Startups ressignificam menopausa, descobrem público poderoso – e as mulheres agradecem

Com filosofia “pró-aging”, startups lideradas por mulheres estão se consolidando em um terreno pouco explorado pelo mercado tradicional

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Camila de Lira 4 minutos de leitura

Menopausa não é um palavrão para startups, é um oceano azul. É um negócio que une três fatores essenciais no mercado de inovação: alta demanda, muito impacto social e, por enquanto, pouca concorrência. 

Em 2022, o investimento global em femtechs (setor de startups voltado para serviços e produtos da saúde feminina) foi de US$ 1 bilhão. Dentro desse segmento, o subsetor de companhias que focam apenas em produtos e serviços para tratamento de menopausa recebeu US$ 49 milhões no ano passado. O valor é quase o triplo dos US$ 12 milhões que tinham sido aportados nessas startups em 2021.

Segundo a consultoria Femhealth Insights, até 2030, o mercado de produtos e serviços para menopausa deve chegar à receita de US$ 24,4 bilhões – o crescimento mais rápido dentro das femtechs. Até lá, o mundo já terá pouco mais de 1,1 bilhão de mulheres que passaram ou estão começando a sentir os primeiros sintomas do processo da última menstruação, que ocorre entre os 45 e os 55 anos de idade. 

Crédito: Plenapausa

Por muito tempo, o período do “final da vida reprodutiva” feminina era relegado ao silêncio. Pouco se falava do assunto e, quando abordado, o tom era negativo, quase como um marco de que a mulher “não servia mais”.

Com a mudança da pirâmide etária e a dos hábitos da população feminina brasileira, o tema está passando por uma reformulação poderosa. “Menopausa é vírgula, não ponto final”, afirma Márcia Cunha, cofundadora e CEO da Plenapausa, primeira startup brasileira focada nesse segmento.

Marina Ratton, da Feel (Crédito: Divulgação)

A startup oferece produtos naturais para aliviar sintomas da menopausa, como os fogachos (chamados popularmente de "calorão") e a insônia, além de um aplicativo para apoiar a atividade física e o monitoramento desses sintomas.  O mercado da menopausa tem potencial para atingir outros setores, como o de saúde sexual, beleza e telemedicina.

“É uma fase muito potente para a vida da mulher. Ela tem bagagem, vivência e, pela primeira vez, pode transar sem risco de engravidar, que é um medo muito decisivo para a sexualidade”, diz a CEO da Feel, Marina Ratton. 

A Feel é uma femtech do segmento de saúde sexual e bem-estar, com produtos como lubrificantes vaginais, óleos hidratantes íntimos e vibradores. A companhia se prepara para lançar produtos exclusivos para o público 45+, depois de uma análise mostrar que parte das clientes da marca já está nessa fase da vida.

A desmistificação da menopausa ocorre em paralelo com a ação de femtechs em outros segmentos do mundo feminino, como a menstruação e a fertilização. “A mulher, durante a vida, enfrenta muitos tabus, muitas fases que ela ressignifica. A menopausa é mais uma delas”, diz Carla Moussalli, cofundadora da Plenapausa.

É UMA (BOA) FASE

Existem mais de 30 sintomas associados à menopausa, desde físicos até psicológicos. “Quando a mulher chega no médico e fala ‘posso estar entrando em menopausa, e agora, o que eu faço?’, a resposta mais comum é ‘agora você vai ter que aguentar' ́”, diz Carla.

No Brasil, 15% das mulheres que sabem que estão na menopausa não têm tratamento alerta a sócia da Plenapausa. Quando a startup abriu rodas de conversas entre mulheres para discutir os efeitos da menopausa, percebeu que havia muitos sintomas que não estavam contabilizados. “Uma frase que escutamos muito nessas rodas é ‘nossa, que bom que não estou louca. Não sou só eu que passo por isso'”, conta Márcia.

Crédito: Plenapausa

Para as startups, não é só porque é um processo natural do corpo que as mulheres precisam sofrer com ele.  Há poucos estudos científicos específicos sobre todas as fases da menopausa e a indústria farmacêutica ainda pesquisa os melhores tratamentos.

“Existem sete vezes mais estudos sobre disfunção erétil do que sobre qualquer outra situação do universo feminino, como TPM ou menopausa”, diz Marina. A disfunção erétil é um dos sintomas da andropausa, período de queda da testosterona que ocorre em homens na faixa etária entre 40 e 55 anos.

Análise feita pela Sociedade Brasileiro do Climatério (SBC) mostrou que a média de idade na qual as brasileiras começam a passar pelo processo de menopausa é 48 anos.

Crédito: Feel/ Divulgação

O imaginário que se criou sobre a mulher que está nesse período é completamente diferente da realidade. “Não são mulheres em decadência, elas estão no auge da carreira, da vida”, diz Marina.

A possibilidade de não sofrer os efeitos negativos da menopausa traz ainda mais potência para essa mulher. Levantamento da Plenapausa indica que 40% das mulheres já cogitaram pedir demissão por conta da gravidade dos sintomas da menopausa. E mais de 50% sentem sua produtividade afetada. 

A abordagem das femtechs já tem até um nome: pró-aging. Não se trata de prolongar a juventude ou de combater os sinais do corpo maduro, mas de abraçar e aceitar o envelhecimento.

“Precisamos ressignificar a cultura sobre envelhecer, mostrar que a gente pode envelhecer bem”, afirma Márcia Cunha.


SOBRE A AUTORA

Camila de Lira é jornalista formada pela ECA-USP, early adopter de tecnologias (e curiosa nata) e especializada em storytelling para n... saiba mais