Temos que deixar de olhar para a periferia pela ótica da escassez


Adriana Barbosa 2 minutos de leitura

Quando falamos de periferia, o imaginário social brasileiro automaticamente associa o grupo pertencente a este meio a um aglomerado de estereótipos negativos, subjugados e marginalizados. As pessoas negras são maioria nas periferias, resquício de um país racista, em que o racismo não é tão velado assim. Somos constantemente lidos pela visão do outro, uma imagem que, na maioria das vezes – senão todas – não nos contempla de maneira real e profunda.A escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie nos provoca sobre o perigo de uma história única, denunciando a construção de nossa identidade, enquanto sujeitos negros, pela ótica colonial e o impacto de uma trajetória contada apenas por uma perspectiva. Recorro os escritos de Chimamanda para pautar a nossa verdadeira história. Viemos da  grandeza, somos sementes em potência. A periferia não é carente, é potente, e acredito que vocês estejam sim, prontos para esta conversa.

É na insistência de ocupar espaços e descolonizar toda uma história contada a partir do processo escravocrata, que buscamos ferramentas para abrir uma janela para um presente e futuros melhores
Estamos há 133 anos contribuindo para o crescimento do país, nossos aprendizados e epistemologias, nossa arte, cultura e criatividade. Movimentamos muita coisa por aqui. Nossas metodologias de reexistir e desenvolver coisas inovadoras vêm desde a travessia do Atlântico, quando nos tornamos negras e negros em diáspora. Tudo isso foi e é vivido em ‘preto e preto’ por uma população que cresce, diariamente, ao construir um cenário possível, forte e, acima de tudo, humanizado.Um jovem de periferia não traz soluções só para ele, traz soluções para toda uma sociedade e ao nos colocar na caixa da escassez, desconsideram-se todas as nossas glórias contra o sistema que nos invisibiliza e pelas ações transformadoras que movimentamos. É na insistência de ocupar espaços, de fazer a diferença, de nos colocarmos como protagonistas, de descolonizar toda uma história contada a partir do processo escravocrata, que buscamos ferramentas para abrir uma janela para um presente e futuros melhores.Não há o que romantizar. Viver na base da “servologia” é desgastante, mas o processo realizado em comunidade, em rede e em união, faz as coisas acontecerem de forma expoente e este é  o real significado de aquilombar, nos organizar, refletir e agir sobre a nossa realidade. Construir demandas, ações, nos colocar em movimento para mudar o nosso contexto. A sobrevivência não nos contempla mais, queremos viver e viver para realizar.Eu fui e sou essa jovem que exemplifiquei acima, a cada passo que dei e que estou construindo para impulsionar não só o afroempreendedorismo, mas também futuras lideranças negras, só comprova que não somos subalternos, e que o nosso lugar de origem é sim ponto referencial de construção de muita coisa. Estamos pesquisando, criando, desenvolvendo, reformulando a rota. Periferia vive e impacta, e conta com a sabedoria de transformar momentos difíceis em momentos de vida. A Feira Preta é isso.Este texto é de responsabilidade de seu autor e não reflete, necessariamente, a opinião da Fast Company Brasil

SOBRE A AUTORA

Adriana Barbosa é fundadora da Feira Preta, evento de cultura e empreendedorismo, e CEO da PretaHub. Foi apontada pelo Fórum Econômico... saiba mais