5 Perguntas para Daniela Garcia, CEO do Instituto Capitalismo Consciente Brasil

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Redação Fast Company Brasil 7 minutos de leitura

Grandes ou pequenas, serão as companhias que ajudarão a criar uma sociedade menos desigual e mais diversa. O que significa que não é só uma necessidade, como também um dever dos líderes pensarem em formas diferentes de construir um sistema econômico que ofereça dignidade à população, sem destruir o planeta.

À frente do Instituto Capitalismo Consciente Brasil (ICCB), Daniela Garcia, busca formar líderes mais atentos ao seu papel, e ao das empresas, para esta mudança.

O ICCB faz parte da iniciativa global Capitalismo Consciente, que começou nos Estados Unidos em 2010 e hoje tem 13 filiais internacionais. O movimento prega que um negócio consciente surge quando as lideranças empresariais se baseiam em gerar valor para todos os stakeholders. O ICCB, está completando 10 anos. 

Daniela é a primeira CEO mulher de todas as 13 filiais da entidade. Nesta entrevista à Fast Company Brasil, ela reflete sobre a última década e mira nos próximos 10 anos. 

FC Brasil – No atual contexto, por que o capitalismo consciente ainda não é uma premissa para todos os negócios e empresas? É possível cogitar um capitalismo que não seja consciente?

Daniela Garcia As razões são diversas. Para contextualizar melhor, trago como exemplo a ideia de sustentabilidade nas empresas. Apesar desse tema fazer parte das discussões de negócios há pelo menos 40 anos, o fortalecimento da agenda de nova economia e o crescimento de movimentos organizados como o capitalismo consciente é bastante recente. No Brasil, por exemplo, o Instituto Capitalismo Consciente chegou em 2013.

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Outra razão é o próprio "longo prazismo" que é parte da tese, já que as histórias de sucesso "multistakeholder" nas empresas que aplicam integralmente o capitalismo consciente se constroem em horizontes de 15 a 20 anos.

E, talvez, uma terceira razão, que está relacionada com os motivos anteriores, é a necessidade de educação e conscientização dos empresários e acionistas que só agora está sendo acelerada. Estamos testemunhando a tradicional equação risco/ retorno/ liquidez ser afetada, por exemplo, pelas mudanças climáticas, trazendo assim uma nova variável para tomadas de decisão de investimentos: o impacto.

O fato é que hoje não há mais caminho de volta que exclua os princípios do capitalismo consciente. E isso diz respeito à sobrevivência e prosperidade dos próprios negócios. Não se trata de uma, mas da única abordagem possível para negócios e investimentos que seja compatível com as necessidades da sociedade de hoje, do amanhã e do planeta.

FC Brasil O Instituto Capitalismo Consciente Brasil fez 10 anos. Qual a sua grande contribuição para o país até agora e quais os planos para os próximos 10 anos?

Daniela Garcia Desde 2013, estamos contribuindo para transformar a forma como se fazem negócios e investimentos no país. É um trabalho educacional e de conscientização, no qual procuramos incentivar, inspirar e ajudar empreendedores e líderes a aplicarem os princípios do capitalismo consciente em suas organizações, com uma abordagem pautada em propósito e cuidado com os stakeholders.

entendemos que nem o governo e nem as organizações do terceiro setor vão poder suprir todas as necessidades que a nossa sociedade exige.

Nessa primeira década, alcançamos a marca de 228 corporações associadas, 487 embaixadores certificados e o número de associados pessoa-física ultrapassou a marca de seis mil pessoas. 

Esse conjunto de conceitos e números se reflete em benefício e impacto positivo no dia a dia do Brasil e dos brasileiros a partir do momentos em que as empresas transformam seus negócios em direção ao capitalismo consciente. 

Não somos uma agência reguladora nem certificadora. Estamos aqui para ser um ecossistema que acolhe toda empresa que deseja entender mais sobre o universo do conceito de capitalismo consciente e, com isso, orientar suas lideranças a serem cada vez mais conscientes do seu impacto.

Nos próximos 10 anos, o instituto pretende ampliar sua atuação. Para isso, estamos construindo uma “jornada da mudança”. 2024 chegará com uma série de novidades. Para completar, no III Fórum do Capitalismo Consciente, que será realizado no dia 20 de setembro, em São Paulo, vamos apresentar uma pesquisa de tendências sobre como deverão ser os próximos 10 anos das empresas conscientes.   

