Esta startup tem um plano para salvar a camada de gelo do Polo Norte
Ao bombear água do mar sobre o gelo do Ártico no inverno, a Arctic Reflections espera ajudar a evitar que o gelo derreta no verão
No Ártico, é bem provável que o gelo marinho desapareça no verão já na década de 2030. Desde que o governo dos EUA começou a medir o gelo marinho em 1979, mais de dois milhões de quilômetros de cobertura já se perderam no verão. O gelo está ficando mais fino e mais fraco.
Isso é um problema não apenas para as populações e para a vida selvagem do Ártico, mas para todo o planeta. Como o gelo reflete a luz do sol e o oceano escuro a absorve, a perda de gelo significa que o aquecimento global vai ocorrer mais rapidamente.
Uma start-up holandesa chamada Arctic Reflections quer ajudar a preservar o gelo remanescente, tornando-o mais espesso no inverno, para que não derreta tão rapidamente no verão.
"Minha formação acadêmica é na área de transição energética", diz o cofundador Fonger Ypma. "Mas, em algum momento, percebi que, mesmo com rápidas reduções nas emissões de CO2, o primeiro verão sem gelo no Ártico já é algo inevitável."
Ypma se inspirou em uma tradição da Holanda: no inverno, quando a temperatura cai abaixo de zero, as comunidades costumam inundar canais e lagos com camadas finas de água para ajudar a tornar o gelo espesso o suficiente para a patinação.
"Pensei: será que não poderíamos fazer isso em grande escala? É claro que essa é uma ideia um pouco maluca. Mas depois descobri que já havia algumas pesquisas acadêmicas sobre isso", diz ele.
A proposta básica já foi usada em pequena escala no Ártico por outros motivos. Estradas de gelo foram construídas para que os caminhões pudessem chegar a áreas remotas (como minas) bombeando água até a superfície para que ela congelasse e engrossasse o gelo. Ironicamente, as empresas petrolíferas também utilizaram a técnica para construir "ilhas de gelo" e proteger as plataformas de perfuração.
Mas a Arctic Reflections quer testar se a técnica pode ser usada em uma área muito maior, para ajudar o gelo a durar mais durante o verão. A água seria bombeada sobre o gelo existente no inverno, quando a temperatura está muito abaixo de zero, para formar camadas.
Ypma fez uma parceria com pesquisadores da Universidade de Delft para estudar a ideia em laboratório e, quando ela pareceu promissora, lançou a startup com seu colega empresário Tom Meijeraan.
A equipe viajou recentemente para o Ártico canadense para os primeiros testes de campo com a Real Ice, uma organização sem fins lucrativos que trabalha em um projeto semelhante.
Em abril, a equipe da Arctic Reflections vai viajar para a Noruega para realizar mais testes, instalando equipamentos que possam medir a resistência do gelo mais espesso ao derretimento em temperaturas mais quentes.
O tamanho gigantesco do oceano Ártico é um desafio óbvio, mas a equipe espera tirar proveito da forma como o gelo se move para cobrir uma área maior.
"O gelo pode facilmente percorrer mil quilômetros durante uma temporada no Ártico", diz Ypma, observando que o plano é identificar locais estratégicos para acumular camadas de gelo que poderiam, em seguida, se deslocar para outras áreas.
Ainda há vários outros desafios. Depois de acumular mais dados dos testes de campo, a equipe precisará construir um projeto de demonstração maior, para testar a engenharia. Eles terão que obter novas licenças para trabalhar em grande escala. E vão precisar de financiamento. "Também queremos cocriar o projeto com os povos indígenas, portanto, isso levará tempo", diz Ypma.
Em sua visita ao Canadá, ele viu como os inuítes precisavam urgentemente de uma solução. As pessoas com quem ele se encontrou disseram que precisam do gelo marinho para chegar ao continente. No ano passado, foi necessário esperar um mês a mais para que o gelo engrossasse o suficiente para que eles pudessem atravessá-lo com segurança no inverno.
A meta da empresa é ter um sistema implementado até 2030. Para financiar o trabalho, ela provavelmente venderá algum produto semelhante a créditos de carbono e buscará financiamento do governo.
Essa é apenas uma solução temporária, enquanto o mundo trabalha no desafio maior da descarbonização. "Se não reduzirmos as emissões de CO2, isso não fará sentido", diz Ypma.
Mas, mesmo com cortes drásticos nas emissões, alguns estudos sugerem que o gelo marinho pode continuar desaparecendo. Pode ser necessária uma ajuda extra.
Ypma argumenta que o processo é semelhante ao reflorestamento: impulsionar um processo natural em vez de fazer geoengenharia: "Nosso princípio norteador é que queremos ajudar a natureza a se preservar."