Por que a melancia se tornou o símbolo da solidariedade aos palestinos

As cores são as mesmas da bandeira palestina

Crédito: Darko Vojinovic/ AP

Anna Furman 3 minutos de leitura

Nos últimos três meses, uma imagem inusitada tem surgido em protestos pelo mundo afora contra a guerra entre Israel e o Hamas: a de melancias.

Presente em faixas, camisetas, balões e postagens em redes sociais, a fruta ganhou destaque como símbolo de solidariedade. Suas cores – polpa vermelha, casca verde e branca e sementes pretas – são as mesmas da bandeira palestina.

A melancia se tornou um símbolo unificador, reunindo ativistas de diferentes línguas e culturas que compartilham uma causa comum.

Para evitar a censura, dissidentes chineses foram pioneiros no uso do chamado algospeak”, uma forma criativa de escrever ou abreviar palavras para contornar a moderação de conteúdo. Gente do mundo inteiro passou a usar essa estratégia para driblar vieses algorítmicos no TikTok, Instagram e outras plataformas.

Agora, a internet está repleta de representações visuais – imagens pixeladas, emojis e outros códigos tipográficos – que sinalizam dissidência política. E o emoji de melancia é o exemplo mais recente.

Mas como esta fruta passou de um símbolo de protesto na Cisjordânia e Gaza para um aceno global de solidariedade aos palestinos?

Após a guerra do Oriente Médio em 1967, o governo israelense proibiu o uso da bandeira palestina em Gaza e na Cisjordânia. Em 1980, na cidade de Ramallah, uma galeria dirigida por três artistas foi fechada pelos militares por exibir arte política e obras nas cores da bandeira – vermelho, verde, preto e branco.

O trio foi posteriormente convocado por um oficial israelense. De acordo com o artista e organizador da exposição, Sliman Mansour, o oficial teria dito: “é proibido organizar uma exposição sem permissão militar. E, em segundo lugar, é proibido usar as cores da bandeira palestina”.

Crédito: Wikimedia Commons

Ele também teria citado a melancia como um exemplo que violaria as regras do exército. Em protesto, as pessoas começaram a exibir a fruta em público.

Desde meados da década de 1990, quando Israel e Palestina estabeleceram acordos de paz provisórios, até o atual governo nacionalista israelense assumir o comando há um ano, erguer a bandeira palestina deixou de ser uma questão importante. Três décadas depois, ela se tornou novamente um símbolo nacional.

Há um ano, o ministro da segurança nacional de Israel, Itamar Ben-Gvir, proibiu bandeiras palestinas em locais públicos. Em resposta, o Zazim, um grupo ativista de árabes e judeus israelitas, colou nos táxis de Tel Aviv grandes adesivos de melancia que diziam: “esta não é uma bandeira palestina”.

Crédito: Reprodução/ YouTube

Cada vez mais, jovens ativistas têm utilizado o emoji da fruta para pedir um cessar-fogo em Gaza. Emojis podem confundir algoritmos que, segundo defensores, empresas de tecnologia usam para suprimir postagens com palavras-chave como “Gaza” e até mesmo “palestino”.

“Acho que esta é realmente a primeira vez em que vi o emoji sendo amplamente usado como substituto. E isso para mim marca um aumento notável na censura de conteúdo palestino”, afirma Jillian York, diretora de liberdade de expressão internacional da Electronic Frontier Foundation.

Outra razão para o uso é o fato de a melancia ter sementes. Existe um ditado,  frequentemente atribuído ao poeta grego Dinos Christianopoulos, bastante popular entre os ativistas que diz: “tentaram nos enterrar, mas não sabiam que éramos sementes”.

“Você pode esmagar uma melancia, mas a semente é mais difícil de destruir”, explica Shawn Escarciga, que criou o design. “É realmente incrível que a vida possa surgir de algo tão pequeno, resiliente, e que pode se espalhar tão facilmente.”


SOBRE A AUTORA

Anna Furman é editora da Associated Press. saiba mais