Como a Nvidia passou de marca de nicho para estrela entre as big techs

A empresa aproveitou a onda da IA para alavancar seu valor de mercado e ampliar o reconhecimento da marca, mas a maioria não sabe o que ela faz

Créditos: Taylor Vick/ Shubham Dhage/ Unsplash

Rob Walker 5 minutos de leitura

Geralmente, uma empresa trabalha para tornar sua marca conhecida e admirada e, se for bem-sucedida, isso aumenta seu valor. Mas, de vez em quando, esse processo se inverte e ela, de alguma forma, se torna um nome amplamente conhecido e admirado devido ao seu notável valor de mercado.

Essa parece estar sendo a história da Nvidia em 2023. Uma marca da qual grande parte das pessoas nunca tinha ouvido falar até o ano passado e que agora é uma das seis empresas do mundo que valem mais de US$ 1 trilhão. Como o "The New York Times" publicou recentemente, ela é "a vencedora mais evidente do boom da inteligência artificial".

Essa não é a primeira vez na breve história da IA generativa que um novo nome de destaque surge da noite para o dia. No início do ano, a OpenAI, criadora do ChatGPT, abriu sua API para desenvolvedores de terceiros. Em pouco tempo, a variedade de empresas estabelecidas e de startups anunciando que estavam trabalhando com o ChatGPT ou integrando-o fez dele uma espécie de "Intel Inside" da IA.

Empresa é líder em placas de vídeo (Crédito: Nvidia)

Por outro lado, esse "Intel Inside" foi, na verdade, um esforço de marketing intencional que visava, em parte, à familiaridade do consumidor, já que o ChatGPT está diretamente disponível para o público. A transformação da Nvidia de empresa de tecnologia obscura em carro-chefe da era do aprendizado de máquina foi ainda mais impressionante.

É claro que não faltaram exageros relacionados à IA quando a Nvidia anunciou seus números do primeiro trimestre em maio. Mas esses números e suas projeções ficaram tão à frente das expectativas de Wall Street que as ações NVDA tiveram um dos maiores saltos em um único dia na história do mercado.

Uma marca da qual a maioria nunca tinha ouvido falar até o ano passado agora é uma das seis empresas do mundo que valem mais de US$ 1 trilhão.

Entre outras coisas, a empresa aumentou sua receita esperada para o segundo trimestre de US$ 7 bilhões para US$ 11 bilhões. Na época, a Nvidia informou que mais de 40 mil empresas usam seus chips (ou GPUs, sigla em inglês para unidade de processamento gráfico) para impulsionar várias iniciativas, serviços, machine learning e IA.

Mais recentemente, quando a empresa divulgou os números reais do segundo trimestre, eles foram ainda melhores: receita de US$ 13,5 bilhões, projetada para atingir US$ 16 bilhões no terceiro trimestre. O preço das ações disparou novamente. O valor da Nvidia triplicou, tornando-a a empresa com o melhor desempenho do índice S&P 500.

Esse desempenho impressionante das ações ajudou a colocar a Nvidia na categoria distinta de nomes de marcas que atingiram um certo nível de popularidade e uma reputação altamente positiva, como uma espécie de substituto de toda uma tendência sociotecnológica. Tudo isso sem de fato vender nada ao público. O feito não é inédito, mas é raro.

Plataforma Acelerada de Machine Learning (Crédito: Nvidia)

Um exemplo de uma revolução tecnológica anterior é a Cisco. A fabricante de hardware de rede empresarial era vista como parte da espinha dorsal da internet no final dos anos 90, quando a CSCO ultrapassou gigantes voltados para o consumidor, como a Dell e a Microsoft, e se tornou a empresa mais valiosa do mundo.

Poucos no mainstream sabiam explicar o que a Cisco realmente fazia, mas muitos já tinham ouvido falar dela e a consideravam boa. Seu CEO, John Chambers, era um herói popular da imprensa de negócios.

não há garantia de que o boom da inteligência artificial não vai superaquecer e estagnar, derrubando a Nvidia no processo.

A Nvidia, que na verdade remonta ao início dos anos 90, foi a primeira a reconhecer o potencial da IA generativa. Principalmente na última década, ela construiu o que o "Times" chamou de "uma liderança quase imbatível" no desenvolvimento de chips projetados exclusivamente para lidar com tarefas de aprendizado de máquina.

Em especial, a Nvidia parece ter sido particularmente hábil em cultivar e atender a uma verdadeira comunidade de desenvolvedores de IA, tornando-se, ao longo do caminho, a marca de chips da qual esses desenvolvedores e outros clientes aprenderam a depender. 

Seu fundador, Jensen Huang, tem promovido a importância da IA há anos, dando à Nvidia ainda mais credibilidade com sua base de clientes. Portanto, embora a concorrência tenha, obviamente, aumentado (todos, do Google à Intel, mergulharam na produção de chips de GPU), a Nvidia tem uma participação estimada de 70% do mercado.

A empresa conta com uma comunidade de desenvolvedores engajada (Crédito: Nvidia)

Dito isso, a estratégia da companhia inclui investir e formar parcerias com algumas empresas de aprendizado de máquina que poderiam gerar incompatibilidades com seus próprios clientes. Certamente, a lista de concorrentes é formidável – e só tende a aumentar.

Em linhas gerais, não há garantia de que o boom da IA não vai superaquecer e estagnar, derrubando a Nvidia no processo. Já há ceticismo em relação ao ritmo de desenvolvimento, aos desafios das startups e à preocupação de que a ascensão da NVDA seja fruto de um frenesi semelhante ao dos memes.

Quando a Cisco era a empresa mais valiosa do mundo, era o auge do boom das pontocom. Alguns analistas previram que ela seria a primeira empresa a atingir avaliação de US$ 1 trilhão. Isso não aconteceu. A Cisco atingiu um valor máximo de cerca de US$ 546 bilhões em 2000 e hoje vale cerca de US$ 232 bilhões.

Ainda assim, a empresa continua lucrativa e a internet – da qual a CSCO era uma espécie de representante – está claramente maior do que nunca. Mas a Nvidia talvez aprenda que há algo ainda mais difícil do que conquistar o protagonismo de uma revolução tecnológica: se manter nesse papel.


SOBRE O AUTOR

Rob Walker assina Brended, coluna semanal sobre marketing e branding. Também escreve sobre design, negócios e outros assuntos. saiba mais