FC Brasil De acordo com dados levantados pelo jornal "O Globo", apenas seis entre as 82 empresas que compõe o Ibovespa têm mais de 10% de pessoas negras em cargos de liderança e só 12 têm liderança formada por pelo menos 50% de mulheres. Você mesma foi a primeira mulher CEO oficial do Capitalismo Consciente no Brasil. Como trazer mais consciência a organizações com lideranças tão pouco diversas?

Daniela Garcia As empresas são as protagonistas das mudanças que ocorrem na sociedade. Para nós, as empresas são os focos de cura de desigualdades da sociedade. Isso porque entendemos que nem o governo e nem as organizações do terceiro setor vão poder suprir todas as necessidades que a nossa sociedade exige. Então, as empresas entram como protagonistas porque têm dinheiro, possibilidades de abertura de portas para todo e qualquer grupo que precise de atenção.

Estamos aqui para ser um ecossistema que acolhe toda empresa que deseja entender mais sobre o universo do conceito de capitalismo consciente.

Uma empresa cura uma desigualdade quando faz contratações onde você tenha pessoas brancas e pessoas pretas na mesma proporção, assim como a inclusão de pessoas de outros grupos, representando de fato uma diversidade.

Uma empresa cura a desigualdade da sociedade quando contrata jovens aprendizes e oferece educação corporativa, que vai complementar a educação acadêmica que esses jovens eventualmente não tiveram.

Uma empresa cura desigualdades da sociedade quando tem menos gaps salariais e mais benefícios, proporcionando uma sensação de pertencimento, de adequação de todos os colaboradores dentro dela. 

O instituto atua inspirando e educando essas lideranças a construir essas narrativas, compartilhando conhecimento, trazendo exemplos e contando histórias de sucesso para que empresas e empresários tenham essa consciência de realidade e possam quebrar paradigmas. Quanto mais conscientes, mais detentoras de impacto positivo as empresas serão. Todo mundo só tem a ganhar com isso. 

FC Brasil Na prática, como o Instituto Capitalismo Consciente consegue chegar em pequenos e médios empreendedores?

Daniela Garcia Qualquer empresa, de qualquer tamanho, pode escolher tomar decisões baseadas nas premissas do capitalismo consciente, sendo pautada por propósito e cuidado com todos os stakeholders.

Empreendimentos pequenos ou médios podem operar desde o início com drivers culturais de transparência e confiança nas pessoas, com especial cuidado nas relações com as partes e na busca de um modelo de negócio de geração de impacto social e ambiental positivo.

hoje não há mais caminho de volta que exclua os princípios do capitalismo consciente. E isso diz respeito à sobrevivência e prosperidade dos próprios negócios.

Isso, no longo prazo, oferecerá prosperidade coletiva, beneficiando o proprietário, os sócios, fornecedores, funcionários – e, consequentemente, seus familiares – e toda a comunidade onde a empresa atua.

É preciso lembrar também que pequenos empresários são os fornecedores dos grandes. É preciso se preparar cada vez mais para atuar num universo de negócios que exigirá certificações e regulamentações. Empresa pequena bem preparada é sinônimo de alinhamento com a nova economia.

Na prática, disponibilizamos conteúdos e programas que se adequam para orientar pequenos e médios empreendedores no sentido do capitalismo consciente.

No Brasil também estamos estruturados em rede com 11 filiais espalhadas pelo país, composta por 250 voluntários multiplicadores, que disseminam e compartilham conhecimentos e princípios do capitalismo consciente nas respectivas regiões.

Cerca de 70% dos empregos no Brasil são gerados a partir das micro, pequenas e médias empresas, então, é uma fatia de negócios absolutamente relevante, que precisa da nossa atenção.   

FC Brasil Considerando cidades e países, onde o capitalismo consciente não chegou e gostaria de estar?

Daniela Garcia O Brasil é um país continental e estamos seguramente entre as 10 maiores economias do mundo. Por meio das nossas filiais, entendemos que as empresas e empreendedores de cada região estão em uma etapa diferente do capitalismo consciente. Alguns estão em uma jornada bem desenvolvida, outros estão buscando conhecimento agora ou dando início a um projeto de conscientização.

Partindo desse cenário e visualizando o mapa do Brasil, um setor onde há uma grande demanda atualmente e no qual pretendemos nos aproximar nos próximos anos são as empresas e empreendedores do universo dos agronegócios.

O Brasil está entre os cinco maiores produtores agrícolas do mundo e os próximos acordos comerciais – como, por exemplo, com a União Europeia – exigem maior compromisso e práticas sustentáveis, relacionadas com o ESG. As premissas e conceitos do capitalismo consciente precedem o ESG. Não há ESG sem passar antes por um processo de conscientização.


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