o capítulo mais recente na história fascinante da letra X – um símbolo gráfico que, ao longo de sua existência insondavelmente longa, acabou se colando a diversos significados e se tornou o mais versátil e mais cativante da civilização humana.

Ilustração: Daniel Salo para Fast Company

CONTEMPORÂNEO E MILENAR

O X é a marca mais forte que um indivíduo pode deixar no mundo. Antes de qualquer sistema de escrita padrão ser inventado, o X aparecia como uma marca nos desenhos das cavernas, junto com o zero e uma linha em zigue-zague.

O X que conhecemos hoje – duas linhas diagonais que se cruzam no meio – apareceu pela primeira vez nos escritos dos romanos, mas não foi inventado por eles. Suas origens provavelmente remontam aos fenícios, cujo sistema de escrita surgiu por volta de 1050 aC.

Eles tinham uma letra chamada samekh, que se traduzia em algo como “pilar” ou, literalmente, “um peixe”. A letra samekh consistia em uma linha vertical cruzada por três linhas horizontais – parecido  com um esqueleto de peixe.

Ilustração: Fast Company

Nos séculos seguintes, o sistema de escrita fenício se espalhou pelo Mediterrâneo e o samekh foi se transformando. Os gregos o pegaram emprestado dos fenícios e os romanos o adaptaram dos gregos.

Mas é impossível compreender a história do X sem olhar para o papel que ele desempenhou na álgebra. Os babilônios tinham um sistema numérico avançado, os persas tinham imenso conhecimento em astronomia e os gregos dominavam a geometria. Só que nenhum deles jamais usou a letra X.

Foi somente no século 17 que ela entrou na imagem algébrica, introduzida por ninguém mais, ninguém menos do que o filósofo e matemático francês René Descartes.

Ilustração: Fast Company

“Ele olhou para o alfabeto e pensou: e se pegássemos essas letras do final, já que elas, por algum motivo, parecem ser as menos usadas?”, conta Johanna Drucker, professora de estudos bibliográficos na Universidade da Califórnis e autora do livro "Inventing the Alphabet" (Inventando o Alfabeto). E assim nasceu o plano coordenado bidimensional, formado pela interseção dos eixos x e y.

O X acabou se tornando a variável substituta para um valor desconhecido. Em outras palavras, o X é um mistério. “Se ele pode representar qualquer coisa, então o que é de fato?” Drucker questiona, observando que esse é o tipo de enigma fascinante que atrai garotos de 13 anos. E, aparentemente, bilionários de 52 anos.

UMA GERAÇÃO DE MARCAS X

Hoje, o significado da letra X tem tantas camadas quanto a sua história. Pode ser um sinal de negação que sela a censura a filmes pornográficos ou violentos. Também pode ser uma abreviação de “extremo”, que começou a ser usada na área dos esportes (com os X Games) e depois tomou a indústria de jogos. E, claro, há a conexão com Hollywood (como nos X-Men).

O X acabou se tornando a variável substituta para um valor desconhecido. Em outras palavras, o X é um mistério.

Na década de 1990, a letra X entrou na cultura popular, graças ao romance de Douglas Coupland “Generation X: Tales for an Accelerated Culture”. As marcas rapidamente entraram na onda.

Quando o Xbox foi lançado, em 2001, o prefixo de uma letra só oferecia uma alternativa contrastante para a letra minúscula i que dominava a cultura desde o lançamento do iMac.

O iMac introduziu um novo tipo de nome para dispositivos eletrônicos, nos quais uma única letra é capaz de sugerir uma série de características. Enquanto a letra i remete à internet, a letra X indica experimentação. O X se tornou uma abreviação de algo difícil de definir em palavras, como na franquia “X Factor”.

Ilustração: Fast Company

O X também infere velocidade, como em Expedia ou em FedEx, e é por isso que, em 1960, a consultoria criativa Lippincott incentivou a Haloid Xerox Co. a retirar a palavra “Haloid” de seu nome. “Seja pronunciado como ‘ks’ ou como ‘z’, o X traz uma sensação de velocidade e impacto a qualquer palavra”, explica Jake Hancock, parceiro sênior de estratégia de marca da Lippincott.

O apelo do X também é gráfico – a letra é perfeitamente equilibrada e sua “simetria é altamente memorável”, diz Colin Chow, sócio-gerente global da consultoria TwentyFirstCenturyBrand. Mas será que um X isolado se sustenta por conta própria?

Como era de se esperar, o júri de especialistas em branding que contribuíram para esta matéria estava tão dividido quanto um X, mas um dos mais assertivos foi Hancock, da Lippincott.

“A mudança da marca Twitter para a letra X é, em muitos aspectos, a maneira menos inovadora ou provocativa de sugerir que algo é ‘inovador e provocativo’, pois a letra tem sido usada dessa maneira com muita frequência ao longo das décadas”, diz ele.

“Daria para criar uma extensa planilha do Excel enumerando todos os exemplos. E, na hora de salvar o arquivo, poderíamos até nomeá-lo como ‘Arquivo X’.”


SOBRE A AUTORA

Elissaveta Brandon é colaboradora da Fast Company. saiba mais