Por que você não precisa ser amigo do seu chefe – e vice-versa
Um bom chefe não precisa conhecer a vida pessoal de cada funcionário para conseguir extrair o melhor desempenho possível da equipe
O processo de transformação da liderança tem dado fim à era dos chefes mais autocráticos, tirânicos, nepotistas, despóticos, plutocráticas e violentos. A tendência, em tempos mais democráticos, é formarmos líderes mais empáticos, atenciosos e inclusivos.
No entanto, um dos efeitos colaterais dessa mudança é a dificuldade de discernir as relações que temos com os amigos das relações com os chefes.
A essência da liderança não mudou. Ainda se trata de uma tarefa básica: transformar um grupo de pessoas em uma equipe de alto desempenho, permitindo que elas deixem temporariamente de lado suas agendas individualistas para colaborar com um objetivo comum. O resto são detalhes.
Equidade não é tratar todo mundo da mesma forma, mas sim como cada um merece e prefere ser tratado. Isso torna o trabalho dos gerentes e líderes bastante desafiador.
Em uma época na qual as empresas promovem a diversidade e a inclusão, e os líderes têm a tarefa de promover a colaboração entre pessoas de diferentes origens e estilos de vida, nem sempre é fácil descobrir o que motiva cada um e como personalizar o estilo de liderança sem criar desigualdades.
Ao mesmo tempo, uma única medida não serve para todos, e ficar insensível à rica gama de diferenças individuais que tornam cada pessoa única e diferente das outras é estar fora de sintonia com a realidade e ser contraproducente.
Um chefe não pode ser alguém que não consegue reconhecer os limites entre o lado pessoal e o profissional.
Por exemplo, vamos pensar na questão do quanto os funcionários estão dispostos a expor sua vida ao chefe, ou o quanto o chefe deve se envolver na vida pessoal ou privada deles. Pesquisas mostram que negociar, estabelecer, mudar e ajustar os limites entre o trabalho e a vida pessoal é fundamental para um relacionamento saudável entre os funcionários e seus chefes.
A maioria dos comportamentos contraproducentes que os líderes apresentam – desde a liderança incompetente até o bullying, o assédio, a fraude e a toxicidade geral – é uma consequência direta da incapacidade de gerenciar a reputação profissional e o próprio trabalho. Eles deixam suas tendências mais sombrias se infiltrarem em sua personalidade profissional.
Pesquisas sobre softwares de rastreamento e vigilância destacaram a preocupação dos funcionários em serem bisbilhotados. O surgimento de ferramentas de coleta de dados de IA, sem dúvida, vai agravar essa situação.
Embora provavelmente seja preferível ser monitorado por um algoritmo em vez de seu chefe, o uso irresponsável da IA e da análise de dados pode prejudicar a confiança e o engajamento dos funcionários.
Ao contrário da crença popular, o chefe ideal não é seu melhor amigo. Um chefe não pode ser alguém que não consegue reconhecer os limites entre o lado pessoal e o profissional. Um bom chefe é alguém que ajuda a agregar valor a uma equipe e a uma empresa, permitindo que cada um tenha o melhor desempenho e desenvolva seus talentos e seu potencial.
Para isso, não é necessário conhecer a vida particular ou saber detalhes pessoais sobre o subordinado. Basta conhecer suas habilidades, aptidões e conhecimentos e saber como incentivá-lo a ter o melhor desempenho possível.
A capacidade do chefe de fazer isso aumenta se ele conseguir prestar muita atenção ao trabalho de cada membro da equipe. Para isso, não é preciso que ele conheça hábitos pessoais, preferências de entretenimento ou sonhos mais profundos. Cada um tem o direito de guardar para os mais próximos quem é na intimidade.
Um ótimo chefe não é nem melhor amigo nem psicoterapeuta. Ele está comprometido em obter o melhor da equipe, o que requer um sólido entendimento de como cada um se encaixa, que papel funcional e psicológico cada membro desempenha e como melhorar o desempenho dos funcionários.
estabelecer, mudar e ajustar os limites entre o trabalho e a vida pessoal é fundamental para um relacionamento saudável entre funcionários e chefes.
Na verdade, há muitas vantagens em ignorar deliberadamente o seu eu e reconhecer que, como ser humano, você tem vários eus. Não há razão para supor que seu trabalho ou carreira deveria abranger toda a sua complexidade pessoal.
É uma vantagem separar suas crenças e preferências pessoais e o valor que você agrega à equipe. Quanto mais alguém, inclusive seu chefe, souber sobre sua vida particular, maior será a probabilidade de ele ser tendencioso, seja a seu favor ou contra você, o que diminui a inclusão na equipe.
Outra vantagem desses limites é o respeito ao seu desejo de compartilhar apenas o que você quer compartilhar e vice-versa. Por fim, não há conflito entre demonstrar empatia, consideração e apoio aos funcionários e ficar longe de suas vidas pessoais.
Chefes e líderes não devem bisbilhotar a privacidade de seus funcionários, o que não interfere em sua disposição ou capacidade de demonstrar interesse em seu bem-estar, engajamento, satisfação profissional e desempenho. E essa é a parte que mais importa.