Na era da imagem digital, a fotografia analógica ensaia um renascimento

As vendas da linha M da Leica estão em alta. Sim, com filme de verdade. Aqui está o motivo

Créditos: Nathan Kelly/ Scott Evans/ Unsplash

Michael Grothaus 4 minutos de leitura

Apesar de adorar as fotos que tiro com meu iPhone 15 Pro, sei que não sou realmente responsável pela maior parte do trabalho. Claro, eu faço o enquadramento, mas, assim que aperto o botão, o aparelho realiza milhares de processos para me entregar a melhor imagem possível. Isso é conhecido como “fotografia computacional” e, embora deixe minhas fotos impressionantes, significa que o resultado é 10% meu e 90% do iPhone.

Agora, a fotografia computacional – que os smartphones e câmeras digitais usam há mais de uma década – está prestes a dar lugar à fotografia gerada por inteligência artificial. No mês passado, o Google lançou sua nova linha de smartphones, Pixel 8, que permite tirar fotos manipuladas por IA.

Crédito: Leica

Um recurso chamado “best take” permite que o software escolha a melhor expressão no rosto de cada pessoa em uma foto em grupo. Adeus aos olhos fechados naquela foto perfeita de família. Outra ferramenta, chamada “magic editor”, permite reposicionar pessoas ou objetos inteiros na foto depois de tirá-la, com a IA preenchendo o fundo.

Como um GenX de meia-idade, essas novas tecnologias nunca deixam de me surpreender. Mas, como alguém que cresceu com fotografia analógica – capturando imagens em filmes

A fotografia analógica proporciona uma conexão com as fotos que a digital não oferece.

de celuloide e reveladas manualmente em uma sala escura –, elas também me fazem sentir que a distância entre o fotógrafo e a fotografia é agora tão grande que os dois quase não estão mais conectados.

Conforme essa distância aumenta graças a processos adicionais de IA generativa, temo que o fotógrafo um dia se torne nada mais do que um simples tripé biológico para a câmera. Quando isso acontecer, o dispositivo de captura se tornará o criador.

Mesmo assim, tenho esperança. No ano passado, houve um aumento no número de fotógrafos profissionais retornando às câmeras de filme analógico.

VENDAS DE CÂMERAS ANALÓGICAS

A Leica é uma das fabricantes de câmeras mais respeitadas do mundo. A empresa existe desde 1869. Suas câmeras analógicas foram usadas pelos maiores fotógrafos do século 20 para capturar algumas de suas fotografias mais renomadas

No entanto, no início do século 21, a Leica, como todos as principais fabricantes de câmeras, abraçou a fotografia digital. Hoje, as versões digitais de suas câmeras se tornaram quase indispensáveis para fotógrafos profissionais – e cresceram enormemente em vendas. Em 2015, a marca vendia apenas 500 de suas câmeras analógicas da linha M por ano.

Câmera Leica II, de 1932 (Crédito: Leica)

Mas, recentemente, as coisas mudaram. Em 2023, a Leica espera vender cinco mil câmeras analógicas – 10 vezes mais do que há quase uma década. Para contextualizar, a empresa pretende vender cerca de 12 mil câmeras digitais este ano.

O fato de as câmeras analógicas representarem 40% do volume das digitais é surpreendente, especialmente considerando que a Leica continua inovando em fotografia digital.

No ano passado, houve um aumento no número de fotógrafos profissionais retornando às câmeras de filme analógico.

Quanto ao motivo pelo qual a fotografia em filme está ressurgindo entre os profissionais, cada fotógrafo provavelmente tem suas razões. Posso especular sobre algumas delas, pois seriam as minhas próprias.

A fotografia analógica proporciona uma conexão com as fotos que a digital não oferece. O fotógrafo assume um papel físico no nascimento da foto, desde a escolha do filme e o ajuste manual de filtros ópticos até a revelação. Há uma intimidade no processo analógico e um momento de ansiedade e expectativa que tornam emocionante ver o resultado final.

Leica M6, considerada uma das melhores câmeras de filme 35mm (Crédito: Leica)

À medida que as fotografias de IA generativa se tornarem comuns e cada pessoa puder tirar uma foto com o céu “perfeito” ao fundo ou com a expressão “perfeita” no rosto, consigo imaginar os fotógrafos profissionais recorrendo ainda mais ao analógico.

Os negativos são uma prova física não apenas de que suas fotos realmente capturaram a realidade, mas de que eles – e não suas câmeras com IA – são os verdadeiros artistas.

Não espero que a fotografia em celuloide faça um retorno triunfal ao mainstream. A fotografia digital é muito conveniente para a maioria das pessoas. A geração Z nunca conheceu nada diferente. E para a geração alpha, uma foto sempre será algo maleável. Eles certamente vão preferir uma câmera que possa aplicar qualquer expressão ao rosto das pessoas ou até reposicioná-las no enquadramento, se necessário.

Quanto a mim, saberei que, quando estiver olhando para um negativo, estarei vendo o trabalho de um artista conectado não apenas à sua obra, mas ao processo. E isso é o suficiente para colocar um sorriso (não gerado por IA) no meu rosto.


SOBRE O AUTOR

Michael Grothaus é escritor, jornalista, ex-roteirista e autor do romance "Epiphany Jones". saiba mais